domingo, 31 de outubro de 2010

ASSINATURA DO ACORDO EM CASA DE CATROGA - UM SIMBOLISMO DRAMÁTICO

Um acordo muito importante para o país, viabilizando o Orçamento de Estado, foi assinado não numa instituição política (o Parlamento, a residência oficial do primeiro-ministro, uma sede partidária) mas, imagine-se, na casa particular de um cidadão que não tem neste momento qualquer representação política — o professor Eduardo Catroga, que Cavaco terá imposto ao PSD (de que, diz o próprio, não é militante) para negociar um acordo com o Governo. Numa vergonhosa submissão aos "Senhores da Lapa" (para quem não é "alfacinha": a Lapa é o bairro mais chique de Lisboa, burgo da (muito) alta burguesia), um dos ministros mais importantes do governo (ministro das Finanças) deslocou-se a casa de Catroga e aí assinou o acordo. Único registo fotográfico do acontecimento no telemóvel do sr. Catroga. Uma humilhação para o governo, mas também para as instituições da república. Os servos foram pedir pão aos seus senhores…

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

PRIMAVERA #20















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

PENSAR ALTO

A fuga das galinhas
por Joana Amaral Dias

Um gestor vale mais do que quem salva vidas e cria (vários tipos) de riqueza como um médico ou um cientista? Qual é o dom especial que possuem para que ganhem muito mais que todos os outros? Não se sabe. Mas essa ignorância não altera os rendimentos.
Mesmo que os resultados empresariais derivem de uma extensa cadeia. Mesmo que todas as empresas devam ter um papel social. Pois é. Os nossos trabalhadores são dos mais mal pagos da Europa, mas os gestores são dos mais bem pagos. Um gestor alemão recebe dez vezes mais que o trabalhador com o salário mais baixo na sua empresa. O britânico 14. O português 32. Mas, segundo um estudo da Mckinsey, Portugal tem dos piores gestores. Logo, quando se fala em reduzir direitos e salários, a quem nos devemos referir? Lógico? Não. Dizem que os bons gestores escasseiam e é necessário recompensá-los. Senão, fogem do país. Ok. Então, é simples. Se são assim tão poucos, ide. Não serão significativos na crescente percentagem de fuga dos cérebros que estavam desempregados/explorados. Depois, contratem-se gestores alemães ou ingleses. Por lá, não rareia tanto a qualidade. Estão habituados a discutir não só ordenados mínimos como ordenados máximos. E sempre são mais baratinhos.


BPN: O CRIME COMPENSA?

Se for verdade – e parece que é – que o governo enterrou 5 mil milhões de euros num banco que não pode ser recuperado e que, além do mais, tal operação pode causar graves danos à saúde financeira da CGD, há que fazer pagar bem caro quem tomou tal decisão. É preciso que sobre a intervenção no BPN (e sobre as fraudes e crimes cometidos pelos responsáveis do BPN) se saiba toda a verdade… (Talvez eu continue a ser demasiado lírico…)

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

COM PROFESSORES COMO UM TAL TRIGO PEREIRA A UNIVERSIDADE VAI AO CHARCO!

Acabei de assistir a uma entrevista dirigida por Judite Sousa na RTP1 na qual participou o professor do ISEG Trigo Pereira. Este senhor disse, como outros antes dele,que entre as causas da derrapagem orçamental em 2010 está o acordo que terminou com a divisão da carreira entre professores e titulares. Esse senhor deveria saber — mas pelos vistos não sabe — que o decreto-lei que consubstancia o acordo (Decreto-lei 75/2010) foi publicado apenas em 23 de Julho e que os docentes que estavam no topo da carreira de professor em Julho (índice 218) só poderiam progredir (uma vez que já não há a "divisão") quando fossem estabelecidas as quotas para a progressão ao índice 235, isto é, no final de 2011! Deveria esse senhor saber que a aplicação em 2010 do "acordo" foi residual — a maioria dos professores só beneficiaria desse acordo em 2011. Parece que os professores provocaram derrapagem orçamental em 2010 mesmo sem terem aumentado de salário. Com professores universitários que não cuidam de se informar com rigor sobre o que vão dizer, a universidade não irá muito longe.
Talvez não fosse má ideia avaliar esse sr. professor…

SOBRE A CONDENAÇÃO À MORTE DE TAREK AZIZ

A condenação à morte é sempre um acto inútil e mesquinho, seja a vítima Saddam, Ali ou qualquer outro criminoso. Mas é inquestionável que a condenação à morte de Tarek Aziz, o ministro dos negócios estrangeiros de Saddam Hussein passados todos estes anos, acentua ainda mais que estes enforcamentos são meros actos de vingança. A luta contra a pena de morte tem de continuar!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

É PRECISO ENTENDER O QUE SE PASSA EM FRANÇA

Em França — e pelos vistos não só em Paris — desencadeou-se um notável movimento de resistência contra a pretensão do governo de aumentar para 62 anos de idade a possibilidade de reforma e para 67 anos a reforma inteira. É certamente motivo que justifica a resistência, mas convenhamos, bem menos gravoso do que o brutal ataque desencadeado pelo governo português — ou pelos bancos que o comandam — contra o povo lusitano.
Há, tanto quanto consigo saber pela notícias divulgadas, aspectos da resistência popular em França que merecem particular atenção: a massiva adesão das refinarias (em regra trabalhadores bem pagos), a eficácia da actuação dos piquetes de greve (hábito que entre nós se perdeu), a coordenação das acções de luta entre diferentes sectores. Mas não deixa de se estranhar que, numa luta que tem por motivo central a idade da reforma, os estudantes liceais (não sei se também os universitários) estejam entre os mais activos.
Confesso que tenho dificuldade em perceber exactamente o que se passa
em França — e se alguém me quiser ajudar a perceber, fico muito grato. Mas tenho a certeza de que, para o bem ou para o mal, nada será igual em França e na Europa depois deste notável processo de luta. Desculpem, mas vem-me à memória o Maio de 68.

domingo, 24 de outubro de 2010

TORTURAS E ASSASSÍNIOS NO IRAQUE "LIBERTADO"

Se o torturado ou morto for cidadão americano ou de um dos "grandes" da Europa, é de certeza um crime, leva-se a questão para os tribunais internacionais, faz-se um enorme alarido.
Se for um pobre iraquiano, cospe-se-lhe em cima, esquece-se o caso (e são milhares de casos!) e acusa-se quem se sentiu no obrigação de o denunciar. Infelizmente já estamos tão habituados a este princípio de "dois pesos, duas medidas" que já nem somos capazes de reagir com a energia necessária. Sinais dos tempos.

PRIMAVERA #19















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

O ELEVADOR DA GLÓRIA (em Lisboa) FAZ 125 ANOS: LIVREMO-LO DOS PRETENSOS GRAFITTIS!

So o "grafitti" é ou não uma forma de arte popular urbana pode ser um interessante debate, desde que não se confunda arte — qualquer que ela seja — com uns rabiscos gatafunhados com que se conspurca tudo o que aparecer à frente de uns talentos frustrados. Não sei quem teve a excelente ideia de colocar na Calçada da Glória uns largos painéis para grafitar. E vê-se com agrado o trabalho desses anónimos artistas urbanos, o que, porém, nada tem a ver com os rabiscos que "magoam" o elevador — um monumento nacional de inquestionável interesse histórico. Todo o apoio aos que "grafitam" a sério, mão pesada para quem conspurca o que é beleza (colectiva ou individual).

DISCRIMINAÇÃO ENTRE IGREJAS: UM PERIGOSO RETROCESSO EM MARCHA?

Quem leu em pormenor a proposta de Orçamento de Estado (o que não é o meu caso) alerta para a intenção do governo de retirar os benefícios fiscais até agora concedidos às igrejas, com excepção da igreja católica, que continuaria a beneficiar de tais privilégios. A ser assim, estaríamos a considerar o a igreja católica como a "igreja do Estado", retrocedendo na separação entre as duas instituições que lentamente fomos historicamente construindo. É certo que pelo ministério da Educação já passou uma secretária de Estado, a doutora (!) Mariana Cascais que não teve pejo em definir o catolicismo como religião oficial do estado português, mas isso faz parte das alarvidades que têm passado pela 5 de Outubro.
A discriminação "positiva" que beneficiaria a igreja católica não tem qualquer sentido. Assente numa mentira que o senso comum aceita como verdade: que a igreja católica se dedica sobretudo à protecção dos mais pobres e dos mais fracos. Bem pelo contrário, foi sempre — e continua a ser — a protecção dos mais poderosos que esteve no cerne da sua actividade.

sábado, 23 de outubro de 2010

NÃO DÁ PARA FALAR DE RANKINGS EM POUCAS PALAVRAS

Todos os anos, quando saem os rankings das escolas segundo o resultado dos exames nacionais, fico tremendamente irritada. Não pelos números em si, mas pelas falsas conclusões que ficam no ar sobre o que eles significam. Não sei bem qual é o objectivo destas listas hierárquicas; percebo que se avaliem os resultados das escolas, mas não posso deixar de pensar que os resultados em exames são apenas um elemento de avaliação. E acharia bem que qualquer avaliação tivesse como objectivo diagnosticar problemas e perceber onde é que se pode intervir, mas a posição numa tabela nada indica sobre isso — quanto muito, seria possível tirar conclusões quanto ao desempenho de uma escola comparando as suas médias ao longo dos tempos, mas é irrelevante para qualquer efeito concreto se é a melhor ou a pior da lista.
É escandalosamente absurdo que os meios de comunicação que divulgam estas coisas com tanto entusiasmo não expliquem que os rankings nada indicam quanto à qualidade das escolas. Não se pode comparar o que não é comparável, e o facto de as escolas de elite seleccionarem os alunos, quer seja pelo rendimento quer pelo desempenho anterior, torna ilegítima qualquer comparação com estabelecimentos de acesso livre. Aliás, o que os rankings permitem constatar, e de forma consistente, é que o estatuto socioeconómico dos alunos é determinante na sua prestação escolar. Para se aferir o quer que seja em relação às escolas em si, seria preciso comparar apenas os resultados de estudantes oriundos das mesmas classes e verificar se diferem consideravelmente consoante estudam em escolas públicas ou privadas, por exemplo. E eu diria que o trabalho mais válido da comunidade escolar estará certamente nas escolas nas posições mais baixas, onde é de esperar, olhando para os resultados globais, que se encontrem os alunos com mais dificuldades e maiores probabilidades de aumentar os números do abandono escolar.
O segundo logro: a ideia de que a matrícula numa escola de topo garante melhores resultados nos exames. Os rankings baseiam-se em médias, e portanto nada impede, por exemplo, que um aluno de uma escola num posição elevada obtenha resultados miseráveis, ou que haja alunos excelentes nas escolas com médias mais baixas (como é óbvio!). Mas é este o efeito mais pernicioso da cultura dos rankings: nos últimos anos temos assistido a um êxodo da classe média do ensino público, com consequências graves causadas pela ausência de pais mais intervenientes na dinâmica escolar e, sobretudo, pelo desaparecimento progressivo da grande mais-valia da escola pública: a diversidade. E é muito grave que a reacção de algumas escolas públicas tenha sido passar a condicionar a entrada de alunos, criando uma espécie de ilhas de elite e mandando às urtigas qualquer papel social e critérios pedagógicos. Para já não falar das consequências políticas quando os partidos de direita propõem, no fundo, a implementação assumida de um sistema de ensino a duas (ou mais) velocidades, confundindo benefícios fiscais com liberdade de escolha (da qual ficariam sempre excluídos, por exemplo, os que não têm como pagar mensalidades que possam ser reembolsadas através da máquina fiscal) e pondo em perigo o financiamento do sistema público.
Algo vai muito mal quando a pretensa filosofia do rigor se deixa levar pelo populismo dos top 10, sem querer ver que o risco de nivelar por baixo é tão real como qualquer estímulo que possa ser criado pela competição: uma má performance em termos absolutos é de valorizar se for melhor que as outras? Rankings, quadros de honra e quejandos, que incutem nas crianças desde terrivelmente cedo a ideia de que aprender é competir, são uma praga nas escolas, seja qual for o resultado, o método, o preço ou os critérios de selecção. "Premiar o mérito" é muito mais fácil do que perceber que o "mérito" é já em si um prémio; e o verdadeiro mérito que queremos ensinar é o dos pódios, ou o de saber interpretar dados?

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A INEXISTÊNCIA DE CONCURSO PARA PROFESSORES EM 2011 PÕE OS MAIS FRACOS A PAGAR MAIS

Os docentes contratados sofrem mais de 10% de prejuízo no seu salário — Com efeito, a anulação anunciada pelo Ministério da Educação do concurso para entrada na carreira que tinha sido acordado com os sindicatos, significa que os contratados continuarão a ganhar pelo índice 151 (na melhor das hipóteses), ou seja, 1373 Euros ilíquidos.
Se conseguissem um lugar de quadro, mesmo que entrassem no 1º escalão, índice 167, passariam a ganhar 1518 Euros ilíquidos. Nesta caso, a não entrada no quadro por inexistência de concurso significa um prejuízo de 10,7%, isto é, mais do que os 10% do corte salarial imposto a quem ganha mais de 4200 Euros.
A perda é ainda maior, uma vez que, pelo número de anos que já cumpriram como contratados, boa parte destes seria colocada em escalões superiores. Ou seja, são os docentes que ganham menos de 1500 Euros os mais prejudicados pelas medidas de austeridade. Viva a justiça!

terça-feira, 19 de outubro de 2010

O PRÉ-AVISO CONJUNTO PARA A GREVE GERAL É UM BOM SINAL

O facto de a CGTP e a UGT terem entregue um pré-aviso conjunto para a convocação da greve geral para o dia 24 de Novembro é mais do que um forte sinal simbólico. Tem um efeito mobilizador como todos os sinais de unidade. "A greve faz-se", camaradas!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

PRIMAVERA #18















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

A EDUCAÇÃO E O ORÇAMENTO DE ESTADO

A Educação sofre no Orçamento de Estado para 2011 agora apresentado um corte de 11,2% relativamente ao ano passado. Poderá dizer-se que tal corte era inevitável face à degradação da situação económica e financeira. Talvez. Mas ao menos que não nos atirem areia para os olhos nem nos tomem por parvos. Assuma-se que se suprimem a área de projecto e o estudo acompanhado, de que não foi feita qualquer avaliação, apenas por necessidade de poupança: reduzir o número de professores. Poderá, é certo, perguntar-se se as aprendizagens estruturais destas áreas não serão mais úteis que a distribuição massiva dos "Magalhães". Mas isso não resolve. Apenas ajuda a entender os critérios muito pouco pedagógicos que imperam na 5 de Outubro.
Claro que a redução do número de professores pode também ser obtida por outros métodos, bem mais radicais, na esteira do "pensamento pedagógico" dos energúmeno (pedagogicamente falando) Lurdes e Valter: aumente-se ainda mais a carga horária dos docentes, dizendo-lhes claramente que preparação de aulas e acompanhamento dos alunos são coisas do passado, são patetices dos "filhos de Rousseau". Que ser bom professor é guardar os meninos 35 horas por semana…
Ou aumentando o número de alunos por turma, colocando-as ao nível das turmas de países como Angola e Moçambique, por exemplo. Fica também claro que a criação dos mega-agrupamentos não é mais do que uma medida de "optimização de recursos". Nós já sabíamos — escusado era terem inventado não sei quantas justificações pedagógicas para aquilo que é pedagogicamente insustentável, como em cada um dos já criados se vai vá constatando. Vão os interesses dos alunos às urtigas: criem-se mais uns mega-agrupamentos.
Acrescente-se a tudo isto a excepcional motivação provocada nos docentes pelos cortes de salário, pelo roubo do tempo de serviço, pela certeza de não progressão nem de entrada na carreira. Misture-se bem.
E para aliviar a bílis, saia uma valente gargalhada perante a afirmação de Isabel Alçada, por acaso ministra, de que nada disto impede a construção de uma escola pública de qualidade. Os privados agradecem.

sábado, 16 de outubro de 2010

CINISMO A PROPÓSITO DO COMBATE À POBREZA

Num momento em que são tomadas medidas economicamente recessivas, conduzindo a um aumento do desemprego, em que se anunciam brutais cortes no apoio aos desempregados, em que um brutal aumento dos impostos reduzirá o poder de compra de todos os portugueses, cai-me como um murro no estômago a profusão de “muppies” colocados no Metro de Lisboa (e possivelmente em outros locais) apelando ao “combate à pobreza” patrocinados, entre outros, pelo Ministério do Trabalho e da Segurança Social (MTSS). Cena de cinismo macabro.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

ALGUMAS PASSAGENS DE “TRÊS OU QUATRO COISAS SOBRE O PAÍS REAL”

de Ana Benavente, no Público (14 de Outubro)

“O medo é perigoso e mau conselheiro.”

“Do PSD não virá nem bom vento nem bom casamento(…) Não precisamos de mais betão. Do PS também não veio o futuro porque se tornou demasiado próximo do liberalismo económico (…)”

“É assim na administração pública, na saúde e na educação, para referir três domínios em que a liberalização é óbvia e nefasta. Quem não vê os crimes que se cometem com o encerramento de escolas e com os mega-agrupamentos, forçando uma despersonalização que em tudo contraria o que significa a educação em democracia? Como é possível acreditar que a OCDE é a absoluta portadora da verdade? As suas análises não são neutras em domínio nenhum e o neoliberalismo domina essa organização (…)”

“(…) Se não soubesse quem é o partido do Governo, olhando para as medidas que toma e para os discursos que faz, pensaria que era o PP que dirige o país.”

“Não há salvadores da pátria. Não os queremos, trazem sempre mais tirania e menos democracia. Somos nós todos que podemos tirar o país do actual impasse (…) Porque se calou há tanto, por exemplo, o Conselho Nacional de Educação? Não sabe da desmotivação e sobrecarga dos professores de todos os graus de ensino? Não vê que nas escolas volta a cultivar-se a obediência e a burocracia como valores maiores? E a universidade e os politécnicos? Que nos dizem sobre o conhecimento que vão produzindo? (…) Porque não fazer do dia da greve geral, em Novembro, um dia de debate nacional em todos os locais de trabalho e nos espaços da sociedade? Por onde andamos nós?"

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O RESGATE DOS MINEIROS NO CHILE

1. Parece que, contra todas as probabilidades, tudo vai terminar em bem: os mineiros serão retirados com vida após mais de dois meses “enterrados” num pequeno espaço de uma mina. Nunca tal havia sido vivido! Trata-se de uma impressionante vitória da técnica, da energia política, da solidariedade entre os mineiros. E da solidariedade entre diferentes países, com particular realce para o apoio dado pelos técnicos norte-americanos da NASA.

2. Esta operação, corajosa, meticulosamente organizada e executada com notável rigor será também uma vitória da nova América latina – uma América latina democrática, em processo de notável recuperação económica, capaz de feitos tecnologicamente exigentes. E onde o respeito pela vida humana se vai impondo, ultrapassados que foram os nunca esquecidos crimes contra a vida perpetrados pelas inúmeras ditaduras fascistas que, com apoio do imperialismo norte-americano, massacraram durante décadas no século passado os povos latino-americanos.

3. A inebriante alegria deste “renascimento” não deve impedir que se continue a exigir que se melhorem as condições de segurança em que trabalham os mineiros em todo o mundo. Todos sabemos que nem sempre a incúria dos responsáveis pelas minas tem um happy ending como este.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

PRIMAVERA #17
















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

VERGONHAS

1. Como comunista, não posso deixar de me sentir envergonhado com a promoção a “general” de um puto de menos de 30 anos, nomeado desde já sucessor do presidente norte-coreano. Trata-se claramente de uma “dinastia absolutista-comunista numa república.”

2. Como comunista e português, não posso deixar de me sentir envergonhado com a posição do PCP relativamente à atribuição do prémio Nobel da Paz a um preso político na China. Será que os chineses não têm direito a ter direitos humanos? Será defensável que a luta pelos direitos humanos é legítima em alguns países e censurável noutros? Não será de louvar que se exerça pressão sobre um país que viola os direitos dos cidadãos? Não teremos todos a obrigação de denunciar as condições de trabalho dos trabalhadores chineses?

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

10/10/10 DIA INTERNACIONAL CONTRA A PENA DE MORTE


"Há muitos argumentos contra a pena de morte. Não desencoraja os crimes que castiga, por isso as sociedades que recorrem à pena de morte não têm índices de criminalidade menores do que as outras. Quando um país abole a pena de morte, não fica imerso num caos de crimes. Mas mesmo que a pena de morte reduzisse de facto os índices de criminalidade, passaria a ser aceitável? A pena de morte atinge quem tem menos capacidade económica, os que não podem pagar um bom aconselhamento jurídico, os que não têm voz na sociedade. Diz-se nos EUA que 'pena capital significa que os que não têm capital sofrem a pena'. As estatísticas demonstram que é verdade. Mas seria aceitável, se pessoas de todos os extractos da sociedade fossem executadas? Será que matar um rico faz com que matar um pobre seja correcto? A pena de morte é irreversível, e tem como resultado a morte de inocentes; quando alguém morre, um indulto retroactivo serve-lhe de muito pouco, a si ou à sua família. Desde 1990, na China, na República Democrática do Congo, na Nigéria, no Paquistão, na Arábia Saudita, no Iémen e nos EUA, há registo de 51 execuções de delinquentes juvenis, alguns com apenas 14 anos. Mas mesmo que não morressem mais inocentes ou crianças, deveríamos tolerar a pena de morte? A pena de morte nunca é aceitável. Viola dois dos nossos direitos humanos mais básicos: 'toda a gente tem direito à vida', e 'ninguém deve ser sujeito a tortura'. A pena de morte mata, obviamente, mas também tortura — fisicamente, pela natureza brutal da execução, e psicologicamente, ao forçar seres humanos a ficar à espera do dia em que serão mortos. Por vezes, chegam a aguardar durante décadas, enquanto outros são levados para a morte. O horror desta espera é inimaginável. Os direitos humanos têm esta designação porque se aplicam a todos os seres humanos — pertencem-nos a todos, de forma igual. E um ataque a estes direitos fundamentais, onde quer que seja, é um ataque contra todos nós. O direito à vida é inalienável. Não pode ser dado, e não pode ser retirado. Não importa quão terrível o crime; num mundo cheio de incertezas, os direitos humanos são uma fronteira clara, uma fronteira entre o certo e o errado, uma fronteira entre a prisão e a execução. Quem enfrenta a pena de morte continua a ser, independentemente dos crimes de que é acusado, um ser humano. Por muito que os insultemos, por muito que nos repugnem as suas acções, por muito que desejemos vingança, continuam a ser seres humanos. Podem ter matado e torturado — passaram a fronteira. Mas queremos mesmo seguir-lhes o exemplo?"

Estas palavras, brilhantes, não são minhas; di-las o Jeremy Irons num vídeo da Amnistia Internacional. E pouco há a acrescentar. A pena de morte é o exemplo máximo de que os direitos humanos não são formulações abstractas, que podemos entoar sem os levar às últimas consequências. Enquanto houver Estados para quem a justiça passa por condenar um crime com outro igual, não basta dar o exemplo — é preciso dar testemunho desse exemplo e mostrar que não toleramos a barbárie, seja onde for. Foi o que fizemos ontem em Lisboa, e temos de continuar a fazer todos os dias.

(publicado no Esquerda.net)

domingo, 10 de outubro de 2010

MESMO NOS MOMENTOS MAIS DIFÍCEIS HÁ QUE PROTEGER OS COMPADRES

“Governo recua e volta a admitir acumulação de salários e pensões na função pública” (Público, 9 de Outubro)

Independentemente das razões pretensamente jurídicas que se queiram invocar, a situação é clara, desumanamente clara: cortam-se abonos de família a quem recebe pouco mais de 800 euros, corta-se no subsídio de desemprego, mas, como a querer revelar grande espírito de negociação, permite-se manter uma situação de (ilegal?) privilégio: acumular pensão (em alguns casos mais do que uma) com vencimento na função pública. Quem são os beneficiados? Gestores e altos dirigentes das empresas públicas, deputados, autarcas e ministros, o presidente da república, alguns médicos… Enfim, tudo gente necessitada…

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A CÁTEDRA DO MINISTRO DOS CORNINHOS

O deputado Benardino Soares (PCP) fez ontem, 7 de Outubro, na SIC NOTÍCIAS uma declaração que não pode ignorar-se. Em termos simples, informou que a EDP dera uma “contribuição” de 3 milhões (não sei se de euros ou dólares) à Universidade para onde foi leccionar o ex-ministro dos “corninhos”, Manuel Pinho, e onde há poucos dias Sócrates esteve a mostrar a sua fluência no mais puro inglês. Ou seja, a EDP terá comprado uma cátedra para Manuel Pinho. A EDP, sublinhou e bem B. Soares, é “aquela” empresa que, pelos vistos, tem lucros fabulosos à custa do que nós lhe pagamos pelo uso da energia eléctrica, todos os meses. Poder-se-ia pois dizer que “os portugueses” compraram (à força) essa tal cátedra para o dr. Pinho.
Das duas uma: ou a informação do deputado não é verdadeira (devo porém dizer que já li algo, no mesmo sentido, sobre isto na imprensa escrita de referência) e deverá prestar contas, ou isto é mesmo verdade e o governo deverá intervir de imediato pedindo contas ao seu ex-ministro. Creio que não poderá pedir explicações à EDP que, pelos vistos e para nossa vergonha, é uma empresa privada.
Como está bom de ver, a ser verdade, esta cena dá um excelente retrato do que é hoje ser ministro, mesmo que dos “corninhos”, em Portugal…

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

LISBOA CONTRA A PENA DE MORTE :: 10/10/10

10.10.10
Oitavo Dia Mundial
Contra a
Pena de Morte

Vestidos de negro,
todo o mundo
contra a pena de morte no
Largo Camões às 17h30!

Somos contra a pena de morte porque não combatemos a violência com a violência.
Somos contra a pena de morte porque somos pelos Direitos Humanos.
Somos contra a pena de morte porque recusamos decisões judiciais irreversíveis tomadas por sistemas de justiça frágeis.
Em 2009, de acordo com números da Amnistia Internacional, os países onde foram executadas mais penas de morte foram a China (números desconhecidos estimados em milhares), o Irão (388), o Iraque (120), a Arábia Saudita (69) e os EUA (52),
Este ano, a oitava comemoração do Dia Mundial Contra a pena de Morte detém-se especialmente nos EUA onde foram, em 2009, executadas 52 pessoas e condenadas 106.
Nos EUA, apenas 15 estados federais são abolicionistas, sendo que em 10 dos restantes 35, não tem havido penas de morte há no mínimo 10 anos. Existe contudo uma tendência favorável ao abolicionismo que desejamos reforçar. Isso mesmo confirma um relatório da Amnistia Internacional dando conta que, após um pico em 1994, as condenações diminuíram em 60% na última década.
Instamos os EUA a seguirem o caminho dos 54 Estados que, desde 1990, se tornaram abolicionistas, como por exemplo o Togo, o Burundi, o Canadá, as Filipinas, a Bósnia-Herzgovina e a Turquia.
Existem 58 países no mundo que ainda usam de facto a pena de morte, de entre estes 18 efectuaram execuções em 2009.
Para além da pena de morte formal, existem ainda milhões de pessoas em todo o mundo feridas de morte por Estados que não lhes garantem as mínimas condições para vidas dignas, “vidas vivíveis”, como por exemplo, os/as não documentados/as, os/as sem-abrigo, os/as trabalhadores/as precários/as, os/as jovens lgbt vítimas de suicídio, os/as intersexos/as operados/as sem consentimento e os/as transexuais vítimas de transfobia.
O Dia Mundial Contra a Pena de Morte foi instituído em 2003 pela World Coalition Against The Death Penalty, uma rede de mais de 100 associações a nível mundial.

Em Portugal não podemos ficar indiferentes a esta realidade, por isso apelamos à mobilização contra a pena de morte que mata os direitos humanos no mundo.

(Evento no Facebook)

PORTUGUESES HOJE

Duas “coisas” enchem, nos tempos de hoje, o coração dos portugueses: a descrença nas instituições e a descrença no futuro.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

PETIÇÃO PELO PLURALISMO DE OPINIÃO NO DEBATE POLÍTICO-ECONÓMICO

"As medidas de austeridade recentemente anunciadas pelo governo vieram mostrar, uma vez mais, a persistência de um fenómeno que corrói as bases de um sistema democrático. Nas horas e dias que se seguiram à conferência de imprensa de José Sócrates e de Teixeira dos Santos, os órgãos de comunicação social, nomeadamente as televisões, empenharam-se mais em tornar as referidas medidas inevitáveis do que em promover efectivos espaços de debate em torno das grandes opções político-económicas. 

De facto, os diferentes painéis de comentadores televisivos convidados para analisar o chamado PEC III foram sistematicamente constituídos a partir de um leque apertado e tendencialmente redundante de opiniões, que oscilou entre os que concordam e os que concordam, mas querem mais sangue; ou entre os que acham que o PEC III vem tarde e os que defendem ter surgido no timing certo. Para lá destas balizas estreitas do debate, parece continuar a não haver lugar para quem conteste, critique ou problematize o quadro conceptual que está em jogo e as intenções de fundo, ou o sentido e racionalidade dos caminhos que Portugal e a Europa têm vindo a seguir, em matéria de governação económica. 

Por ignorância, preguiça, hábito, desconsideração deliberada ou manifesto servilismo, os canais televisivos têm sistematicamente tratado a análise da crise económica como se o intenso debate quanto aos fundamentos doutrinários e às opções políticas que estão em jogo pura e simplesmente não existisse. Com a particular agravante de a crise financeira, iniciada em 2008, ter permitido uma consciencialização crescente em relação às diferentes perspectivas, no seio do próprio pensamento económico, no que concerne às responsabilidades da disciplina na génese e eclosão da crise. 
Com efeito, diversos sectores político-sociais e reputados economistas têm contestado a lógica das medidas adoptadas, alertando para o resultado nefasto de receitas semelhantes aplicadas em outros países e denunciado a injusta repartição dos sacrifícios feita por politicas que privilegiam os interesses dos mercados financeiros liberalizados. Mas a sua voz permanece, em grande medida, ausente dos meios de comunicação de massas. 

Não se trata de criticar o monolitismo das opiniões convocadas para o debate, partindo do ponto de vista de quem nelas não se revê. Uma exclusão daqueles que têm tido o privilégio quase exclusivo de acesso aos meios de comunicação seria igualmente preocupante. O problema de fundo reside em ignorar, nos dias que correm, o pluralismo de interpretações e perspectivas sobre a crise, sobre os seus impactos e sobre as opções de superação. 
Somos cidadãos e cidadãs preocupados com este silenciamento e monolitismo. E por isso exigimos aos órgãos de comunicação social – em particular às televisões, e sobretudo àquela a quem compete prestar “serviço público” – que respeitem o pluralismo no debate político-económico de modo a que se possa construir uma opinião pública mais activa e informada. Menos do que isso é ficar aquém da democracia e do esclarecimento. 



Será dado conhecimento da presente petição, e dos respectivos subscritores, às direcções de informação dos canais televisivos portugueses e restantes meios de comunicação social; a responsáveis por programas de televisão que abordam questões político-económicas; aos grupos parlamentares com representação na Assembleia da República e à Entidade Reguladora para a Comunicação Social." 



Para informações e contactos: pluralismonodebate@gmail.com

Assinar a petição aqui.
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SÓCRATES TEM RAZÃO MAS É COMO O FREI TOMÁS…

"É preciso fazer o que tem de ser feito" proclama o primeiro-ministro no seu discurso (?) do dia 5 de Outubro. Ele tem razão: é preciso combater as desigualdades sociais que se acentuam, é preciso combater a fraude e a evasão fiscais, é preciso pôr a banca a pagar impostos justos quando comparados com as outras actividades (as que os pagam…), é preciso que o IMI seja pago pelos palacetes de acordo com o valor desses prédios, é preciso combater o desemprego (e não aumentá-lo, como está a acontecer ). Enfim, é preciso governar no respeito pelos direitos dos cidadãos economicamente mais débeis…
Sócrates, porém, faz exactamente o contrário: aumentando os impostos ataca aqueles que os pagam; nada mais fácil e imediato do que roubar salário aos trabalhadores, nada mais cínico do que diminuir o apoio aos desempregados… Recordando o dito popular: bem prega frei Tomás…

terça-feira, 5 de outubro de 2010

GREVE GERAL COM CGTP-IN, UGT, STE E TODOS OS OUTROS

É uma boa notícia a de que Carvalho da Silva e João Proença se vão encontrar na 5ª feira para analisar a hipótese de uma greve geral conjunta no dia 24 de Novembro. É importante que esses protagonistas tenham presente que representam os trabalhadores. Os trabalhadores têm diferentes opções ideológicas, votam das maneiras mais variadas e boa parte deles (certamente a maioria) votou no PS. E contudo têm a uni-los a necessidade de reagir adequadamente a um ataque injusto que procura fazê-los pagar, mais do que a quaisquer outros, os custos de uma crise que esses outros provocaram e de que, na maioria dos casos, tiraram nítido proveito. Carvalho da Silva tem a seu favor, além de um enorme prestígio social, a força de ser reconhecidamente mais representativo no que respeita ao número de sindicalizados; Proença salientará, que embora menos representativa que a CGTP-IN, a UGT tem forte presença na banca, nos seguros e nos transportes. Ambos terão de reconhecer que a maioria dos trabalhadores, infelizmente, não está sindicalizada e sem eles não há greve geral que se salve. É necessário chamar à greve geral o STE, cuja representatividade nos quadros superiores da Administração Pública é inquestionável.
Uma greve geral juntando sindicatos com perspectivas tão diferentes terá de definir objectivos de luta bem concretos, centrados na defesa de interesses e direitos bem clarificados: só uma tal clareza superará as divergências políticas em presença. Os trabalhadores – mesmo os que votam e continuarão a votar no PS – merecem e exigem esse esforço de real unidade. E deverão pedir contas a quem a quiser impedir.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

PRIMAVERA #16

















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

SOBRE A PRETENSA JUSTIÇA DAS MEDIDAS DE AUSTERIDADE

1. Sócrates e os seus ministros têm vindo a afirmar que os dois submarinos recentemente adquiridos são uma das causas que justificam o aumento dos impostos e o roubo dos salários a boa parte da função pública. Ou seja: eu, funcionário público, vou pagar, durante toda a vida que me resta (uma vez que o Teixeira dos Santos já esclareceu que o "corte" é para ficar...) mais de 200 euros por mês porque uns tantos governantes compraram dois submarinos no "tempo errado". Resta aliás saber se os submarinos eram mesmo indispensáveis e para que vão servir. Para não falar já do imbróglio jurídico em que a compra está envolvida - fala-se de contrapartidas que os alemães nunca cumpriram nem fazem tenção de cumprir, fala-se de grossas luvas pagas ao CDS (ao Partido e /ou aos seus principais dirigentes). Mas quem paga tudo isto sou eu e milhares como eu que passávamos muito bem sem esses submarinos que nunca veremos.

2. Mas aos submarinos, se a verdade fosse um valor, mesmo que mínimo, para o primeiro-ministro, deveria Sócrates acrescentar os muitos milhões com que o Estado premiou os especuladores do BPN e do BPP. Os grandes economistas e políticos que dirigiram, com grande espírito de inovação e de empreendadorismo, esses bancos devem estar cinicamente a rebolar-se de gozo: fizeram todos esses crimes, ganharam milhões e milhões e ainda nos puseram a pagar para eles… Entre os finórios, recorde-se estão um antigo ministro e conselheiro de Estado e umantigo responsável governamental, imaginem, pela área dos impostos… Além dos mais conceituados economistas ultraliberais da nossa praça - os tais que nos queriam convencer de que a Irlanda era o modelo a imitar.
Vamos pagar mais impostos e vão roubar-nos parte do salário também porque, a acreditar no que Louçã denunciou na AR, a PT não pagará praticamente nada pelo grossíssimo negócio que fez com a venda da Vivo, porque há uma empresa com grande volume de negócio que nada pagará de impostos usando a zona franca da Madeira e, de uma forma geral, como muito bem denunciou Silva Lopes em entrevista recente, os grandes empresários e os ricos conhecem muito bem as artes de fugir legalmente aos impostos.
Por tudo isto (e talvez por muito mais) é falso que as medidas de austeridade que o governo quer impor tenham qualquer justiça: elas são necessárias porque uns tantos roubam das formas mais diversas, nomeadamente fugindo aos impostos (com apoio objectivo do poder político).

3. Além do mais, não tem o mesmo peso roubar 3,5% a quem ganha 1500 euros ou 10% a quem ganha 15.000: ao primeiro fará certamente diferença para o seu dia a dia; ao segundo, afectaria apenas a sua conta bancária se ele não descobrisse rapidamente meio de "recuperar o seu dinheiro" acentuando a fuga aos impostos, inventando ajudas de custo, despesas de representação e outros truques.

4.Em síntese: pagam os que vivem do seu salário mensal e que, por convicção ou inevitabilidade, descontam religiosamente os seus impostos para os que, sendo os principais responsáveis pela crise, continuam a viver como se ela não existisse quando não enriquecendo mesmo com ela.

5. Uma última nota: pelos vistos o director da CGD entende que devem ser os clientes a pagar um eventual imposto sobre a Banca que, ao que li, se destina a apoiar os bancos em caso de crises que os afectem. Não há limites para a pouca vergonha?

domingo, 3 de outubro de 2010

DE COMO SÓCRATES CONTRIBUI PARA MELHORAR A SAÚDE DOS PORTUGUESES

Diz-se que rir faz bem à saúde. Certamente foi a pensar pelo benefício geral que Sócrates nos levou á gargalhada ao garantir ontem, em entrevista a um órgão de comunicação social, que no ano de 2011 não haverá novas medidas de austeridade. Esta garantia vale o mesmo que a garantia de que não haveria aumento de impostos — ainda há poucos meses sustentada com bravura e galhardia — que isso não lhe falta — na Assembleia da República. Vale o mesmo que a tese sistematicamente reafirmada que uma prova de bom governo do PS era o facto de Portugal ser dos primeiros países a sair da crise… "Está-se mesmo a ver, não está?"

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

FICA SEMPRE BEM "MALHAR" NOS PROFESSORES

Sobre as "intenções impostas" pelo Conselho de Ministros no passado dia 27 já se disse e escreveu muita coisa. Já se tornou claro que este "pacote" terá efeitos recessivos, isto é, tornará Portugal num país (ainda) mais pobre, empobrecerá a chamada "classe média", aumentará o desemprego e… tornará uns tantos obscenamente ainda mais ricos.
Destruir-se-ão as pessoas em nome do combate ao deficit. Não está em causa a necessidade da redução do deficit nem se duvida que para tal sejam necessárias dolorosas medidas. Mas, no seu conjunto, a apregoada receita acabará provavelmente por "matar o doente". A comparação com a Irlanda e com a Grécia e mesmo com a Espanha, países que voluntariamente ou à força, aplicaram estas mesmas medidas, nomeadamente o corte dos salários (convém saber que estes cortes na função pública arrastarão também cortes ou congelamentos salariais no sector privado), antecipa-nos os resultados: a Grécia e a Irlanda confrontam-se com um elevado PIB negativo (a Espanha, ainda numa fase de estagnação) sendo particularmente séria a situação na Irlanda, onde só uma intervenção do Estado no valor de 34 mil milhões de Euros impediu a falência de um dos maiores bancos irlandeses. Formalmente, o deficit da Irlanda, com esta medida, ultrapassou os 30%.
Este roubo aos trabalhadores do Estado, mesmo que fosse inevitável, é profundamente injusto. Os nossos salários estiveram congelados este ano (2010) e, com a excepção da benesse eleitoral de há dois anos, ou foram congelados ou tiveram sempre aumentos inferiores à inflação. Ou seja, não foram os aumentos salariais na administração pública que fizeram disparar o deficit.
Sempre que se trata destas matérias, os professores aparecem como os maus da fita. E até o normalmente correcto Silva Lopes, em entrevista ontem numa das televisões, não se coibiu de considerar o acordo com os sindicatos dos professores como uma das causas do agravamento do deficit. Acontece que o acordo obtido no início do ano ainda não está, de facto, em aplicação. Pouquíssimos são os professores que dele tenham já financeiramente beneficiado. As mudanças de escalão aí previstas, na maioria dos casos, só têm repercussão financeira a partir de 2011! Ou seja: estão a "culpar-nos" por benefícios que ainda não tivemos e que, tudo o indica, não teremos. Mas fica sempre bem malhar nos professores.

Nota: já o referi várias vezes: mas seria um acto de dignidade intelectual que os reputados economistas que durante vários anos nos impingiram ditirâmbicos discursos sobre a excelência do desempenho do ultraliberalismo irlandês — um exemplo que Portugal devia seguir, diziam eles — viessem, de corda ao pescoço, reconhecer que se enganaram de forma desastrada: a sua predilecta Irlanda consegue estar bem pior do que nós…