segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Ao SUL #13






















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

AMÉRICA LATINA

Três acontecimentos sobre a América Latina marcaram este fim de semana: a eleição de Pepe Tujica para presidente do Uruguai, as eleições nas Honduras e o início da cimeira Ibero-América Latina. Desta última falaremos no seu termo.
A eleição do antigo guerrilheiro (tupamaro?) como presidente do Uruguai, dando continuidade à vitória de Tabasquez e confirmando o domínio da esquerda nesse país, é o mais recente momento de uma viragem notável que está a ocorrer no espaço da América do Sul e Central. Após um século XX na sua quase totalidade marcado pelo predomínio de ditaduras terroristas (militares e civis), com a cumplicidade ou apoio expresso dos USA e da Europa "ocidental", concentrando obscenas riquezas nas mãos de uns tantos oligarcas e reduzindo à miséria a maioria da população, o final do século e os primeiros anos do século XXI assistem à subida ao poder de "frentes" predominantemente sociais democratas e socialistas, que contam com o apoio claro da população e que têm conseguido melhorar de forma inquestionável as condições de vida dos mais pobres. E se ainda hoje nos emocionam os relatos das lutas heróicas dos guerrilheiros contra os tiranos, e reconhecendo que o seu esforço — e que esforço, sujeitos a indizíveis condições de vida, a torturas bárbaras, a assassinatos constantes — foi necessário para chegar onde hoje estamos,  um dado se torna óbvio: só se consolida o poder com o apoio inequívoco da população, nomeadamente das populações que reconhecem a melhoria das suas condições de vida. É neste contexto que é imperioso denunciar a farsa das eleições nas Honduras, onde um golpe de estado militar afastou o presidente eleito e que procurava que o seu país "acertasse o passo" com a marcha da América Latina para a democracia. Fingir que a situação nas Honduras é "normal", que houve eleições livres e justas, e reconhecer o presidente que resultar desta farsa é criar o caldo político e cultural para o regresso ao passado das ditaduras terroristas e fascistas, ao serviço dos monopólios e de uns tantos gatunos. Vamos ver como é que a cimeira que decorre em Lisboa se posiciona: se alenta a marcha para o futuro ou se apoia o regresso ao passado.

OS PADRES E BISPOS CATÓLICOS E A PEDOFILIA

Depois de enorme escândalo das dioceses norte-americanas levadas à falência por indemnizações pagas, por decisões dos tribunais, às vítimas de abusos sexuais dos senhores "priores", sobre os seus "meninos (as) de coro" foi agora a vez de os bispos irlandeses terem de  reconhecer não só os crimes praticados pelos seus padres, incluindo práticas pedófilas em instituições e colégios à sua guarda, mas também que eles, os bispos, deliberadamente ocultaram esses crimes. Esperemos que os tribunais não tenham contemplações. Serão estas (enormes) comunidades as excepções ou apenas está posta a nu a ponta do icebergue? Recordemos entre nós o miserável comportamento do bispo do Funchal (e da justiça (?) lusa) não só encobrindo os crimes pedófilos do padre Frederico, mas facilitando-lhe a fuga para o Brasil apesar da enorme suspeita do seu envolvimento no assassínio de uma das suas vítimas adolescente!
Que a igreja católica, se lhe resta ainda alguma credibilidade, investigue com rigor  se percentualmente o número de pedófilos no clero é superior ao da população em geral. Se assim for, mude radicalmente o "perfil" destes "representantes de deus" que parecem levar demasiado à letra o texto evangélico "deixai vir a mim as Criancinhas."

domingo, 29 de novembro de 2009

Ao SUL #12















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

A MANEIRA MAIS TRISTE DE RECORDAR QUE A LEI DEVE SER IGUAL PARA TODOS

O acidente envolvendo dois carros do Estado, de elevada cilindrada, provocado por excesso de velocidade, na Av. da Liberdade em Lisboa, com o lamentável desfecho de feridos com maior ou menor gravidade, deixa um aviso claro: a lei — neste caso o da limitação de velocidade dentro das cidades —  tem de ser respeitada por todos. E os governantes têm de dar o exemplo. A justificação de que o juiz Mário Mendes estava atrasado para a tomada de posse dos senhores governadores civis é uma vergonha. Saísse mais cedo, ou reorganizasse a sua agenda. Mas não tem o direito de pôr a sua vida e a de outros em perigo só porque é membro do governo. Se eu estiver atrasado para apanhar o comboio — e o comboio não espera — também não posso acelerar pelas ruas de Lisboa! Que este lamentável acidente sirva de exemplo para as colunas da polícia e da GNR que, de sirene desnecessariamente abertas, voam pelas ruas da cidade pondo em perigo a vida dos cidadãos.
Já agora, espero que, tal como aconteceria a qualquer um de nós, os condutores sejam multados pelas irregularidades cometidas.

SOBRE A NECESSIDADE DE REPENSAR O CONCEITO DE FAMÍLIA - 5 ESTRELAS!

O artigo de Daniel Sampaio inserto na PÚBLICA de hoje  é excepcional! Não hesite: leia-o já!

sábado, 28 de novembro de 2009

Ao SUL #11















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

DO APELO À COMPAIXÃO OU DE UM APELO À JUSTIÇA

Jorge Sampaio considera injusta a “condenação na praça pública” a que se sujeitam as figuras “públicas” quando se vêem na situação de simples arguidos. (1) E, claro, estamos de acordo com ele e todos nós esperamos que quem os julga se não deixe intimidar por tal facto. Contudo, após ouvir as declarações de algumas dessas figuras a contas actualmente com a justiça, interrogo-me se não haverá da parte delas um atitude de sinal contrário e tão perigosa (e injusta) como a anterior: a do ar compungido de todos eles, reclamando a sua total inocência, benfazejos que nem santinhos de altar a quem uns juízes, por incompetência ou intencional perseguição, tiraram dos seus “importantíssimos afazeres ao serviço do bem comum”. Armando Vara é reconhecidamente um excelente pescador em águas turvas. Boa parte dos portugueses se interroga a que se deve a sua meteórica ascensão na banca, tarefa para a qual não estaria particularmente preparado. Viu-se já envolvido num nebuloso e nunca cabalmente esclarecido processo da Fundação para a Prevenção e Segurança. Ninguém terá estranhado que A. Vara tenha sido apanhado neste jogo de corrupções e corrupçõezinhas em que a nossa política, de mão dada com as grandes empresas económicas, se vem deixando enredar. Foi pois um pouco chocante ouvi-lo falar do seu duro sofrimento pela cabala que alguém lhe teria urdido (1)… Foi detido o Sr. Godinho das sucatas por falcatruas pelos vistos bem documentadas? Logo se ergue o coro dos conterrâneos e amigos a realçar a sua bondade, a sua benemerência, o seu amor pelos pobres…E o bom desempenho (suponho) de Oliveira e Costa como Director Geral dos Impostos, num dos governos de Cavaco Silva, não compensará as suas fraudes, as suas fugas aos impostos, o seu recurso a paraísos fiscais? Não aparecerão na altura devida as instituições de caridade e os bombeiros a apregoarem os benefícios que dele terão provavelmente recebido? E os imaginados relevantes serviços de Dias Loureiro à causa pública não se sobreporão aos crimes fiscais e económicos que tenha cometido? E que dizer dos geniais gestores do BPP, senão que procuraram obter, fosse por onde fosse, os maiores lucros para os seus clientes (e para si próprios)  e tentar garantir que, “se coisa desse pró torto” nós todos lhes pagaríamos os prejuízos? Gente tão empenhada no seu metier, causa dó vê-la assim em apuros. Não havia necessidade…

Uma esperança, talvez ridícula: que a justiça julgue bem. Sem se deixar iludir por juízos na praça pública nem por seráficos cantos de sereia…

(1) Citações (de cor) do noticiário da TSF às 15 horas de 27 de Novembro.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Ao SUL #10















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

O QUE É UM CRIME DE GUERRA?

Sei que este tema é já velho. Mas não consigo ficar indiferente à noticia publicada no Público do dia 26 de Novembro (pg. 15): "Londres sabia que Saddam não tinha quaisquer armas". E o artigo esclarece que um alto funcionário do Ministério de Negócios Estrangeiros britânico afirmou à comissão de inquérito que o governo britânico soube poucos dias antes da invasão do Iraque que aquele país não possuía quaisquer armas de destruição maciça — o pretexto oficialmente invocado para a agressão àquele país. Como o sabiam os Estados Unidos. Um conjunto de chefes de estado (além de Tony Blair e G.Bush, também o português
Durão Barroso e o chefe do governo espanhol) decide mentir — e sabiam, pelos vistos, que estavam a mentir — ao mundo para atacar um país, o Iraque. Sabe-se com que resultados: milhares de soldados americanos, ingleses e de outros países  e milhões de iraquianos (civis e militares) mortos, um país reduzido a destroços e sujeito a uma interminável guerra civil. Se uma decisão deste tipo fosse tomada pela Sérvia, por exemplo, teríamos estes responsáveis julgados no Tribunal de Haia por crimes de guerra. Como se trata de dirigentes de países "ocidentais", em vez do tribunal, Durão Barroso foi promovido a principal dirigente da União Europeia e os restantes continuaram a tratar das suas vidas e dos seus países.
Haverá quem insista : tratava-se de derrubar um ditador. Falso argumento: o ditador Saddam não o era mais que o seu congénere da Arábia Saudita ou do invadido Koweit. E os norte-americanos não têm por tradição derrubar ditadores: costumam impô-los e apoiá-los (o Baptista de Cuba, os Strossner do Paraguai, os Duvalier do Haiti, os Somoza na Nicarágua, o Pinochet do Chile,...  e muitos outros).
Só são criminosos de guerra ou os que são derrotados ou os mais fracos. Uma réstia de esperança na verdade: a mesma notícia informa que as famílias dos 179 britânicos que morreram na guerra querem interrogar Tony Blair...

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

NEGOCIAR PARA OBTER RESULTADOS

Negociar com firmeza exige uma definição criteriosa do que, em cada momento concreto, é legitimo exigir e o que é legítimo esperar que o poder ceda. O documento que o Ministério entregou hoje aos sindicatos, traduzindo uma primeira aproximação ao que virá a ser a estrutura da futura carreira docente, tem uma característico importante: assenta numa lógica de carreira única, tal como sempre os professores exigiram. E por isso torna possível a negociação. Mas, a meu ver, deve ab initio ser claro que não é legítimo esperar que os sindicatos aceitem soluções que, a troco do fim da divisão da carreira em "Professores e Titulares", criem mecanismos que tornem ainda mais difícil a progressão na carreira. Não se trata da defesa de "facilitismos "ou de "igualitarismos". Trata-se apenas de reconhecer que os professores e os educadores que cumprem bem as suas funções têm direito a uma progressão normal na sua carreira. Que outros andem mais depressa porque se revelam de facto melhores, ou se retardem porque manifestamente não cumprem o exigido, é natural e justo. Mas não se use o slogan do "reconhecimento do mérito" para penalizar os que, talvez não sendo "excepcionais" (seja lá o que isso for),  cumprem com rigor a sua função.
Contra o "imediatismo infantil" de uns tantos bloggers, para quem negociar é trair, defendo que os professores e os educadores, através dos seus sindicatos representativos, devem negociar enquanto for possível e tudo o que for possível. O seu real envolvimento no processo evitará que o Ministério ou o Governo possa impunemente impor soluções inaceitáveis, mas evitará também que "aventuras" próprias de quem não tem que prestar contas conduzam os docentes para becos sem saída ou para derrotas reais.
É imperioso que todos nós compreendamos que a escola pública portuguesa, debilitada após os desatinos da equipa anterior, não suportará uma situação igual à que acabámos de viver. E isso exige que o esforço negocial seja levado ao extremo. Mesmo quando o Ministério nos surpreende negativamente com o seu primeiro "papel". Sendo contudo claro que há soluções inaceitáveis e que essas obrigarão os professores a reagir.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Ao SUL #9














Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS NAS ANÁLISES DOS ECONOMISTAS

Se há atitude que me irrite é a dos economistas bem pagos e com boa riqueza acumulada vociferando contra os salários, quantas vezes baixíssimos, de quem trabalha, quer por no sector privado quer na função pública. Mas irrita-me ainda mais quando, numa pura falta de honestidade intelectual,  usam diferentes "medidas" de análise, de acordo com os seus interesses de momento. Vem este arrazoado a propósito dos comentários de Silva Lopes e quejandos, muito preocupados porque os trabalhadores da função pública tiveram no ano de 2009, por força da inflação inexistente e do seu aumento salarial, um real aumento do poder de compra. Esquecem-se, isto é fingem esquecer-se, dos anos sucessivos em que esses mesmos trabalhadores perderam brutalmente poder de compra, com aumentos claramente inferiores à inflação (em alguns casos, aumento "zero"). Essa tem sido a norma nos últimos anos, perante o silêncio cúmplice desses mesmos sábios economistas. Vão para o diabo que os carregue!

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Ao SUL #8















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

CIDADÃOS POR LISBOA REAFIRMAM PROJECTO E AUTONOMIA

O SOL, na sua edição on-line de ontem (23 de Novembro), noticia que os Cidadãos por Lisboa vão requerer à presidente da Assembleia Municipal de Lisboa a sua constituição como uma bancada municipal própria, distinta da do PS, em cujas listas foram eleitos. É uma decisão clarificadora, de grande seriedade e transparência. Uma estranha lei eleitoral continua a impedir coligações entre partidos e movimentos. Foi necessário criar um neologismo (“acto coligatório”) para designar o que, existindo, não podia ser designado porque não podia existir. Acabadas as eleições, garantida que foi a eleição de António Costa – com o insubstituível contributo dos Cidadãos por Lisboa –  é útil marcar as distâncias. Colaborar e apoiar A. Costa não pode significar “identificação” com o PS. Roseta continua lúcida como sempre.

ADD #3

Por João Paulo Videira

Deve a ADD ter implicações na Estrutura de Carreira?

Na minha opinião, não deve. Serei dos poucos a defender este pensamento mas acredito que é defensável. Eis a argumentação.
Em primeiro lugar, esclarecer que Portugal não seria o primeiro país onde a Avaliação do Desempenho não teria consequências na carreira.
Em segundo lugar, referir que o objectivo primeiro da ADD deve ser a melhoria efectiva do desempenho pensando nos beneficiários primeiros de tal melhoria: os alunos. Efectivamente, penso que a ligação da ADD à Estrutura de Carreira pode desvirtuar o processo de avaliação na medida em que o enfoque pode ser legitimamente, mas incorrectamente, a meu ver, transferido das práticas dos docentes para os ganhos em carreira. Ou seja, mantendo-se um regime de consequências da avaliação na carreira, os docentes podem gerir a sua avaliação tendo a em conta as perspectivas de progressão e não a melhoria das suas práticas. Lembro, por exemplo, que a formação faz parte do processo de avaliação e uma coisa será fazer formação pela formação decorrente das necessidades detectadas, outra coisa será fazer formação por necessidade de acumulação de créditos.
Mais, sendo a profissão docente de cariz eminente social, sofre influências de diversos vectores, nomeadamente, do mundo político. Ora uma ADD com implicações pode ser encarada pelo poder político como uma forma de controlar e gerir quadros. Se assim for, a primeira e mais grave consequência consistirá no facto de a qualidade da Educação se tornar num objectivo facilmente ultrapassável por outros, por exemplo, de índole financeira.
Fica uma questão: porque é que, em Portugal, quase ninguém põe esta possibilidade. Simples, primeiro porque não há uma cultura de auto e co-avaliação que permita autonomizar a ADD e em segundo porque vivemos décadas com um formato e temos dificuldade em desprendermo-nos dele.
Acredito num sistema em que a ADD funciona com autonomia em relação à Estrutura de Carreira. A progressão na carreira far-se-ia por módulos de tempo e a ADD apontaria caminhos de melhoria que teriam de ser obrigatoriamente seguidos pelos avaliados. A escusa de realização da ADD ou de aceitação dos caminhos de melhoria seria alvo de procedimento disciplinar. Defendo isto num quadro em que a ADD seria levada a cabo, fundamentalmente, por professores com uma componente de avaliação externa.
Esta visão pressupõe que a avaliação não depende das questões laborais e de carreira, antes pelo contrário, um modelo orientado para a melhoria de práticas tem de contemplar autopropostas e propostas de melhoria pelos pares para detectar insuficiências de desempenho e despoletar os mecanismos para a sua superação e consequente recuperação do docente para bons níveis de desempenho. É aquilo a que chamo perspectiva formativa e integradora da ADD e, numa perspectiva formativa, as implicações da ADD na estrutura de Carreira são despiciendas. 

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Ao SUL #7

















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

REFLEXÕES ENTRE UMA VITÓRIA E OS PRÓXIMOS COMBATES (Conclusão)


Da política e do sindicato
Esquematicamente pode dizer-se que todos os partidos políticos, como de costume, podem considerar que "ganharam" sob uma perspectiva e terão de reconhecer que perderam sob um outro ponto de vista. Só os professores ganharam inequivocamente.
Esclareçamos: O Partido Socialista é o mais perdedor. Fica por explicar o que levou o PS a hipotecar uma eventual maioria absoluta por uma acéfala insistência em soluções cuja inconsistência é agora — como já o era antes — cristalina. O PS perdeu um enorme número de votos para  defender o que agora perde de forma definitiva e que durante muito tempo considerou inegociável e insubstituível. Poderá porém alegar que, com uma estratégia bem montada, conseguiu formalmente evitar uma "derrota parlamentar". O que é verdade.
O PS perdeu votos nas legislativas para todos os outros partidos da oposição parlamentar. E nesse sentido todos podem dizer que ganharam (O CDS/PP e o BE mais, o PSD e o  PCP menos) com o apoio que deram aos professores. Mas o PSD terá dificuldade em convencer os professores que nele votaram da justeza do seu acordo com o PS, acordo que de resto está a provocar mais umas divisões internas no partido. Não deixa de ser significativo que sejam os sindicatos mais pequenos os mais críticos da posição do PSD, de quem são politicamente próximos. O CDS/PP, o Bloco e o PCP poderão dizer, com toda a verdade, que,
juntamente com o PSD,  a campanha que fizeram e a apresentação de projectos à AR obrigaram o PS a capitular (pelo menos para já...). Mas obviamente perderam as votações na AR, o que há uma semana atrás parecia pouco provável.
Os professores ganharam. Porque se mobilizaram, porque resistiram com inteligência e porque souberam utilizar a seu favor os interesses imediatos dos partidos políticos. Exemplificaram bem de que modo se pode utilizar o jogo político sem ficar refém de nenhuma estratégia política. É importante que assim continuem: o plano político e o plano sindical não são coincidentes, mas há que saber usar as diferentes intersecções.
Uma nota final: Há qualquer coisa de errado quando questões estritamente sindicais (a avaliação de desempenho docente e a estrutura da carreira) se tornam o centro do debate político de um país. É que não se trata sequer de discutir o sistema educativo! É altura de por na ordem do dia o desemprego, o défice orçamental e a economia. E a educação. 

domingo, 22 de novembro de 2009

Ao SUL #6

















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa.

REFLEXÕES ENTRE UMA VITÓRIA E OS PRÓXIMOS COMBATES – PARTE II


Sobre a “avaliação de mérito”
O modelo de avaliação de desempenho agora “enterrado” previa que 5% dos docentes pudessem ter Excelente e 20% Muito Bom. Enorme optimismo: um sistema educativo em que 25% dos docentes estivessem claramente acima da média seria um sistema excepcional. Duvido que tal exista em qualquer país. Como em qualquer outra profissão, a maioria da classe dos docentes terá um desempenho normal, correspondendo aquilo que é exigido. As excepções, por excelência ou mediocridade, serão mesmo isso: excepções. 25% não é uma excepção.
Não se é muito bom ou excelente um ano ou uma parte do ano. Muito Bom ou Excelente deve ser uma distinção de uma carreira (ou parte dela) e esse mérito tem de ser reconhecido pelos pares, deve fundamentar-se em critérios de rigorosa exigência e de reconhecimento exterior. Ora nós assistimos a Muito Bons e Excelentes atribuídos a recém-chegados à profissão, atribuídos por colegas que só contactaram um ano com esse docente. Seria como um cirurgião que se candidatasse e obtivesse uma avaliação de Excelente ou Muito Bom logo no primeiro ano do seu trabalho num hospital. Possível? Talvez. Mas seria um milagre. Tivemos classificações de mérito atribuídas a “avaliadores” cuja razão foi terem atribuído uma nota aos seus colega – não interessa se bem ou mal – e cuja prática pedagógica não foi sequer avaliada por ninguém. Tivemos notas de mérito atribuídas a professores reconhecidamente normais ou mesmo abaixo da média, porque “cabiam” na quota” e as indicações dadas pelo ME teriam sido no sentido de que as escolas deviam esgotar as quotas que lhes tinham sido atribuídas.
O conhecimento que tenho do que se passou nas escolas permite-me concluir que a esmagadora maioria dos bons docentes participou activamente na contestação ao modelo, não entregou os “objectivos individuais” ou, pelo menos, recusou-se a pedir a avaliação chamada de “científico-pedagógica” que permitia obter menção acima de Bom. Com M. Lurdes Rodrigues não assistimos ao reconhecimento do mérito; mas assistimos à glorificação da mediania e da mediocridade. Uma amiga minha costuma dizer que ter um Muito bom ou Excelente neste processo deve ser, no futuro, razão de vergonha. É capaz de ter razão.
A atribuição de nota de mérito excepcional deve ser uma proposta da escola, ou, pelo menos, ser “autorizada” pela escola; deve ser devidamente justificada e publicitados esses fundamentos, deve admitir a oposição de outros, e deverá ser confirmada por uma entidade exterior à escola. Só assim ela poderá superar a total subjectividade (ou oportunismo ou “amiguismo”…). Além disso, esse reconhecimento não pode penalizar outros docentes. É por isso que é uma completa irracionalidade fazer incidir essas avaliações de mérito excepcional na graduação para concurso. Que se premeie o mérito, mas que não se criem injustiças irreparáveis.

Sobre a assistência a aulas
Uma coisa é assistir a aulas de colegas para trocar opiniões sobre os melhores procedimentos, outra, bem diferente, é assistir a aulas com o intuito de as avaliar e dessa avaliação depender (parte) do futuro do avaliado. No primeiro caso, o coordenador do grupo ou de disciplina deve ter esse hábito, a incluir na sua carga horária. E reciprocamente, cada “assistido” deve assistir às aulas do coordenador. Para o segundo objectivo, porém, é preciso ter uma formação especializada para tão difícil tarefa. O que se fez no ano lectivo passado foi uma vergonha: a pedido de um qualquer colega do seu departamento, possivelmente até de outra disciplina, alguém foi obrigado a exercer uma função para a qual não estava – nem tinha que estar – devidamente preparado. O “avaliador” sujeitou-se sempre a que o “avaliado” não lhe reconhecesse competência para o avaliar. A menos que lhe desse no mínimo Muito Bom! (Nota: é verdade que nem sempre foi assim; mas basta que tenha havido um caso destes para se perceber o absurdo que foi sustentado). Acho pois que se deverá distinguir: lentamente, ir criando o hábito em cada escola de que haja assistência às aulas: mas que para efeitos de avaliação – eventualmente indispensável para a atribuição de “mérito excepcional” – tal tarefa só deverá poder ser exercida por um corpo devidamente especializado nessa área, eventualmente inspectores. 

sábado, 21 de novembro de 2009

Ao SUL #5















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

REFLEXÕES SOBRE UMA VITÓRIA E OS PRÓXIMOS COMBATES – PARTE I

Nota prévia: Para evitar um texto demasiado extenso, incompatível com a natureza de um blogue, dividirei este tema em três partes, a publicar em dias sucessivos. 

Os professores obtiveram uma claríssima vitória: obrigaram o Partido Socialista (i.e, o seu governo) a deixar cair “leis” que considerava tão importantes que por elas sacrificou a sua maioria absoluta. Hoje nada resta (a não ser ainda as feridas por sarar) do “modelo de avaliação de desempenho” de Lurdes Rodrigues e a divisão entre “professores titulares” e “professores” tem a morte já legalmente enunciada. O mesmo acontecerá ao “estatuto do aluno”. Além disso, os sindicatos dos professores – particularmente os sindicatos da Fenprof – saem muito fortalecidos e prestigiados, deixando bem claro aos governos que ofender ou desvalorizar os docentes implica pagar um preço bem elevado. Por fim (e não é menos importante) os professores têm agora uma oportunidade de re-ganharem uma visão positiva da sua profissão e de si próprios.
Trata-se porém, até agora, de uma vitória pela negativa. Foram afastadas normas absurdas que eram fontes de enormes injustiças. Mais difícil é obter vitórias pela positiva: conseguir uma nova estrutura da carreira docente, um novo modelo de avaliação de desempenho, um novo “estatuto do aluno”, uma nova concepção do horário de trabalho (para só referir as questões mais imediatas) que os professores, as escolas e a comunidade educativa aceitem por serem instrumentos de melhoria do nosso sistema educativo. Tarefa do futuro imediato!
Para que este desafio seja levado a bom porto é útil uma análise do que se passou. Aqui ficam algumas ideias:
- Há uma falsidade sistematicamente repetida, nomeadamente pelo primeiro-ministro: a de que antes de M. Lurdes Rodrigues não havia avaliação dos professores. Havia. Centrava-se de facto na análise do seu trabalho pedagógico. Em muitas escolas (lamentavelmente não em todas) os relatórios entregues eram discutidos e “ajuizados” pelo Conselho Pedagógico. A atribuição de notas superiores a “regular” exigia muito mais rigor e cuidado do que a infestação de “muito bons” e “excelentes”, na sua maioria aleatórios e sem qualquer base, que este simplex “vomitou”. E porque alcançar um bom “ exigia então rigor e “verdade”, o governo não foi capaz sequer de construir as normas para a a atribuição de "muito bom". 

- Uma outra falsidade divulgada pelo governo anterior: a avaliação não distinguia a qualidade e o mérito. Distinguia. E se não era possível distinguir ainda mais (não quero agora discutir se isso seria vantajoso) era apenas porque os governos (PS e PSD) não construíram os normativos necessários. Certamente porque conheciam a enorme dificuldade de construir tais normativos com justiça. Como a ignorância sempre foi idiotamente atrevida, M. Lurdes e a  sua equipa rapidamente elaboraram normativos para o efeito. Com o resultado que está à vista de todos. Como os sindicatos sempre disseram, era possível trabalhar sobre o modelo anterior para o melhorar e tornar mais útil. Mas Lurdes Rodrigues e Valter Lemos não percebiam nada do que estava em jogo do ponto de vista do interesse das escolas. É pois um absurdo mistificador a ideia propalada de que à equipa de Lurdes Rodrigues se deverá atribuir o mérito de ter “fixado” para todo o sempre a princípio de que os professores têm de ser avaliados. Bem, pelo contrário: com os seus disparates, o que foi posto em causa é o princípio de que se pode construir um modelo justo de avaliação. Mais uma dificuldade a superar no futuro imediato. Apesar do que se passou nos últimos anos, entendo que os professores devem mesmo ser avaliados.

(Continua)

Nota: entenda-se sempre “professor” como englobando também os educadores e restringido ao ensino básico e secundário.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Ao SUL #4














Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

VACINAS E ESTUPIDEZ

Títulos como "Grávida Perde Bebé depois de Tomar Vacina da Gripe A" têm o mesmo valor informativo que "grávida perde o bebé depois de tomar banho". Partamos do princípio de que a esmagadora maioria das grávidas toma banho regularmente e terá sido vacinada contra a gripe A; e se é verdade que morrem em média 300 fetos por ano no terceiro trimestre da gravidez, a média de um por dia não tem nada de especial. 
A única coisa a noticiar seriamente seria que fora estabelecida uma relação causal entre a vacinação e a morte fetal — dizer que essa relação não pode ser provada nem descartada é explorar a infelicidade alheia para produzir uma não-notícia. Cujo único efeito poderia até ser aumentar os níveis de ansiedade nas grávidas a poucas semanas do parto — o que já seria grave —, mas não é bem assim.
Segundo o presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, a vacina que está disponível em Portugal não é a melhor para a saúde das crianças e das grávidas. Não sendo eu anti-vacinas (tenho bem presente o número de crianças em todo o mundo que está viva graças às campanhas de vacinação), sei bem que há vacinas e vacinas, e não tenho ilusões quanto à falta de escrúpulos e ao poder da indústria farmacêutica. E tenho uma relação conflituosa com os meus brônquios e restantes vias respiratórias desde muito antes da queda do muro de Berlim e dez reis de gente à minha responsabilidade, pelo que terei de tomar uma decisão dentro em breve. E se é verdade que a minha filha parece ser bastante saudável e a imunidade da doença é sempre preferível à da vacina, eu também não estou particularmente interessada em descobrir que, apesar dos 30 meses de mama, ela afinal tem problemas de saúde quando o diagnóstico não for propriamente construtivo. Sobretudo, acho que tenho uma responsabilidade social: se a vacinação diminui o impacto da pandemia, tenho de ter em conta a possibilidade de a minha filha contagiar alguma criança que não seja tão saudável como ela aparenta ser.
Por tudo isto, a minha decisão não será pacífica, e gostaria de contar com os media para que fosse informada e responsável. Em vez de lhes rogar pragas por me insultarem a inteligência diariamente.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Ao SUL #3















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

CONSTRUIR O FUTURO NAS NOSSAS ESCOLAS

O "enterro" daquilo que erroneamente foi chamado "modelo de avaliação dos docentes" foi decretado ontem, 18 de Novembro, pelo Ministério da Educação. O próximo "ciclo avaliativo" terá novas regras, novo modelo, nova configuração. E por isso o ME informou as escolas de que não devem por em prática nada do que estava previsto; que aguardem. Muito importante também foi a decisão de que os professores e educadores que não entregaram os "objectivos individuais" serão avaliados como os outros. Resta por resolver a questão não despicienda do efeito do"muito bom" e do "excelente" para concurso, situação que, em nome da justiça, deve ser anulada.
Estas decisões, independentemente do que o futuro nos reservar, significam uma grande vitória dos professores e dos seus sindicatos. Dos professores que pelas mais diversas formas e vezes se manifestaram por todo o país. E sobretudo dos professores — cerca de 40 mil — que resistiram e não entregaram os desconchavados "objectivos individuais". Foi sobretudo em torno deles que se manteve acesa a denúncia de um processo perverso e profundamente injusto.
Os sindicatos saem deste processo com a sua imagem e o seu prestígio muito reforçados. Mostraram inteligência táctica e estratégica, mostraram a sua ligação real aos professores e educadores, mostraram um apurado sentido de responsabilidade. É também por isso que a sua tarefa é agora ainda mais importante e mais difícil. A construção de um modelo de avaliação que seja aceitável pelos docentes exige que eles sejam envolvidos na sua construção. O projecto da FENPROF, tão desdenhado por Lurdes Rodrigues (será que o leu?), é uma excelente base de trabalho e merece ser discutido aprofundadamente pela classe docente. Mas é necessário ter sempre presente que a avaliação de desempenho é apenas uma parte do processo de revisão do Estatuto da Carreira Docente e que essa é a "discussão" mais dura. Os professores têm que se envolver na construção destas decisões através dos seus sindicatos representativos. Há razões para acreditar que, com determinação e lucidez, vai ser possível dar novo alento à profissão docente e à escola pública. Vamos a isso.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

TAMBÉM POSSO PEDIR UMA SUSPENSÃO ASSIM?

"Vara continua a receber 30 mil por mês do BCP" é título de 1.ª página do Público de hoje. Aí pode ler-se: “O gestor suspendeu as suas funções no banco, mas continua a receber um salário de 30 mil euros brutos mensais”. Não há limites para a pouca vergonha? 

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Ao SUL #2
















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

VITAL MOREIRA: DE COMO O RIGOR DO FORMALISMO JURÍDICO OBSCURECE (INTENCIONALMENTE) A ANÁLISE POLÍTICA

Com o curioso título de “Incontinência política”, Vital Moreira assina no jornal Público de 17 de Novembro uma crónica onde desenvolve, com o rigor lógico que se lhe reconhece, a tese de que, sendo as gravações das conversas entre o primeiro ministro e A. Vara ilegais, uma vez que não foram devidamente autorizadas e validadas pelo Supremo Tribunal de Justiça, devem ser destruídas. A que acrescenta a tese de que as gravações “nada têm a ver com a investigação que motivou a escuta” e de “serem penalmente irrelevantes”. Não tenho qualquer competência jurídica para combater a análise formal de Vital Moreira. Como leigo em questões jurídicas, resta-me recorrer ao bom senso do cidadão comum. E então perguntarei: poderá ser considerado irresponsável o juiz de Aveiro, para quem, pelos vistos, os dados recolhidos pelos investigadores constituem base suficiente para pelo menos equacionar uma eventual responsabilidade penal do primeiro ministro? E não será precisamente o facto de ele não estar tão próximo do poder político que lhe dá uma maior liberdade de juízo? Que permite a V.M. considerar irrelevantes as gravações? O meio de comunicação que divulgou a notícia não é propriamente um “pasquim” de jornalistas desqualificados. E é peremptório –1ª página! – a informar que as gravações têm por tema as negociações da compra da TVI – questão que o primeiro ministro tinha dito na A.R.  ignorar. Será esta uma questão sem interesse político? 
V.M terá certamente razão ao entender que Sócrates não tem obrigação, enquanto cidadão, de tornar público o teor das suas conversas, uma vez que as escutas são consideradas ilegais. Mas o primeiro ministro Sócrates não deveria ser o primeiro a cortar o mal (político) pela raiz, mostrando que nada tem a esconder? Porque a sensação que fica é que Sócrates se esconde atrás da razão jurídica que eventualmente lhe assista para fugir à apresentação de algo inconveniente que tenha ficado nessas gravações.
Ao esconder-se atrás de formalismos jurídicos, Sócrates afunda ainda mais a sua credibilidade. Que já anda muito por baixo.

VAMOS REFERENDAR O CASAMENTO?

Depois admiram-se (ou talvez não). Mascaram-se de grandes defensores da democracia participativa, mas fica-lhes o rabo de fora: estão-se marimbando para as consultas populares em geral, e usam-nas para tentar subverter um princípio básico da democracia representativa — o da legitimidade parlamentar para legislar em torno de temas constantes dos programas de quem foi eleito. E usam-no porque apostam no poder persuasivo da Igreja Católica e da sua máquina social e num conservadorismo ultramontano que acreditam estar na essência dos portugueses. Parece que não aprenderam nada em Fevereiro de 2007. E não é porque o aborto seja assunto que lhes passe ao lado — é só olhar para eles para ver que é a mesma pandilha dos movimentos anti-escolha.
Estas manobras cínicas dos anti-tudo-o-que-não-seja-o-que-eles-praticam até podem servir-lhes de pouco (ou não), mas têm ferido de morte o uso legítimo do referendo em Portugal. O que me chateia um bocadinho, até porque gostava francamente de ter sido consultada acerca de um assunto que diz directamente respeito a todos os que cá vivem e para o qual o governo não tinha qualquer legitimidade para decidir: a ratificação do Tratado de Lisboa.
Que fique bem claro: eu gosto mais de referendos do que de casamentos — faz-me confusão que se contratualizem os afectos. Tenho bom remédio, não é? Não me caso, e acabou-se a história. Mas olhem que há casamentos que me fazem mais espécie que outros: os acordados por outras partes que não as envolvidas, os que são celebrados em países onde não há divórcio, aqueles em que um dos cônjuges muda de apelido ou os que se sentem ameaçados por a Helena e a Teresa também se poderem casar, por exemplo. Tudo coisas defensáveis para muito boa gente, mas para mim não. Vou olhar para os gays casados com a mesma perplexidade com que olho para os hetero que dão o nó. Mas ficarei feliz por a minha perplexidade não lhes interferir com a felicidade, como não interfere com a de ninguém. Porque o que está em causa não é o casamento (casamentos já há muitos, passa a haver mais um), mas sim o que o Estado tem a dizer sobre a homossexualidade — ou a considera uma forma legítima de relação entre duas pessoas, e portanto implementa legislação que expresse (ess)a igualdade, ou assume que o que é legítimo é que se restrinja o acesso a um acto regulado pela lei com base na orientação sexual.
Imaginemos que seria legítimo referendar a forma que cada um escolhe para viver os seus afectos. Porque não referendarmos, nesse caso, os casamentos em geral, incluindo, a la California, os já celebrados? É bem possível que exista por aí uma maioria silenciosa, composta por gente com objecções ideológicas profundas ao casamento ou com motivações que vão desde a inveja à frustração, que não veja com bons olhos que outros se casem. Seria legítimo sequer que fossem(^os) chamados a pronunciar-se/nos sobre o assunto? Pois não seria nem mais nem menos mesquinho do que referendar o casamento entre pessoas do mesmo sexo — em ambos os casos tratar-se-ia de um referendo acerca de direitos básicos, que afectam apenas aqueles que os querem exercer.
Em suma: quem é contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo tem bom remédio: não se casa com uma pessoa do mesmo sexo. Ou casa, se um dia achar que a felicidade depende disso. Escusam é de me convidar. Desejo-vos as maiores felicidades do mundo, mas não acho mesmo piada à coisa.

ADD #2

Por João Paulo Videira

A Avaliação do Desempenho Docente deve ser colectiva ou Individual?

Numa reunião em que participei, no passado mês de Julho, no ME, sobre o modelo de ADD proposto pela FENPROF, o então Secretário de Estado e Adjunto da Educação, Dr. Jorge Pedreira, fez a seguinte afirmação: “O ME saúda o facto de a FENPROF ter apresentado uma proposta mas não podemos aceitá-la porque a FENPROF resvala continuamente para o colectivo e a profissão docente é estritamente individual.”
Ora, parece-me que a opção por um determinado modelo para avaliar os professores portugueses passa, efectivamente, pela forma como encaramos a profissão. Ou assumimos que o nosso trabalho é estritamente individual e então fará sentido um modelo que premeie e “castigue” individualmente, ou descobrimos o óbvio que é o facto de o nosso trabalho ser, sobretudo, um trabalho de equipa e orientamos a avaliação para a análise dos resultados das equipas. Como chegar, neste caso, ao momento em que se atribui uma menção individual que tem, depois, reflexos na carreira? Assumimos aqui tais reflexos o que, como sabem, também não é pacífico ou, pelo menos, é discutível.
Parece-me que temos de assumir que a Escola é uma comunidade que presta um determinado serviço a uma outra comunidade mais lata a abrangente. E parece-me, também, que é a qualidade do serviço prestado que tem de ser continuamente avaliada e melhorada. Nessa medida a avaliação tem de ser a do serviço prestado à comunidade pela escola e, neste âmbito, das diversas equipas, órgãos, grupos dentro da mesma que em última análise têm de ser co-responsáveis com cada docente na avaliação do seu contributo para o funcionamento das equipas.
Se fizermos um raciocínio atento acerca desta matéria, haveremos de notar que falar de prestações individuais e avaliações individuais é até um paradoxo porque o que faz a diferença no processo de crescimento e aprendizagem dos jovens são as equipas e não as individualidades.
O Dr. Jorge Pedreira, e o Ministério da Educação através dele, estavam enganados na altura como, de resto, é hoje flagrante. Esperemos que a equipa de Isabel alçada não caia no mesmo erro…

domingo, 15 de novembro de 2009

AO SUL #1















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

ISALTINO: NÃO BRINQUEMOS COM O FOGO!

(a propósito da entrevista de IM à PUBLICA)

Quem "faz obra" (e no caso de Isaltino Morais, em Oeiras, parece que fez mesmo  boa obra) pode marimbar-se para a justiça, desde que a população o apoie. Às vezes, nem é preciso "ter obra": basta que se convençam uns tantos senhores da terra que se  fez ou se vai fazer (é a norma dos ditadores. Já nos esquecemos da propaganda dos grandes serviços de Salazar?). Quase sempre os grandes beneméritos que "oferecem" obras às suas cidades oferecem uma pequena parte do que roubaram não pagando impostos, burlando cidadãos ou sobreexplorando quem para eles trabalha. Sempre com a veneração e aplauso da população. Quando ouço falar de beneméritos fico logo mal disposto… A "veneração" para com Isaltino prenuncia um enorme desastre sociopolítico. Estamos a brincar com o fogo.

SÓCRATES E A "FACE OCULTA": A PIOR DAS DECISÕES

Arquivar as escutas que envolvem o primeiro-ministro sem as tornar públicas significará para boa parte dos portugueses a confirmação do ditado popular "quem se lixa é o mexilhão". É certo que nem Vara nem Manuel Godinho  são bons exemplos de "mexilhão". São demasiado graúdos. Mas são a parte mais fraca no terreno político comparados com o primeiro-ministro. Com lógica (o que não quer dizer necessariamente com justiça) dir-se-á pelos cafés, ruas e autocarros que se Sócrates não fosse primeiro-ministro seria tão arguido como qualquer dos outros. E assim caminhamos alegremente para a descrença na política e nos políticos.

sábado, 14 de novembro de 2009

AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES QUE NÃO ENTREGARAM OS OBJECTIVOS


1. Esses docentes, não tendo entregue "objectivos individuais",
entregaram contudo e seu relatório (ou ficha) de autoavaliação, (foi
essa a posição defendida pelos sindicatos) que é o documento essencial
para a sua avaliação por parte dos responsáveis pedagógicos da escola.
(Da parte administrativa cuida o director). Ou seja, há elementos — os
fundamentais — para que a avaliação se faça.

2. A entrega dos objectivos individuais só pode ser entendida como
um direito e não como um dever, uma vez que na sua ausência eles
poderiam sempre ser impostos pela direcção e coordenador de
departamento. Mas convém dizer que a recusa de entrega desses
objectivos individuais teve como razões, não só denunciar um modelo de
avaliação cuja aplicação conduziria a enormes injustiças, mas razões
éticas e deontológicas profundas. Em inúmeras escolas a não existência
de projecto educativo minimamente coerente, a não definição de
objectivos gerais a atingir pela escola, por exemplo, tornavam
impossível qualquer definição coerente de objectivos individuais. Para
não falar já da agressão ética que foi a proposta de algumas escolas
de que os professores se comprometessem, à partida, a melhorar em 5,6,
ou 7% (conheço casos destes) as notas do ano anterior.

3. Não me interessa saber se a não avaliação tem ou não tem
consequências. É absolutamente injusto que quem assumiu coerentemente
a luta contra um absurdo (hoje ninguém se atreve a defender o modelo
de avaliação, quer o "total" quer o "simplex1") não seja avaliado como
os outros. É aliás o que muitas escolas já estão a fazer.

4. Esta será uma das pedras de toque nas negociações que se vão
iniciar. Espero francamente que não seja a primeira pedra inamovível
num caminho que queremos percorrer.

HÁ CAMINHOS ABERTOS. ERRADO SERIA NÃO TENTAR PERCORRÊ-LOS

A entrevista de Isabel Alçada tem suscitado diversas apreciações. A minha é apenas mais uma para o debate. 
Eis então como eu “vi” a entrevista da sr.ª ministra:

1. Foi evidente a preocupação de se demarcar de Maria de Lurdes Rodrigues, embora, cortesmente, evitasse qualquer referência à sua antecessora. Mas das “grandes reformas de MLR” aproveitou a melhoria das instalações, a introdução do ensino profissional nas escolas públicas e pouco mais…
2. Sublinhou a diferença entre si e a antecessora através da expressão: “eu vou fazer porque eu sei”, “conheço as escolas e os professores”. Deixando subentender que MLR “não sabia”, isto é, não conhecia minimamente as escolas do ensino não superior. O que, convenhamos, é mesmo verdade.
3. Tornou claro que este modelo de avaliação de desempenho chegou ao fim porque era impraticável e inútil, dando assim razão aos que se lhe opuseram com firmeza. Concedeu facilmente que foi legítimo que os avaliados pusessem em causa as competência dos avaliadores, titulares ou não.
4. Deixou antever que é possível acabar com a divisão entre titulares e não titulares, embora desse também a entender que haveria outras formas de limitação ou de condicionamento da progressão na carreira.
5. Foi ao encontro das posições dos professores quando afirmou ser necessário modificar as regras dos horários, o estatuto dos alunos e repensar os currículos.
6. “Namorou” os sindicatos ao afirmar que eles seriam sempre os primeiros a conhecer as propostas e ao afirmar querer chegar a entendimento com eles. Piscou o olho à Fenprof ao divulgar ter na sua equipa de trabalho o professor Natércio Afonso, que já por várias vezes trabalhou com a Fenprof e os seus sindicatos.
7. Não endeusou os pais – o que é bem diferente da ministra anterior.
8. Reconheceu que os professores colocam os alunos em primeiro lugar, mesmo quando estão revoltados com a tutela e com problemas pessoais e profissionais.

Em síntese: o que Isabel Alçada disse foi: eu sei o que quero e tenho alguma margem de negociação. Os sindicatos têm que decidir se aproveitam ou não esta “possibilidade”.
Acho que os professores exigem que tentemos aproveitar esta possibilidade. E que devem, através dos seus sindicatos representativos, ir aumentando a pressão para que se chegue a soluções que, por dignificarem a profissão e defenderem a escola pública, possam ser aceites pela classe docente.. Há caminhos abertos; errado seria não tentar percorrê-los.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

SEGURADORAS: SÃO NECESSÁRIAS, MAS DEVEM TER "BOAS" PRÁTICAS

Notas prévias:
1. Um blogue não deve tratar de casos pessoais. Se aqui refiro o meu "caso” é porque dele, creio,  se podem tirar ensinamentos gerais. 
2. Sei que quem ler este texto acabará exclamando “bem feita, quem o manda ser parvo!"

Vamos então “à coisa”: Há cerca de 2 anos tive que solicitar, com carácter de “necessidade urgente”, um empréstimo ao banco através de uma hipoteca sobre o andar em que habito. O banco foi correcto, mas – faz parte das regras – houve que constituir um seguro numa seguradora que o próprio banco impôs. Para esse seguro, houve que preencher uma ficha clínica. Disse-lhes que nesse momento estava a ser medicado porque o valor da diabetes estava elevado. O seguro foi agravado – e achei justo: afinal se alguém está doente oferece “mais perigo de vida”. Acontece que passado pouco tempo o valor da diabetes passou a normal, como o comprovam as várias análises que enviei à seguradora, e por isso solicitei a anulação do agravamento. A resposta foi negativa e nem sequer foi justificada. A isto chamo – porque sou bem educado – desonestidade traduzida em roubo. Claro que todos se me riem na cara: quem te mandou dizer a verdade? Lamento, mas já estou demasiado velho para mudar: as leis justas são para cumprir. É um princípio mais importante do que querer enganar as seguradoras, mesmo que estas funcionem como ladroagem… (Nota: a seguradora em causa é a Zurich).
Mas a prática das seguradoras tem outras anormalidades. Com cobertura legal, ao que parece. Apesar do valor da dívida ao banco baixar todos os meses (á medida que se vão pagando as prestações) o valor do seguro mantém-se sempre o mesmo. O que não faz sentido. O valor do seguro deveria acompanhar a diminuição da dívida. Parece que para o futuro vai ser assim. E porque não para todos os que já tiveram de se “segurar”, até porque na maioria dos casos nem sequer nos foi dada a possibilidade de escolher a seguradora?

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

DEFINIR OBJECTIVOS CLAROS, NÃO SACRALIZAR PALAVRAS

São objectivos claros e imediatos dos professores (entre outros):

- construir um novo modelo de avaliação que seja prático, útil, justo e adequado para as escolas.
- rever o ECD pondo termo à divisão da carreira, redefinindo e melhorando as regras de composição do seu horário de trabalho.

Nestes pressupostos, que se conclua o 1.º ciclo da avaliação de desempenho, salvaguardando :

- que quem não entregou objectivos individuais seja avaliado — prática que um número muito significativo de escolas está já a concretizar. Foi a  resistência desses professores e educadores que tornou patente o óbvio: o (ainda) actual modelo de avaliação de desempenho é não só um completo disparate, como uma total inutilidade.
- que se corrijam os efeitos imorais da atribuição de facto aleatória (e por vezes assente em regras caricatas) dos Muito Bom e Excelente, sobretudo para efeitos de concursos. É uma questão de seriedade. A maneira mais prática de corrigir estes abcessos seria ignorar essas classificações. Poderá haver outras soluções.

Relativamente à revisão do ECD, o fim da divisão da carreira em titulares e simples professores é uma questão de saúde escolar.
Manuel Carvalho, director adjunto do Público, é um jornalista respeitado e digno. A sua crónica do dia 11 de Novembro, sob o título Nem Tudo É Mau na Avaliação, porém, não foi certamente um dos seus momentos mais inspirados. Claramente lhe digo:

1. Os sindicatos (no meu caso falo pela Fenprof) não saíram eufóricos nem com ar triunfante. Saíram apenas com a convicção de que há da parte do ME vontade séria de negociar saídas dignas para as questões em aberto. Da nossa parte, faremos tudo para que esta convicção se confirme.
2. Todos sabemos , e os sindicatos certamente melhor que ninguém, que as situações de excelência são a "excepção" e não a norma em todas as profissões. Sabemos que nem todos os docentes são excelentes. Serão até muito poucos, como é normal. O que exigimos é que sejam estabelecidos critérios claros, objectivos e justos para essa distinção. O que hoje não há.
3. Em vez de discutir se tudo é mau neste ainda actual modelo de avaliação, prefiro dizer-lhe que ele não acrescentou nada ao modelo anterior. Pelo contrário, piorou, ao fazer incidir a avaliação não nas questões pedagógicas mas em questões administrativas ou em simulacros.
 4. O ME de Maria de Lurdes Rodrigues não tratou por igual os excelentes e os medíocres porque, de um modo geral, favoreceu os medíocres.

Haverá algum mal em que estejamos confiantes de que alguma coisa vai melhorar?

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #15















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

A PROPÓSITO DO PROGRAMA DO GOVERNO

por Luisa Mesquita

Luisa Mesquita dispensa apresentações. Das mais lúcidas deputadas e das mais competentes desde sempre na área da Educação, é colaboradora no sítio do SPGL na Internet.
Com a devida vénia, decidi transcrever para este blogue (que se pretende um espaço de reflexão livre e crítica) parte da sua crónica “Da Face Oculta à Educação” cujo texto integral pode ser lido em www.spgl.pt.

"Uma última reflexão sobre os objectivos de política educativa propostos pelo Governo. 
Vazios de novidade. 
Substantivamente medíocres. 
O avulso discursivo é de tal forma deprimente que é impermeável a qualquer avaliação por mais simplista que seja o exercício. 
Também por isso o Parlamento terá um amplo espaço de intervenção. 
É urgente alterar/inovar o depauperado sistema educativo nacional. 
É urgente qualificar a substância. 
A sociedade actual já o evidenciou, já o solicitou. 
A escola de hoje foi pensada para outros tempos. 
A escola de hoje foi programada para uma sociedade excessivamente regulamentada e de fronteiras bem definidas. 
Mas os jovens de hoje não são os de outrora. 
A sociedade actual já não tolera os modelos educativos que não são reconhecidos como úteis por nenhum dos seus utilizadores (pais, alunos, docentes). 
A escola da mera transmissão dos saberes tem que dar lugar à escola que ajude o aluno a construir o conhecimento.
Exercer a docência hoje é sobretudo fazer aprender a capacidade de aprender, motivando a descobera de si  e por si mesmo. "

ALGUÉM QUE NOS EXPLIQUE!

1. Não há mal nenhum que Sócrates telefone aos seus amigos ou até aos seus inimigos. Telefonou a Armando Vara? E depois?
2. Mas um ou mais telefonemas de Sócrates parecem ser “inconvenientes” porque se assim não fosse não se entenderia que altas magistraturas como a Procuradoria da República e o Supremo Tribunal de Justiça andassem a discutir na praça pública quem é que deve tomar uma decisão sobre a legalidade e o fim a dar à gravação desses telefonemas.
3. Se a questão é assim tão “batata quente” é de admitir que haja nesses telefonemas matérias de gravidade. A menos que nada disto faça sentido.
4. Seja como for, o ambiente de suspeição está criado: se nada de relevante houver, chamusca-se o regime que vai criando “tricas” sem outro sentido que não seja confundir; se algo de relevante houver, questionar-se-á por que razões se adiou tanto a divulgação e tanto se hesitou.
5. Li na comunicação social que o julgamento de António Preto foi adiado sine die. Qual o significado deste adiamento? Encerramento? Prescrição?
6. Cheira-me demasiado a pântano. Já não se acredita na justiça nem na política. Que tempos virão aí? 

terça-feira, 10 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #14















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE (ADD)

O CIRCO LUSITANO inicia hoje um dossier sobre este tema. Todas as 3ªs feiras o João Paulo Videira, dirigente do SPGL e "autor" do essencial do projecto de avaliação da FENPROF, publicará aqui um texto de reflexão sobre a matéria. Quem tiver unhas para os debater, é só enviar comentários. Simultaneamente, o CIRCO LUSITANO acompanhará o desenrolar do processo reivindicativo. Pretende-se pios reflectir e agir. Como convém a sindicalistas.

ADD#1: A Questão Iniciática.
Por João Paulo Videira

Preâmbulo.
O António Avelãs pediu-me que escrevesse com alguma regularidade, para o Circo Lusitano, sobre avaliação de desempenho. Fê-lo sem impor regras dando-me, por isso, liberdade total para, no plano das ideias, ir publicando neste espaço algumas das ideias que tenho sobre a matéria. Acordámos os dois que os textos não seriam muito extensos. Para não provocar leituras mais exigentes e cansativas e, sobretudo, porque tais textos se destinariam a provocar a reflexão e o debate, mais do que a tratar exaustivamente o assunto.
Aceitei o repto e inicio hoje a tarefa de ir publicando neste espaço algumas ideias sobre aquela que tem sido uma matéria central no plano da Educação em Portugal.

ADD: A Questão Iniciática. 
A dita questão é simples. Provocadora. E não me parece que a resposta que lhe demos seja tão importante como a forma que escolheremos para a estruturar. Que é como quem diz, o problema não é tanto o “quê”, é mais o “como”. Quando decidi dedicar-me ao estudo da ADD, a primeira questão anunciou-se-me na mente, singela e inquietante: Deve, ou não, haver avaliação desempenho docente? É preciso avaliar os professores? 
A resposta parece-me pacífica: sim, deve haver. Sim, é preciso.
O que pode já não ser tão pacífico é o pressuposto reflexivo que a pergunta encerra e é por isso que considero importantíssimo que nos coloquemos recorrentemente esta questão. Senão vejamos: hoje em dia discute-se sempre em torno de um modelo de avaliação, qual o melhor modelo, qual o modelo que melhor avaliaria os professores, que mecanismos, que instrumentos de registo, que periodicidade… e saltamos a questão iniciática que é “deve ou não haver avaliação” e, ao saltá-la, precipitamo-nos na selecção e desenho de modelos sem termos sido forçados à reflexão que a resposta àquela pergunta implica: porquê avaliar professores? Donde decorre depois uma outra: como avaliar professores? 
A ADD pode ter um intuito político, económico-financeiro, conjuntural ou educacional. Numa perspectiva política poder-se-á dizer que os professores têm de ser avaliados porque todos os outros o são, todos os outros têm de prestar provas da qualidade do seu trabalho. Importa aqui esclarecer que os professores sempre foram avaliados, e importa esclarecer também que não há maior prova da qualidade do trabalho dos professores do que a construção da Escola Pública Democrática em pouco mais de três décadas. Só com muito esforço, sacrifício, empenho, dedicação, investigação e trabalho aturado foi possível passar de uma escola retrógrada, mal equipada e elitista, para uma escola moderna, pedagogicamente em progresso e habilitada a prestar um serviço de massas de qualidade. Numa perspectiva financeira dir-se-á que a ADD vem regular e justificar o investimento feito na Escola Pública. Importa aqui dizer que a Escola é mais, muito mais, do que o seu equipamento. Além de que o investimento na Escola não pode ser considerado um gasto mas, precisamente, um investimento. E o investimento central tem de ser feito no factor humano: alunos, professores, funcionários, encarregados de educação… A perspectiva conjuntural, nomeadamente no âmbito geo-cultural europeu, permite leituras diversas. Ou seja, há países com e sem ADD, há modelos diversos a ser implementados com diferentes níveis de sucesso. Ou seja, resta-nos o bom senso de estudarmos criteriosamente a nossa realidade e pensarmos nela e não noutras, quando desenhamos um modelo de ADD para o ensino público português. Numa perspectiva educacional, aquela que, penso, deveria ser privilegiada, a ADD deveria constituir-se enquanto instrumento de promoção da melhoria das práticas docentes e, nessa medida, o argumentário político, económico-financeiro e conjuntural perde importância.
Ora, se o pressuposto da implementação de um modelo de ADD for de índole educacional, é então possível por de parte uma série de excrescências, ditas avaliativas, que não só não avaliam, como ainda constituem obstáculo a uma avaliação eficaz e profícua. E, desse modo, ficam abertas as portas para opções que melhor servirão aquilo que todos defendemos: um ensino público de qualidade superior que promova uma sociedade sã e justa.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #13















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

UMA DISSIDENTE NO KINDERGARTEN

Em 1979 eu tinha 5 anos e nenhum poder decisório no que ao meu destino dizia respeito. É assim que me encontram, pela mão dos meus militantes progenitores, em Berlim, do outro lado do muro. A mim ninguém me pediu memórias, mas como pelos vistos o socialismo era sobretudo um andaime montado a pensar em mim/nós (fardo pesado para quem já trazia às costas o excesso de esperança de ser filha de uma revolução), hoje vou fingir que tenho alguma coisa a acrescentar ao que o meu pai já disse.
De facto, posso falar-vos de parques infantis de madeira, de ir para a escola de trenó, ou de cozer ovos em casca de cebola na Páscoa, que alguém depois escondia no jardim. Ou do gummibaerchen, um só, que nos davam quando nos faziam maldades nos postos de saúde — até hoje nenhuma goma conseguiu igualar o sabor daqueles ursinhos solitários. No Natal os meus pais ofereceram-nos um arco e flechas de madeira, lindíssimo, que fez de mim a filha de acolhimento do socialismo mais feliz do mundo, mas lhes valeu uns olhares desagradáveis, porque não era suposto darem-nos… armas.
A memória mais vívida que tenho é a daquele fatídico dia em que os desgraçados nos deixaram, a mim e ao meu irmão de 3 anos, a apodrecer no kindergarten. Apesar da nossa tenra idade, não era assim tão raro deixarem-nos ir sozinhos para casa (era só praticamente atravessar a rua), desde que devidamente autorizados por escrito pelos encarregados de educação, e eu tentei explicar à frau-não-sei-quantos (com bastante estridência e eloquência, a julgar pela replicazinha que agora tenho em casa) que o caminho era o mesmo, e que portanto, se queria chegar ao supermercado a horas, era só deixar-nos ir discretamente. Lembro-me de a ouvir repetir, quase em êxtase, que não havia autorização para aquele dia. Quando a coisa chegou ao ponto de estarmos prestes a ir para casa com ela, eu atravessei a rua a correr e refugiei-me em casa de algum vizinho, o que na altura não era estranho, porque estávamos sempre enfiados nas casas uns dos outros. O banana do meu irmão ficou lá, obedientérrimo e abandonado. E foi isso que todos me apontaram nos dias seguintes: fugir da escola é como o outro, mas deixar um irmão para trás é que não! O único castigo que tive foi o ostracismo temporário dedicado aos individualistas, mas a desgraçada da educadora foi suspensa. Quando regressou brindou-me com um sermão cheio de palavras carregadas de futuro, como solidariedade, responsabilidade, fraternidade e supermercado, mas eu disse-lhe, no meu alemão perfeito de quem aprende uma segunda língua aos 5 anos, que não estava a perceber patavina, e que se calhar era melhor falar em português…
Durante anos achei que este episódio tinha definido para sempre a minha relação com o socialismo autoritário, mas hoje tenho sentimentos muito mais forte perante a memória gélida de uns duches frios que o socialismo prescreveu contra as minhas bronquites crónicas. Que cegueira ideológica leva um par de seres pensantes a condenar uma filha enferma a tamanho sofrimento?!
A verdade é que me lembro de muito pouco. E o pouco que lembro tem o dedinho claro do que os meus pais me foram dizendo ao longo dos anos. Para nós a RDA não passou a existir quando o muro caiu, nem se reduz ao muro ou à sua queda. Se calhar foi por isso que a queda do muro, quando eu tinha 15 anos e era militante da JCP, me provocou sentimentos mistos mas fáceis de conciliar. Há 20 anos e ainda hoje. Por um lado, foi natural e benvinda, porque mais valia que se acabasse de vez com os equívocos e promiscuidades entre igualdade e Stasi, entre o culto da solidariedade e o medo permanente. Por outro lado, foi um choque ver tanta gente a correr para trocar a saúde e a educação gratuitas por uma televisão a cores. Embora eu soubesse que se tivesse ficado na RDA teria feito o mesmo. Afinal, deitar o muro abaixo seria a consequência lógica e natural de tudo o que a RDA tinha de bom para ensinar às suas crianças. Digo eu, que se calhar aprendi um bocadinho da lição.
Aos 5 anos, não havia muro. Mas havia a Brigitte, a minha boneca preta, tão única quando voltei a Lisboa em 1980 como os ursinhos dos hospitais de Berlim. Vi uma de relance no Adeus Lenine e passei o resto do filme a chorar. Para mim, 1979 foi, afinal de contas, um ano de luxo. A alternativa à nostalgia mentirosa ou à visão não menos falsa de uma RDA que mais não foi que pura treva e repressão é saber que o amadurecimento desse luxo é um sonho que ainda está por construir. Mas sem muros nem banhos gelados.


domingo, 8 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #12















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

REFLEXÕES SOLTAS SOBRE UMA VITÓRIA AINDA NÃO DEFINITIVA DE BARAK OBAMA

As televisões, os rádios, os jornais anunciam que, por 5 votos (220 contra 215), o Congresso norte-americano aprovou uma nova lei da saúde para a sua população. Ainda falta a aprovação pelo Senado. O Presidente reclama — com justiça — uma importante vitória. As notícias da comunicação social sublinham que 36 milhões de americanos terão pela primeira vez acesso aos cuidados elementares de saúde. É precisamente essa nota que me deixa perplexo: no país que explora o espaço como nenhum outro país, que tem máquinas de guerra que outros nem imaginam, que tem os melhores centros de investigação, prémios Nobel de medicina e hospitais de vanguarda, neste mesmo país, boa parte da população não tem sequer direito aos mais elementares cuidados de saúde, e muitos outros têm de limitar-se aos cuidados de saúde que o seu seguro cubra. Claro que há uns tantos que têm seguros e dinheiro para tratamentos de luxo.
Mais difícil  de entender ainda é que a aprovação de um sistema de saúde que, dizem os entendidos, comparado com o o nosso SNS faz com que o nosso pareça francamente bom, seja tão complicada, cause dano à imagem do Presidente e suscite tanta oposição. Claro que a explicação reside  no poder político e económico das seguradoras.
Dizem-me que algo de paralelo se passa na educação: as melhores universidades do mundo coexistem com um sistema que forma analfabetos e onde a iliteracia é norma. Se este é o elogiado american way of life, eu prefiro ser soviético.
(É verdade que os soviéticos conseguiram algo de parecido: foram à Lua, exploraram os caminhos para Marte, tinham armas fabulosas, mas faltavam torradeiras, bananas e automóveis normais… Mas nisso da saúde e da educação estavam, consta,  bem melhor que os yankees. Pelo menos a RDA estava — que eu vi!)
Dirão os americanomaníacos que me estou a deixar levar pelo antiamericanismo político que marcou a esquerda da minha geração. Talvez. Mas ninguém me convence que é justa e digna de louvores uma sociedade que, tendo tanto poder e tanta riqueza, discute tão arduamente se boa parte dos seus cidadãos deve ter direitos tão elementares como o direito à saúde e à educação. E que sobre tal decisão se divide quase ao meio. Se "o homem é a medida de todas as coisas", esta sociedade americana é desumana.

UM ESTALINISTA NA RDA

O PCP convidou-me em 1979 para ir trabalhar para a RDA. Iria também a Maria Ermelinda e os nossos filhos. Acabara de fazer o estágio pedagógico e ir viver num país socialista era uma aposta interessante. Dados necessários para compreender a situação: estamos em 1979, ainda com a revolução na ponta das nossas esperanças, o socialismo de leste parece estar em boa forma, acredito piedosamente que o comunismo é o futuro e não sei uma palavra de alemão. Era o que hoje, em bom rigor, se chamaria um estalinista chapado.
Fomos muito bem recebidos, instalados primeiro num magnífico apartamento na Fisherinsel (acho que era assim que se chamava), e um mês depois num apartamento mais modesto — mas muito confortável — num bairro novo, na Ho Chi Minh Strasse. Apartamentos muito melhores do que eu alguma vez tivera em Portugal. A minha paixão de que "o socialismo é que era" acentuou-se com a possibilidade de por os putos no kindergarten — eu nunca tinha andado num jardim infantil. E, tanto quanto me recordo, ainda hoje considero que o kindergarten era excepcionalmente bom. Chateavam-nos se os putos não iam bem agasalhados e, se faltavam, lá vinham eles saber o que passava. Um dia houve em que por descoordenação entre nós — os pais — nos atrasámos a ir buscá-los: levei um enorme raspanete, e o que valeu é que era em alemão e eu não percebi quase nada. Se outras coisas não houvesse, o socialismo era o kindergarten e o extremo cuidado com que lá se tratavam as crianças. Mas era também a possibilidade de ir à policlínica do bairro sempre que algum de nós se constipava — e o cuidado extremo com que os médicos nos tratavam. Sobretudo à Mariana, que andava sempre constipada e a quem eles aplicavam as kurzvwelle (não sei se era tratamento eficaz, mas se era no socialismo era bom com certeza). Lembra-me da figura um pouco assustada da "camarada funcionária" quando, na apotheke, perguntei no meu estranho alemão quanto tinha que pagar pelos medicamentos receitados. Nada, está claro! E o socialismo ia de vento em popa quando via as turmas dos putos invadirem a piscina do bairro, onde eu tentava dar uns mergulhos de manhã quando não tinha aulas. Nunca tinha visto nada de parecido nas escolas primárias do meu país. O socialismo é que era!
Imaginem um "portuga" a quem para ensinar a sua língua a adultos alemães, cujo destino eram as colónias portuguesas, é dado um completíssimo laboratório em que se podiam gravar as aulas, se podia ouvir individualmente o que cada um dizia e corrigi-lo. Alunos que evidentemente nunca faltavam e estudavam sempre impecavelmente as lições. O socialismo é que era, carago! E a prova de que estávamos à beira do paraíso era que, quando recebia o ordenado — ganhava bem e parte do vencimento era pago em marcos ocidentais, um privilégio — já vinha descontada a renda da casa, a luz, a água, o aquecimento, que, no seu conjunto, não ultrapassavam 10% do vencimento (era mais ou menos isso). E para tratar de qualquer problema no apartamento ou no prédio, chamava-se o Hausmeister e ele lá tratava do assunto.
Claro que havia coisas que desde logo me pareceram pequenas lacunas no paraíso: havia nos Strassenbahn (eléctricos, uns modernos, outros do tempo da guerra) umas maquinetas estranhas de onde se tirava um papel que era o "bilhete" e onde se deviam pôr uns trocos prefixados. Eu punha — era para alimentar o socialismo — mas a maioria dos "socialistas alemães" entravam, tiravam o papelucho e… não deitavam as moedinhas! Havia socialistas com falta de consciência de classe — o socialismo ainda não era perfeito. O U-Bahn (espécie de metro) era de fugir. E eu, catequizado na teoria de que o futebol era a alienação das massas, não percebia porque é que todos os dias a Fernsehen transmitia um jogo dessa coisa. Para não falar das inenarráveis borracheiras dos camaradas alemães no fim de semana.
Pior um pouco foi quando me apercebi que o Bock, que era o melhor professor de nós todos, não podia ser director lá da escola nem ter responsabilidades porque era crítico do sistema. E também não gostei nada quando tive de ir "à força" agitar uma bandeirinha à passagem do Brejnev. E quando me consegui relacionar com alguns alemães, pude perceber que a maioria deles, mesmo em Berlim, não viviam como eu vivia. Havia bairros e casas degradados, os meus marcos ocidentais eram um luxo, o "muro" perturbava-os mesmo, e o medo da polícia era permanente. E a maioria deles queria continuar socialista. Mas era evidente que ou havia mudanças sérias — ajudaram-me a perceber o bloqueio que se adensava sobre a economia do país — ou aquilo dava para o torto. Apercebi-me disso pouco antes de me vir embora — embora "eles" insistissem para que eu ficasse. Eu era de confiança!
Não seria justo se não me referisse à cultura que se respirava em Berlim. Bons grupos de teatro, bons concertos no Palast der Republik, museus impecáveis, livros muito baratos (pelo menos quando comparados com o que eu conhecia de Portugal...). Pena que o meu alemão fosse bastante limitado.
Lembro-me do mal estar quando, nas Caldas da Rainha, onde regressei uns tempos quando vim para Portugal, na então Casa da Cultura, falando sobre a minha experiência na RDA, coloquei sérias reticências quanto ao futuro... Seriam certamente já os meus "desvios de direita", com que o PCP me viria sistematicamente a mimar nos tempos seguintes.
Assistir à queda do muro pela televisão doeu-me. Era o fim de um sonho. Apesar de tudo, eu fora feliz na RDA e aquela gente merecia muito mais do que ser "anexada" pela RFA. Apesar de tudo, saí de lá a acreditar que o socialismo superaria a crise.
Hoje, aceito que a queda do Muro era inevitável. E foi sadia para nós todos.
 
Texto publicado no Esquerda.net


sábado, 7 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #11















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

SÓCRATES

Um aplauso: o governo anunciou que vai reduzir para um ano de descontos o tempo necessário para ter direito ao subsídio de desemprego. Mais vale tarde do que nunca!

Uma censura: a referência ao passado (dito) revolucionário de Pacheco Pereira como arma política é colocar a discussão parlamentar do programa do governo ao nível da “conversa de café”. Lamentável (e isto não é um louvor ao Pacheco Pereira…).

REALIDADE vs. FANTASIAS

É sabido que a imagem dos políticos não é a mais agradável. Têm uma familiar fama de charlatães , de fala-barato, de ilusionistas. Sócrates, no que se refere à Educação, “cabe” nesta imagem. Ele fala com ar categórico de uma escola que não existe, das virtualidades que ninguém conhece de um modelo de desempenho, do benefício que para as escolas adviriam desta avaliação de desempenho, benefício que as escolas não vislumbram. Se fosse possível – e não é – que Sócrates falasse com rigor, agradeceria as palavras directas e justas do editorial do Público do dia 5. Com a devida vénia: “Não é novidade para ninguém que o processo de avaliação dos professores foi uma das chagas da anterior legislatura. Indignou, dividiu, desmoralizou e levou a que se instalasse nas escolas um ambiente de desalento e até de desistência.” E, após denunciar as tentativas ilegítimas de protagonismos políticos ou de querelas artificiais, o articulista conclui: “interessa, isso sim, que não se perca mais tempo inutilmente sem que se vislumbre uma saída digna que reponha a paz nas escolas e encare de uma vez por todas o processo de avaliação como algo ágil, útil e inerente à tarefa de ensinar e aprender cada vez melhor.”
Cinco estrelas para o Público.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

MAR(ESIA) #10















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

AS ESCOLAS DEVEM ESTAR SEMPRE PRIMEIRO

Acabei de ler no Sol on line uma síntese da intervenção com que Aguiar Branco encerrou um encontro que o PSD promoveu sobre Educação. Referindo-se à questão da avaliação de desempenho dos professores, Aguiar Branco considerou útil suspender o actual simplex, abrir negociações (presume-se que  entre o Ministério da Educação e os sindicatos) que conduzam à construção de um novo modelo e que se crie junto da A.R. um grupo para acompanhar a sua concretização. E disse que iria propor estas medidas ao PS.
Parece-me um bom arranque, embora pense ser difícil construir e negociar um novo modelo em 30 dias como ele propõe.
O que justifica que o PS não aceite uma proposta destas? Apenas uma falsa questão de princípio: ela significaria uma derrota política do PS. Falsa questão: o que será uma pesada derrota para o País é insistir num modelo de avaliação que não serve rigorosamente para nada, a não ser para infernizar o ambiente nas escolas. Temos ultimamente ouvido repetidas vezes, como argumento para defender o actual modelo, que "já há milhares de professores avaliados e que uns 2.000 até tiveram excelente!" Só que essa não é questão. O que deve ser investigado é se a avaliação desses milhares  melhorou o que quer que seja na vida das escolas, sobretudo nas práticas pedagógicas. Tenho cá para mim que na maioria das escolas foram os que reconhecidamente são os melhores professores os que se recusaram a alimentar uma farsa eticamente insuportável.
A avaliação de desempenho dos docentes é inevitável, devendo ser acompanhada da avaliação das escolas e do sistema educativo. Além de inevitável, tem de ser útil e justa.
O pior que pode acontecer às escolas é que esta indefinição se arraste. Se assim for, não resta aos professores outro caminho que não seja o de regressarem às ruas e à contestação. Seria útil para as escolas que tal não fosse preciso. Mas se for preciso, não culpem os professores!