sexta-feira, 24 de junho de 2011

RUI TAVARES

Não acompanhei – nem me apetece acompanhar – a polémica entre Louçã e Rui Tavares. Não sou do Bloco de Esquerda pelo que essas coisas “internas” me passam ao lado. Leio com muito interesse os textos que Rui Tavares publica no jornal Público. São textos lúcidos, politicamente inteligentes, de uma esquerda que não se limita a repetir ideias feitas. Tenho pena que uma voz tão interessante se afaste do BE. Admito, como outros sugerem, que a decisão de Rui Tavares seja demasiado “radical” face à importância da questão que provocou a cisão. Mas obviamente há dados que só eles conhecem pelo que não posso fazer juízos definitivos. Espero é que Rui Tavares continue a questionar-nos e a estimular-nos.
Uma pergunta incómoda: estará o BE a tornar-se demasiado igual a todos os outros partidos? O ambiente de crise que parece atravessar o BE é tudo o que a esquerda portuguesa não precisa. Mas talvez mereça.

terça-feira, 21 de junho de 2011

UM NOVO MINISTRO

1. Voltámos ao reino do masculino. E, recusando desde já generalizações precipitadas, há que dizer que do reino do feminino, nestas questões de ministros, não ficam boas memórias. Por razões diferentes: Lurdes Rodrigues pelo seu entranhado ódio aos professores, Isabel Alçada pela sua inexistência política.

2. Manda o bom senso que nunca se tracem quadros demasiado definitivos sobre um novo ministro, neste caso o professor Nuno Crato. As suas diatribes mais ou menos inflamadas contra os sindicatos dos professores e contra as “ciências da educação” devem ser analisadas no contexto de um discurso televisivo, pouco exigente, aqui e ali desnecessariamente populista e a deixar antever evidentes falhas de informação sobre a realidade. E é da realidade que Nuno Crato vai ter de tratar. Espero francamente que Nuno Crato ponha na análise das situações quotidianas vividas pelas escolas e pelos professores e educadores o rigor e a (possível) isenção, apanágios de um espírito científico.

3. Há que ser objectivo no significado que damos a cada conceito: todos nós certamente somos pelo “rigor das aprendizagens” e contra o “facilitismo”. Mas não é certo que o que Nuno Crato chama de rigor e de facilitismo tenha o mesmo significado para os docentes que utilizam esses mesmos vocábulos. Como a expressão “escola pública de qualidade” poderá não significar o mesmo para os diferentes “quadrantes” que a usam.

4. A postura dos sindicatos dos professores só pode ser uma: exigir medidas que reconduzam a escola à sua função primordial e que possam pacificar o conturbado ambiente escolar – nomeadamente pondo termo desde já ao actual modelo de avaliação de desempenho; exigir que os professores possam de facto ser professores – o que exige o respeito pelos seus horários e pelo seu estatuto profissional; exigir que a escola pública, que é a escola para todos, seja a mais apoiada de modo a ser a de melhor qualidade.

5. Aos professores e educadores exige-se, talvez mais do que nunca, que saiam da sua apática modorra, que definam a escola que querem e a profissão que exigem. Contra ou a favor do novo ministro, vai depender das suas políticas, da sua competência, da sua capacidade de “ler” o que se passa no quotidiano das nossas escolas.

terça-feira, 14 de junho de 2011

AS CONTRADIÇÕES DE CAVACO

Não deixa de ter razão o Presidente Cavaco Silva: é necessário e útil regressar à agricultura e às pescas e é necessário combater o despovoamento do interior. Mas é importante que o presidente Cavaco se penitencie pelas medidas do primeiro-ministro Cavaco cujo governo, seguindo acriticamente a Politica Agrícola Comum (PAC) imposta por Bruxelas, desmantelou a nossa frota pesqueira e pagou para não se produzir e mesmo arrancar o que se tinha plantado e semeado. Foi o tempo em que jeeps, pretensamente destinados aos campos, inundaram as cidades… Enfim, desta vez ele terá mesmo razão; falta-lhe é a autoridade moral para ser levado a sério.

terça-feira, 7 de junho de 2011

DE SÓCRATES, O QUE FICA ?

“O que fica” é o título de um artigo de Vital Moreira inserto no jornal Público de hoje (7 de Junho). Benévolo, o articulista sustenta que, passado este “vendaval”, a história registará Sócrates como um político corajoso, reformador, capaz de enfrentar as “corporações” que se tinham apoderado do Estado, cuja eficácia Sócrates teria melhorado. E enumera um vasto campo de “sucessos” do consulado de Sócrates, sobretudo no seu primeiro mandato. Ser benévolo para com um derrotado é sempre uma atitude simpática e louvável. Temo porém que, ao invés e apesar de várias reformas que a história acabará, com justiça, por registar e conservar, essa mesma história registe Sócrates sobretudo como um “contador de estórias”, como um exemplo excelente de quem pensa que, na política, o que menos interessa é a realidade. As meias-verdades – pior do que mentiras – com que José Sócrates foi embrulhando o país, mesmo durante a campanha eleitoral, tornaram-no paladino do descrédito da política e dos políticos. Ao escolher Sócrates para fazer a campanha como candidato a primeiro-ministro (inevitável, uma vez que o Congresso o coroara olimpicamente), o PS decretou a sua inevitável derrota. Uma linha unia os vinte e tal por cento de indecisos no início da campanha: a sua oposição a Sócrates. Por isso, o “empate técnico” (das sondagens) se transformou, paulatinamente, numa diferença de dez pontos percentuais.
Uma das ditas “corporações” contra quem, tal Sancho Pança, Sócrates investiu foi a classe dos professores. Nas escolas, o que fica de Sócrates e das suas ministras é o ar empestado da descrença, da desistência, da amargura, da divisão insensata dos professores. Porque mesmo intenções louváveis (a “escola a tempo inteiro”, as actividades de enriquecimento curricular, o inglês no 1.º ciclo) acabaram por ter eficácia muito limitada devido à falta de rigor e de “conhecimento no terreno” com que foram implantadas. Ou se revêem ou soçobram.
O que fica então do consulado de Sócrates, para lá da anemia de um Partido Socialista alinhado cada vez mais â direita?

segunda-feira, 6 de junho de 2011

ALGUMAS QUESTÕES INEVITÁVEIS NO DIA 6 DE JUNHO

1. O que ganharam a esquerda e sobretudo os trabalhadores com a ajuda dada pelo PCP e do Bloco de Esquerda para o derrube do Governo do PS? (Para já não falar da moção de censura do BE, certamente o facto político mais anedótico das últimas décadas)

2. É indubitável: os trabalhadores ficaram mais desprotegidos e mais incapazes de resistir “ao que aí vem.” Que ganharam eles com a atitude “heróica” de o PCP e o BE se terem recusado a “falar” com a troika?

3. Veja-se a diferença: a esquerda , em nome da pureza dos seus princípios e ideais, foi incapaz de construir, com o PS, um governo estável; ofereceu de mão beijada à direita o poder: vejam como eles (PSD E PP) logo se entenderam para um governo “seguro”.

4. Torna-se absolutamente necessário que os partidos de esquerda ultrapassem as suas velhas quezílias. Admito que para tal seja necessário criar um novo partido, que rompa com esta mania suicidária. Só assim se defenderá quem trabalha. Porque, como já toda a gente sabe, mesmo os que fingem não saber, as lutas sindicais e “de rua” são importantes mas são ineficazes se não se suportarem em soluções políticas (de poder).

quinta-feira, 2 de junho de 2011

CONTRA A ESCALADA NEOLIBERAL, POR UMA NOVA AGENDA SINDICAL

Manifesto

Na última década, no quadro das novas condições da globalização, o capital multinacional e os governos neoliberais desencadearam uma nova fase de liberalização, de privatizações, de ataques sistemáticos ao Estado Social e aos direitos dos cidadãos e dos trabalhadores. Na Europa, boa parte das medidas anti-sociais e anti-laborais foi justificada em nome dos critérios de convergência para a moeda única e em nome da defesa da estabilidade financeira da zona euro.
A crise financeira global que emergiu em 2007-2008, em vez de constituir uma oportunidade para os governos e instâncias supranacionais repensarem os tremendos riscos sociais e políticos do liberalismo de mercado, introduzindo mecanismos de regulação e reorientação das políticas eco nómicas, teve um resultado bem diferente. Com efeito, os Estados acorreram a salvar os sistemas financeiros, injectando somas colossais, sem lhes fazer exigências ou introduzir penalizações. Não impondo a regulação que se impunha, colocaram-se à mercê dos mercados financeiros, da sua voracidade e das suas condições de financiamento, que penalizam dramaticamente os países em situação mais frágil.
As instâncias da União Europeia tremeram pelo Euro e sucumbiram à chantagem fazendo suas as condições das instituições financeiras. As regras da zona Euro quanto ao controlo do défice e da divida têm vindo a constituir o pretexto para propostas de políticas que visam cumprir integralmente a agenda neoliberal, salvaguardando os interesses dos ricos e poderosos e penalizando brutalmente os trabalhadores e demais cidadãos. No quadro da escalada da crise, em 2010, a UE reforçou os constrangimentos e pressões sobre os estados membros, processo que se acentuou recentemente com a cimeira do Conselho Europeu de 24 e 25 Março.
Os países do sul da Europa (Espanha, Grécia e Portugal) e a Irlanda, in cluídos na zona Euro, têm sofrido as consequências da tripla pressão FMI/ Agências privadas de rating/ União Económica Monetária, levando ao corte dos salários dos trabalhadores do sector público, ao corte do investimento público no sector produtivo, a novas privatizações, à redução da protecção social, incluindo o congelamento ou diminuição das pensões e benefícios sociais e a multiplicação das restrições ao seu acesso, bem como a limitação dos subsídios de desemprego e a facilitação dos despedimentos.
As consequências desta tripla pressão são dramáticas, visto que põem em causa o Estado Social e os direitos laborais duramente alcançados, promovendo a desigualdade e a exclusão social e, em vez de promoverem o crescimento e o desenvolvimento económico, aprofundam a crise económica através de uma política fortemente recessiva. No plano político, fragilizam-se as bases da democracia e do exercício da cidadania, enfraquecendo também o poder de decisão dos parlamentos nacionais.
Na Europa, em muitos países, os trabalhadores e demais cidadãos, os sindicatos e variadas organizações da sociedade civil, têm vindo a reagir fortemente contra as políticas de austeridade, com greves gerais, manifestações e outras formas de contestação, incluindo a adesão às iniciativas de protesto da Confederação Europeia dos Sindicatos. Em Portugal, os trabalhadores do sector público e do sector privado, os precários e não precários, têm vindo a exigir uma viragem nas políticas nacionais e europeias. Em Portugal, a greve geral do sector público e privado de 24 de Novembro de 2010, juntan- do a CGTP e a UGT, constituiu uma resposta unitária massiva aos planos de austeridade dos vários PEC e do Orçamento para 2011. A manifestação de 19 Março de 2011 promovida pela CGTP contra o mais recente PEC 4 insere-se também neste movimento. A extraordinária mobilização do 12 de Março, ao apelo dos jovens, mostrou a quem tinha dúvidas a profunda vontade de mudança no sentido da justiça social.
Os sindicatos estão numa situação crítica sem precedentes, em Portugal e na Europa, confrontados com sucessivos planos de austeridade que representam um verdadeiro retrocesso social. Simultaneamente são atacados como estru turas corporativas que defenderiam interesses instalados ou como obstáculos ao livre funcionamento do mercado de trabalho. São acusados de pactuar com o desemprego quando defendem a estabilidade do vínculo laboral. São acu- sados de aprofundar a crise quando defendem salários decentes e o Estado Social. São pressionados a aceitar mais e mais flexibilidade e insegurança. Em suma, são pressionados a deixar de desempenhar o seu papel como sindicatos.
Nas últimas duas décadas os sindicatos definiram em grande medida as suas estratégias e práticas numa lógica defensiva face à agenda liberal. A crise actual e o que se anuncia exige uma profunda reflexão, ancorada é certo nas aquisições da experiência sindical passada, mas capaz de promover novas agendas, estratégias e práticas que reforcem a capacidade dos sindicatos de influenciar realmente os acontecimentos. A ancoragem nas aquisições da experiência sindical passada é fundamental, sobretudo tendo em atenção uma lição fundamental: a construção da capacidade de mobilização dos trabalhadores e de inscrição na sua vida colectiva é uma fonte essencial do seu poder de negociação e do seu poder de alcançar resultados.
À deriva burocrática e rotineira, é preciso responder com o reforço da demo cracia interna e com a ampla discussão envolvendo a base. Ao fechamento dos sindicatos é preciso responder com a abertura e diálogo com outras organizações e associações da sociedade civil, criando sinergias e potenciando a acção comum efectiva. A relação dos sindicatos com os partidos políticos, que foi sendo historicamente uma constante do movimento dos trabalhadores, tem de ser repensada, reforçando a autonomia e independência dos sindicatos, mas permitindo a acção conjunta quando a natureza transversal do combate político e social o exigir.
A reflexão impõe-se para uma acção esclarecida e coordenada a nível na cional e europeu. E certamente também no plano internacional. Com o desmantelamento dos direitos sociais e laborais na Europa não é só a Europa e os países que dela fazem parte que têm a perder. A sua defesa na Europa é um capital de esperança para os trabalhadores e cidadãos de todo o mundo, incluindo nos países onde milhares e milhares de trabalhadores ingressando agora nas empresas industriais subcontratadas ou deslocalizadas da Ásia começam a fazer as primeiras experiências de acção colectiva, ainda sem sindicatos livres e independentes.
Nós, sindicalistas, cidadãos envolvidos em diferentes organizações e movimentos sociais, e cientistas sociais, decidimos tomar em mãos algumas iniciativas para contribuir para esta reflexão urgente, porque sentimos que é exigido o concurso de todos e a partilha de experiências e pontos de vista para aprofundar o diagnóstico, encontrar respostas e formular acções, no quadro da liberdade de expressão e discussão. Este manifesto é o nosso ponto de partida.
Contra a escalada neoliberal
Por uma nova agenda sindical

Abel Macedo, Coord SPN :: Adriano Campos, Membro do FERVE - Fartos/as d'Estes Recibos Verdes :: Alan Stoleroff, Prof Univ ISCTE :: Américo Monteiro, Sind Com Braga :: André Freire, Politólogo, Professor do ISCTE-IUL :: António Avelãs, Pres SPGL :: António Brandão Moniz, Prof Univ :: António Chora, CT Autoeuropa :: António Nabarrete, Vice Pres SPGL :: Bruno Cabral, Membro da Plataforma dos Intermitentes do Espectáculo e Audiovisual :: Carlos Trindade, Exec CGTP :: Conceição Rodrigues, Exec CGTP :: Constantino Alves, Padre, Pós graduado em Serviço Social, Ex sindicalista :: Cristina Andrade, Membro do FERVE :: Diamantino Elias, Pres SIFAP :: Elísio Estanque, Sociólogo, CES/ /Universidade de Coimbra :: Emídio Martins, Sindicalista Jubilado :: Fernando Gomes, Exec CGTP :: Florival Lança, Sindicalista Jubilado :: Francisco Alves, Dirigente Sind Meta lurgicos :: Guadalupe Simões, Dirigente SEP :: Heloisa Perista, socióloga, CESIS - Centro de Estudos para a Intervenção Social :: Henrique Borges, Dirigente SPN :: Henrique Sousa, Investigador em Ciência Política :: Hermes Costa, CES/Univ de Coimbra :: Hugo Dias, Doutorando de Sociologia da Fac Economia da UC :: Ilona Kovacs, Prof Univ, ISEG :: João Correia, CSCA :: João Cunha Serra, Pres Cons Nac FENPROF :: João Lourenço, Exec CGTP :: João Nunes Rodrigues, dirigente da FNAM e do Sind dos Médicos da Zona Centro :: João Rodrigues, CES/Univ de Coimbra :: Joaquim Pilo, Dirigente Sind Pescadores :: Jorge Bateira, Economista, PhD Manchester Business School :: Jorge Rebelo, Dirigente SEP :: José Carlos Martins, Pres SEP :: José Maria Castro Caldas, CES/Universidade de Coimbra :: José Reis, Prof Univ, da FEUC :: Júlio Gomes, Prof Univ :: Luis Costa, Consultor :: Manuel Carlos Silva, sociólogo, professor universitário :: Manuel Grilo, Vice Pres SPGL :: Manuela Mendonça, Coord SPN :: Manuela Silva, Prof Univ Jubilada :: Marco Marques, Membro dos Precários Inflexíveis :: Margarida Maria Simões Chagas Lopes, Profª Univ :: Maria da Paz Campos Lima, Prof Univ ISCTE :: Maria Merlinde Madureira, Pres do Sind dos Médicos do Norte e Vice-Pres da FNAM :: Mário Jorge, Pres do Sind Médicos da Zona Sul e Vice-Pres da FNAM :: Mário Murteira, Prof Univ :: Óscar Soares, Pres Cons Jurisd CGTP :: Paulo Granjo, Antropólogo - ICS :: Paulo Sucena, Pres do Cons Geral do SPGL, ex SG FENPROF e CE da CGTP :: Raquel Rego, investigadora auxiliar, SOCIUS-ISEG-UTL :: Rui Brites, Sociólogo, Prof Univ :: Sara Falcão Casaca, Prof Univ, ISEG-UTL :: Sara Rocha, Membro dos Precários Inflexíveis :: Sérgio Esperança, Pres da FNAM e Pres do Sind dos Médicos Zona Centro :: Tiago Gillot, PI - Precários Inflexíveis :: Ulisses Garrido, Exec CGTP

(Disponível em .pdf aqui, juntamente com o convite e programa do Seminário Internacional Sobre Sindicalismo :: 18/5 :: Lisboa)