quarta-feira, 21 de outubro de 2009

NÃO APRENDEM MESMO

SARAMAGO III

Tratar a Bíblia apenas como obra literária é um exercício a que nem um agnóstico ferrenho se atreverá. Mas, dessa perspectiva, Saramago tem o direito de a interpretar como qualquer leitor (incluindo os maiores teólogos e os mais ignorantes, como eu). E, já agora, qualquer estudante de literatura tradicional sabe que o que seria estranho é que não estivesse pejada de maus exemplos e crueldades. É tão estúpido acusá-la, enquanto livro, de ser responsável pelo ódio (sobre a comunidade LGBT, por exemplo) que alguns dizem que defende, como reduzi-la a um compêndio de textos tradicionais de amor ao próximo. 
Ora, sendo a Bíblia, "mais" do que uma obra literária, um texto sagrado para várias religiões, é o seu impacto cultural que está em questão nesta polémica imbecil. E se a fé de muitos defende o argumento da autoridade para a interpretação dos seus textos sagrados, isso é lá com eles. É um acto de fé, não tem nada a ver com literatura. 
O grau de respeito e tolerância das igrejas não está inscrito nos seus objectos sagrados, mas no modo como reagem ao que consideram blasfemo. Se acham que podem interferir com as interpretações alheias e com a livre produção literária, para mim estão todos no mesmo saco: os que decretam fatwas, os que organizam motins por causa de caricaturas, os que acham que os "extremistas" deviam ser apátridas à força.
E é um saco de parvos: quanto mais estrabucham a tentar impor a exegese única dos seus textos sagrados, mais os seus "inimigos" vendem os livros que tanto os ofendem. Santa ingenuidade! 

2 comentários:

  1. Ora, para terminar o assunto da minha parte ficam três notas:
    a) não achas que três posts sobre este assunto é dar-lhe demasiada importância?

    b)Com este post eu concordo e ressalvo uma confusão que tem sido feita. É que Saramago criticou a Bíblia, o livro, e não uma religião, a Católica em particular. Para as pessoas pró e para as pessoas contra, a ligação foi imediata o que não líquido.

    c) Admitirás, ou não, mas o facto é que entre o teu primeiro post sobre este assunto e este último há uma evolução significativa. Talvez não na essência mas na forma que, como sabes, molda a essência.

    Um abraço
    Videira

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  2. Gostei muito do texto, o preconceito e o tabu vindo do dogma cega e escraviza a mulher e o homem e abre conflitos virtuais.

    Parabéns!

    Nota: Recomendação à comissão instaladora, porque não acertam o relógio? Não é muito importante mas na nossa cultura faz jeito!

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