sábado, 21 de julho de 2012

MEMÓRIAS DIFERENTES




Morreram no mesmo dia (ou quase). De Helena Cidade Moura retenho a sua coragem na oposição ao fascismo, integrada no grupo dos “católicos progressistas”, e das campanhas de alfabetização depois do 25 de Abril. De José Hermano Saraiva retenho na memória os gorilas com que mandou atacar e perseguir os estudantes na cidade universitária. A este facto, politicamente relevante, não vi qualquer referência nas longas notícias sobre a sua morte. De Helena Cidade Moura praticamente não se falou nas nossas televisões. Sinais de tempos negros

SOBRE O COMPORTAMENTO DOS PROFESSORES NAS GALERIAS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA



A pequena encenação dos professores (membros do conselho nacional da FENPROF e alguns “candidatos” ao desemprego imediato (contratados) ou a curto prazo (horários-zero) tem merecido o aplauso de uns e o desagrado de outros. Convém analisar argumentos de um lado e do outro.
- entre os que não gostaram há quem considere que foi um comportamento de “hooligans”. O argumento é muito fraco. Contrariamente ao “hooliganismo” (eu fiz parte da encenação) não houve qualquer violência da nossa parte. Mesmo os que não se contiveram (tínhamos combinado ficar em silêncio enquanto desfraldávamos os panos pretos, o que teria sido mais interessante) foram bem comedidos nos seus breves impropérios. Outros consideram que a Assembleia da República é um espaço demasiado nobre para manifestações. Também este argumento não me convence. De facto, a “praxe” está bem definida: quem, nas galerias, protestar ou apoiar é expulso dessas galerias. Aceitámos as regras do jogo: manifestámo-nos, o mais ordeiramente possível, e sofremos as previamente conhecidas consequências. Podíamos ter sido “identificados para posterior procedimento”, o que não aconteceu. Mas disso também estávamos conscientes. O espaço símbolo da democracia não pode estar imune à manifestação dos cidadãos, mesmo que de forma controlada. Também não colhe a acusação de que não nos interessou ouvir o que o governo e os deputados tinham para dizer: aguentámos estoicamente duas horas e meia de intervenções, algumas das quais mereceriam resposta imediata e desagradável.
Há quem ache que manifestações, quaisquer que sejam, não são prática digna da classe docente. Sentem-se mal. Acham que a manifestação pública é uma prática “inferior”, própria de operários e comunistas. Ouço muitas vezes este tipo de argumento (?) nas escolas. A esses limitar-me-ei a repetir uma das palavras de ordem da nossa última manifestação: “quando luto, também estou a ensinar”. Estou a dizer aos meus alunos que a participação política e cívica é um dever de cidadania, que é um dever, também deles, usarem todos os direitos democrática para a construção de uma sociedade mais justa. Inclusivamente, o direito de manifestação.

O que me diz a consciência sobre esta encenação na A.R.? Que cumpri o dever de ajudar a alertar o país para o crime humanitário que está a ser feito a uma boa parte da classe docente: os muito milhares de contratdos que em Setembro ficarão s desempregados. E para isso, utilizei, devidamente, um dos espaços democráticos, isto é, do povo – a Assembleia da República.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Na Assembleia da República MINISTRO NÃO TEM A DIGNIDADE DE RECONHECER QUE FOI OBRIGADO A RECUAR




Bem se esforçaram os deputados, mas não conseguiram que Nuno Crato dissesse qual o número de professores com horário zero (vulgo DACL) que constavam na plataforma, dado que os diretores de escolas/agrupamentos tiveram de aí indicar, até 6ª feira passada. Alegava o ministro que esses números eram transitórios e que apenas falaria quando, em 16 de agosto, tivesse números definitivos. Argumentação fraquíssima: perante os deputados (e o país) o ministro deveria indicar os números disponíveis, salientando, se o entendesse , que eram provisórios..
Mas a recusa do ministro em cumprir o seu dever para com os deputados tinha uma causa forte. Perante os números alarmantes que os diretores tinham lançado na plataforma – boa parte deles também enviados para os sindicatos da FENPROF -, uma média de 20 por cada escola, o ministro percebeu a inutilidade do desastre que estava a provocar: manter os critérios que tinha imposto aos diretores gerava uma situação kafkiana: sujeitava a concurso professores que, na maioria dos casos, acabariam por ficar na sua própria escola por não terem vaga em nenhuma outra. Reagindo rapidamente, o MEC tinha na véspera feito chegar às escolas novas regras, bastante mais flexíveis, com as quais os diretores passaram a poder construir horários para muitos dos professores que tinham indicado para DACL. Ainda bem. Mas era mesmo isso que o ministro deveria ter dito aos deputados…
Claro que boa parte dos diretores respirou de alívio. Sentimos a angústia que foi para muitos deles dizerem a colegas de 10, 15, 20 anos “olha, tenho de te por a concurso…”.
Os sindicatos da FENPROF (outros estiveram sempre calados) podem legitimamente dizer que a permanente denúncia da situação que foram fazendo obrigou o ministério a recuar e a encontrar soluções. Mas para os sindicatos sobra ainda um gravíssimo problema – a situação dos contratados. Continuaremos a denunciar a ameaça de desemprego generalizado que paira sobre eles e exigimos que para eles também seja encontrada uma solução digna. Os professores continuam em luta, como o diziam os panos pretos com que “nos despedimos” de uma sessão na Assembleia da República em que as respostas e as não respostas da equipa do MEC nos deixaram ainda com mais preocupações quanto ao futuro da educação em Portugal. Entre as não respostas ficou a pergunta: porque não paga o MEC a compensação por caducidade do contrato aos contratados, apõe 42 sentenças dos tribunais nesse sentido? Entre as respostas dadas registe-se o reconhecimento de que o MEC pretende voltar à situação de obrigar os jovens a escolher desde muito cedo entre a via académica (que ficará obviamente para os mais ricos…) e a via profissional (para os mais pobres, está claro), num regresso aos tempos anteriores a 1974.
Uma última nota: vamos exigir que o ministro cumpra o que anunciou: vinculação extraordinária de contratados  ainda este ano…  

terça-feira, 17 de julho de 2012

OBSCENIDADES E FALTA DE VERGONHA DO MEC ( OU OS EFEITOS DE UMA OBEDIÊNCIA CANINA À DITADURA DA TROIKA)



Com a devida vénia e aplauso, transcrevo partes de um texto de P.Guinote, publicado no jornal “Público” de 17 de Julho:

“ (…) O que se está a passar com a definição de horários-zero neste final de ano lectivo é algo vergonhoso e obsceno, um exercício espúrio, moral e eticamente inaceitável, de uma engenharia profissional em que um MEC sem capacidades de planeamento anda a brincar com a vida profissional, pessoal e familiar, daqueles que deveria saber mobilizar para uma melhoria da educação, não para o objectivo mesquinho da educação possível com o preço mais baixo

E sobre os contratados:
“Também em relação aos professores contratados há anos a insensibilidade é total, bem como a aparente falta de previsão dos efeitos secundários do lançamento de pelo menos 10-15 mil trabalhadores qualificados para o desemprego ou subemprego, atingindo quase tantos milhares de famílias e agravando uma situação de ruptura social, indecorosa quando comparada com a forma leve e descontraída como continuam a mover-se a maioria dos interesses instalados na órbita do Orçamento de Estado”

Enfim: sabe bem ver que não são já apenas os sindicatos da FENPROF a denunciar esta miserável atuação do MEC. Um grande esforço de unidade entre todos os que não comungam deste miserável comportamento, de modo a por termo a esta barbárie, é uma exigência moral e política. 

domingo, 15 de julho de 2012

PAULO PORTAS 2




Além do que anteriormente escrevi sobre a fraudulenta tese de que no público se ganha mais do que no privado, merece também ser analisada outra das ideias que PP vem impingindo: a de que não há despedimentos na função pública, ou que aí há maior estabilidade. Nos tempos que correm, em que se anuncia o despedimento de 20000 professores em Setembro, esta afirmação é, pelo menos, extemporânea…Boa parte destes contratados agora escorraçados serviram a causa pública, consecutivamente no ministério da Educação, durante 10, 15 ou mesmo 20 anos, sem nunca deixarem de ser contratados. O que seria considerado uma irregularidade grave se fosse no privado.
Claro que Paulo Portas sabe isso: quando era oposição fez aprovar na A.R. uma recomendação ao governo de Sócrates para que vinculasse – isto é, criasse estabilidade e progressão na carreira – aos docentes contratados com 10 anos de serviço. Logo que foi para o governo, fez o mesmo que Sócrates: ignorou a dita recomendação.
Assim se triunfa na política em Portugal!

sábado, 14 de julho de 2012

PARA PAULO PORTAS, POLÍTICA É DEMAGOGIA




Paulo Portas é um homem inteligente. Paulo Portas domina bem a arte da retórica. Sabe melhor do que ninguém que, falando para um vasto auditório, importante é dizer o que o “auditório”gosta de ouvir, mesmo que o que se diz não seja verdade. O homem forte do CDS-PP sabe muito bem que, comparando cada uma das funções, não é verdade que no “público” se ganhe mais do que no privado. Os docentes que trabalham nas escolas privadas ou cooperativas do ensino não-superior ganham praticamente o mesmo que os das escolas públicas – fruto aliás de forte campanha dos sindicatos, nomeadamente do SPGL, nesse sentido. Sabe que os médicos no “privado” ganham muito mais do que no público. Sabe que uma queixa dos gestores públicos é que ganham menos que os gestores do privado. Conhece certamente a “queixa” do atual ministro da Saúde de que perdeu muito dinheiro quando aceitou ir para o governo, deixando de ser pago pelo banco privado em que trabalhava. Os funcionários auxiliares e administrativos das escolas públicas ganham miseravelmente. E podíamos continuar a fazer comparações várias.
O ministro Paulo Portas sabe muito bem que o que, em termos absolutos, provoca que a média dos salários na função pública seja superior à do privados é o número de quadros superiores altamente qualificados que os serviços públicos, se querem ter qualidade, têm de empregar: professores (em número muito superior aos que lecionam no privado), médicos e enfermeiros (idem), juízes, técnicos das finanças, e os inúmeros licenciados necessários ao funcionamento da máquina administrativa do Estado. O sujeito sabe tudo isto. Mas sabe também que nessa maneira ordinária de fazer política, a demagogia, que é apenas a mentira mais refinada, dá sempre lucro…imediato. Talvez que uma das causas da nossa crise esteja no uso permanente das artes da demagogia na prática política.

AFINAL DE CONTAS, O QUE É UM ENSINO SUPERIOR?



1.      Este caso do ministro Relvas pode e deve ser analisado sob diferentes perspetivas. A mais óbvia: em qualquer país decente um ministro decente que se visse envolvido num caso destes teria já apresentado a sua demissão. Se a falta de decência recai sobre o país ou sobre o ministro deixo à vossa escolha.
2.      Também o impacto que terão sobre a credibilidade dos políticos as justificadíssimas dúvidas sobre as licenciaturas de José Sócrates e agora do ministro Relvas  - pelo menos eticamente fraudulentas – me parece inevitável e já tratado.
3.      Parece-me que há que questionar se em boa verdade um “ensino superior” pode em algum caso transformar uma qualquer prática ou vivência num conhecimento de nível superior. Isto é, se epistemologicamente se poderá estender para as universidades o modo de entender que presidiu – e bem - ao programa das Novas Oportunidades, pensado e limitado ao ensino não superior mas que a Lusófona ,pelos vistos, estendeu às suas licenciaturas.
Sempre entendi um ensino superior como um campo onde a fundamentação científica e portanto teórica de um qualquer conhecimento deveria ser exigência primeira, conhecimentos de resto sujeitos a procedimentos metodológicos rigorosos. Não vejo como isso se compatibilize com dar “equivalências” a cadeiras de um qualquer curso. Se uma universidade pretende salientar o “curriculum vitae” de alguém que, não sendo cientista, desempenhou papel relevante na sociedade, confere-lhe o grau de doutor “honoris causa”, isto é, distingue-o tendo em atenção o seu valor como pessoa, o que é bem diferente de lhe dar equivalências científicas. Quanto muito Relvas podia ser licenciado “honoris causa”… o que seria uma ofensa para a tradição da concessão desta distinção honorífica.