domingo, 31 de janeiro de 2010

COMBATER O INSUCESSO ESCOLAR

A questão do insucesso e abandono escolares voltou à primeira página dos jornais. E é bom que assim seja porque são muito preocupantes os elevados índices que ainda mantemos. Convém contudo que aprendamos com a experiência, para que não repitamos os mesmos erros. Eis alguns erros que é preciso evitar:

- não cair na tentação de resolver o problema através de jogos estatísticos ou de facilitismos sem coerência.

- reconhecer que perante dificuldades que ao alunos apresentem, impingir-lhes “mais do mesmo” só consegue agudizar o problema.

Defendo que só em casos excepcionais se deve reter um aluno no mesmo ano. Mas para que isso não signifique “passagem à balda” é necessário deixar a cada escola decidir qual o melhor modelo para recuperar atrasos de aprendizagens que os alunos apresentem. É preciso que essa tarefa de “recuperação” não se transforme em sobrecarga de trabalho nem para o aluno nem para o professor. Isto é, que para o aluno signifique um melhor uso do tempo que tem de estar na escola; para o professor que esse trabalho seja considerado de “componente lectiva”.
A recuperação de atrasos deve ter lugar logo que detectado ou pelo menos logo no ano lectivo seguinte. E partir do princípio que, por norma, os atrasos de aprendizagem são recuperáveis, de modo a que os alunos possam logo que possível retomar o seu percurso normal. A eternização e generalização dos chamados “currículos alternativos” são de evitar, porque não recuperam, apenas discriminam.

sábado, 30 de janeiro de 2010

ENFERMEIROS

Não conheço suficientemente bem as razões que levaram os enfermeiros a estas formas de luta. Mas sei por experiência própria que quando uma classe profissional numerosa consegue greves — e foram  3 dias! — com adesão tão elevada que nem o Ministério da Saúde põe seriamente em causa os números avançados pelos sindicatos (80% para uns, 90% para outros) e consegue uma tão significativa manifestação é porque tem "carradas de razão" para os seus protestos. Também sei que ter "carradas de razão" não significa que consiga ou sequer que seja possível obter de imediato tudo o que seria justo. Mas obriga o governo a ceder-lhes coisas importantes. É a vida feita luta para obter bons resultados. Estão de parabéns os enfermeiros portugueses.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Ao SUL #34
















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE - APELO AO BOM SENSO

As reuniões que tenho vindo a fazer nas escolas em torno do acordo assinado entre os professores e o ME serviram para em mim arreigar a opinião de que as escolas públicas portuguesas não merecem ser transformadas em campo de luta pelas décimas no processo de avaliação de desempenho docente. Não há qualquer instrumento suficientemente aferido que permita distinguir o 7,3 do 7,2 ou do 7,4 na avaliação de desempenho
O interesse das escolas e o normal ambiente entre os professores exigem que não se vá por esse caminho.
Acreditando como Descartes que “o bom senso é a coisa mais bem distribuída”, divulgo a opinião que tenho sustentado: que a divisão das classificações atribuídas aos docentes, se tiver que haver, seja a de Insuficiente, Bom e Muito Bom. E se, por razões de contingentação, houver mesmo que “seriar” os professores classificados com Bom,  de modo a decidir quem tem lugar nas vagas abertas, que se use para esse (lamentável) fim a graduação profissional. Essa obedece a critérios objectivos e “universais”. A distinção entre 7,3 e 7,1 é simplesmente aleatória e como tal deve ser rejeitada. As escolas agradecerão. 

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

DUAS PEQUENAS NOTAS SOBRE O ORÇAMENTO DE ESTADO PARA 2010

Sobre as grandes linhas e as grandes questões deste Orçamento de Estado lerei atenta e criticamente — na medida em que for capaz de criticar — o que peritos, sábios e celebrados comentadores forem escrevendo. Mas há duas ou três notas que quero sublinhar:

1. Há salários na administração pública que poderão ser congelados se a crise o exigir. Mas a grande maioria dos trabalhadores na administração pública central e local tem salários baixíssimos — muitos deles na casa dos 450 e 500 Euros por mês. Esses não poderiam nunca ser "congelados". Por uma questão de decência e de respeito. Congelar estes salários é, de facto, obrigar os mais pobres a pagar a crise. Os trabalhadores da administração pública têm toda a razão moral e política para protestar e para se manifestarem. Por outro lado, a perda de poder de compra dos trabalhadores em geral — porque este congelamento no sector público vai provocar aumentos baixíssimos no sector privado — vai tornar ainda mais difícil a vida das empresas pequenas, das lojas de bairro, do pequeno comércio. A menos que se desse um grande relançamento da economia — coisa em que ninguém seriamente acredita pelo menos em 2010.

2. As alterações permanentes das regras da aposentação, como aliás em outros campos, não ajudam a credibilizar o Estado. Para que os cidadãos confiem em quem governa é imprescindível que se ganhe confiança. Alterar permanentemente as regras é como mudar as leis a meio de um jogo — cheira a batota.

3. Afinal, o défice "parou" nos 9,3, muito acima dos valores que foram sendo sucessivamente "aventados". A que se devem estas disparidades?

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

CRECHES E INFANTÁRIOS

O jornal Público de hoje descreve a inacreditável odisseia para conseguir um lugar num infantário em Beja. Não há vagas. Pensava eu que este sinal terceiro-mundista só se verificava nos grandes centros – Lisboa e Porto e, claro, nos dormitórios anexos. Lamentável, de facto. E isto acontece apesar da nossa baixa taxa de natalidade.
Mas ainda mais difícil de aceitar é o final da citada notícia. Pode ler-se: “O anterior executivo da Câmara colocou à disposição dois terrenos para a construção de novos centros ou jardins de infância. Ninguém se candidatou à sua aquisição." Deverá perguntar-se se não poderia a própria Câmara construir esses equipamentos sociais indispensáveis. Terão os cidadãos de ficar dependentes dos interesses da iniciativa particular que, afinal, pelo menos neste caso, não existe?

Ao SUL #33

















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

domingo, 24 de janeiro de 2010

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOS PROFESSORES: O PERIGOSO CAMINHO DO FACILITISMO

Nós, os mais velhos — possivelmente por isso mesmo — ficamos atónitos quando nos apercebemos que em muitos cursos, ou pelo menos em muitas cadeiras de muitos cursos do ensino superior, a nota mínima que se dá é 15 ou 16… Talvez por mimetismo esta escala tende a alastrar no secundário — esse aluno é fraquito, tem 14 valores. Parecemos um país de génios; de um modo geral essa genialidade não se manifesta no concreto da vida; pelo  menos não se manifesta de forma mais evidente do que se manifestava quando ter um 14 era raro e excelente!
O acordo assinado entre o ministério da Educação e os professores aponta no mesmo caminho: vai ser facílimo ter um Excelente ou um Muito Bom! Dêem-se as aulas sem faltas excessivas, cumpra-se o que tem de se cumprir, dêem-se altas notas aos alunos (para que não seja o papá ou a mamã a exigi-las); se for preciso e a falta de ética o permitir, bajule-se o director; ensaiem-se duas aulas —espectáculo para "encher o olho" ao avaliador (que possivelmente não saberá como se avalia uma aula de um colega) e — zás — aí está um MUITO BOM ou um EXCELENTE.
Recordo a minha passagem pelo Gil Vicente, pelo Camões e pelo D. João de Castro para concluir o então "ensino secundário liceal". De todos os professores que apanhei, houve um — apenas um — que era manifestamente muito bom — o saudoso Luís Simões Gomes. Que me dava muitos elogios e no fim lá me classificava com um 12 ou 13 — e que bem que me sabia essa nota! Parece que agora Simões Gomes há aos molhos em cada esquina. Eu não os enxergo — mas deve ser da idade, que isto de ser sexagenário tem os seus custos.
Portugal será certamente um "caso" para estudo internacional — terá um dos menos produtivos sistemas de ensino da Europa, apesar de contar com um rácio excepcional de professores excelentes e muito bons!
Minha cara ministra: os muito bons e excelentes devem ser excepcionais: só devem atribuir-se como reconhecimento de uma carreira, nunca antes de 15 ou 20 anos de docência e esse reconhecimento deve ser inequívoco na comunidade escolar e validado por entidades exteriores à escola. Informe-se sobre a qualidade dos docentes a quem no ciclo avaliativo (só por ironia assim chamado) agora findo foi atribuída essa classificação de mérito excepcional. Assustar-se-á. Até porque os professores que eram (são) mesmo muito bons se recusaram a alimentar essa fraude. Acredito que agora não haja condições para alterar o que ficou no acordo. Temos dois anos para o fazer.

sábado, 23 de janeiro de 2010

PROFESSORES PORTUGUESES TÊM DOS HORÁRIOS MAIS SOBRECARREGADOS E SÃO DOS QUE TRABALHAM MAIS HORAS EM CASA


Estudo do OCDE repõe a verdade
O relatório “Education at a glance 2009” torna claro que os docentes portugueses estão entre os que dão mais tempo de aulas e permanecem mais tempo na escola. E, como se isso não chegasse, estão também entre os que mais trabalham em casa. O relatório indica também que o ano lectivo em Portugal é mais curto do que o da média da UE e OCDE. Creio que isso fica a dever-se ao facto talvez muito útil do ponto de vista administrativo mas pedagogicamente sem sentido que são os exames nacionais. Note-se que durante o período dos exames boa parte dos docentes se mantém a trabalhar ”em bom ritmo” nas escolas.
Parece também evidente que não há relação positiva entre o tempo que se ocupa nas escolas e a qualidade das aprendizagens: aí continuamos na cauda da Europa (não só da União Europeia).
Caem assim por terra as idiotices que tantos encartados comentadores foram vociferando contra os horários dos docentes portugueses na sua ânsia canina de apoiarem a célebre Lurdes Rodrigues. E ganham novo alento as negociações em curso sobre esta matéria entre a nova equipa do Ministério da Educação e os sindicatos. E para que se ponha termo à escravatura a que muitos dos docentes estão sujeitos não são precisas muitas medidas! Aqui ficam algumas propostas: 

 - não se registe no horário semanal dos professores/educadores a componente não lectiva – de facto, registá-la só atrapalha: a maior parte das horas estamos lá sem nada para fazer e nem o tempo conseguimos aproveitar porque não há condições físicas para isso.

- substituam-se as inúteis “aulas de substituição” por actividades devidamente estruturadas que interessem aos alunos (manda a verdade que se diga que, ao contrário do que se tem insinuado, os professores faltam pouco).

- haja bom senso no número de turmas e programas diferentes a inscrever no horário dos professores, incluindo aqui os contratados, que são quem costuma ficar com os piores horários.

- não se criem falsidades: todo o trabalho directo com alunos é trabalho lectivo.

- respeite-se o que está no Estatuto: a formação contínua deve ser feita nas horas da componente não lectiva. Quando for feita fora das horas de trabalho ou ao fim de semana deve dar origem a dispensa das horas de componente não lectiva correspondentes.

- limite-se corajosamente o número e a duração das reuniões – duvido que haja algum país em que as escolas façam maior número de reuniões do que em Portugal – quase todas perfeitamente inúteis!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Ao SUL #32














Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

ALGUMAS COISAS A PROPÓSITO DE UMA PRETENSA AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE

(Ainda a pretexto do texto “Os desacordos do acordo” de Santana Castilho e na continuação do texto aqui colocado ontem, cuja leitura é suposta para evitar conclusões precipitadas)

1. É certo que o modelo de avaliação do desempenho docente (ADD) que consta do acordo tem demasiadas semelhanças com o “simplex”. Mantém questões absurdas, como são os ciclos avaliativos de dois anos, a distinção entre Muito Bom e Excelente, a classificação de Regular. Introduz uma novidade perigosíssima que, se me não engano, vai dilacerar as escolas: a discriminação da pontuação, até as décimas (ou milésimas?) dos docentes classificados com Bom. Que instrumentos tão credíveis e universais poderão distinguir entre um Bom de 7,5 ou 7,4 ou 7,3, sendo que estas diferenças perfeitamente aleatórias podem determinar a passagem mais cedo ou mais tarde do 4 para o 5º e do 6 para o 7º escalões?

2. Mantém a exigência de assistência a aulas para a atribuição das classificações mais elevadas e alarga-a para a passagem dos escalões “contingetados”. Acho bem. Resta saber com que objectividade e competências vão essas aulas ser observadas/avaliadas…

3. É verdade que a burocracia foi muito reduzida; é verdade que se tentou timidamente “controlar” o arbítrio do “director” através de uma maior intervenção do Conselho Pedagógico e da nova figura do Relator. É verdade que, pelo menos nos princípios, se aposta na formação especializada para estas funções de avaliação…

4. Contudo, continuo a dizer que se o acordo fosse apenas a parte do ADD nunca o assinaria. Pessoalmente considero que o modelo de ADD aí apresentado é mau.

5. Há porém um problema: teremos já nós, professores e educadores, decidido qual o modelo de ADD que melhor garante os nossos direitos e deveres profissionais e o interesse da escola e dos alunos? Ainda estamos muito longe de qualquer consenso. Há quem, legitima e coerentemente, defenda que não deve haver avaliação – e não por comodidade ou “baldanço” – afinal em vários países europeus com sucesso educativo não há avaliação de docentes (pelo menos nos termos em que estamos a falar). Há quem defenda que, para evitar guerras internas, se deveria privilegiar a avaliação externa, como há quem, em nome da avaliação interpares rejeite qualquer intervenção externa. Há quem considere que deveria haver muito mais aulas assistidas e quem ache que isso não serve para nada. Enfim, uma variedade de soluções. E para a defesa de qualquer destas posições se invocam reputadas autoridades na matéria. A proposta da Fenprof, inteligentemente elaborada, parecia ser a que melhor conciliaria estas diversas posições. Não conseguiu, porém, ser considerada como “uma hipótese em cima da cima” por parte dos professores e educadores – temo que a maioria, pura e simplesmente a ignore. Deste modo, qualquer que fosse o modelo de avaliação agora avançado, dividiria ao extremo a classe. Se, por um lado, temo pela boa paz nas escolas, por outro espero que os professores demonstrem inequivocamente que este modelo de ADD não serve – espero que não resista à avaliação no final do 1º ciclo avaliativo. E que sejamos chamados a construir qualquer coisa de muito melhor.

6. Contrariamente a S. C. não fazemos sabáticas para ir ás escolas e discutir tudo isto com os docentes. Estamos a fazê-lo quotidianamente, como sempre o fizemos. Ouvimos apreensões, dúvidas, propostas e censuras. Mas cada vez mais se torna claro que a esmagadora maioria dos professores e educadores considera que foi uma boa medida assinar o acordo.

7. Como em todos os grandes processos de luta, os que mais arriscam são os que mais perdem ou menos ganham em caso de vitória. Apenas alguns de nós resistiram e ficaram a “marcar passo” no antigo 7.º escalão para que se conseguisse acabar com a prova de candidatura. Quantas centenas ou milhares de contos – moeda da altura – é que perderam? Alguém os indemnizou quando a prova de candidatura acabou? Na greve de 89, alguém indemnizou os que aguentaram 10,12, 13 dias de greve para que todos – mesmo os fura greves – ganhassem a contagem do tempo de serviço? Afinal nas batalhas não sucede que os heróis, que tornam possível a vitória das suas tropas acabem mortos? Meu caro Santana Castilho: tenho a certeza que os professores e educadores que mais acerrimamente lutaram neste processo – e conto entre eles os melhores profissionais que conheço – ficaram contentes com os sucessos (ainda que parciais) obtidos. E com os que se vão obter, porque as negociações continuam. E não lamentam ser, em muitos casos, os mais prejudicados. É uma questão de ética e de dever cumprido.  

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

AS MÃOS #vídeo

Fotografias de Felizarda Barradas.
Música de Mercedes Sosa, "Como Pajaros en el Aire".

RAZÕES DO MEU DESACORDO COM "OS DESACORDOS DO ACORDO”

Com a força de polemista que se lhe reconhece, Santana Castilho publicou no seu habitual espaço no jornal Público (em 20 de Janeiro) um artigo que intitulou “Os desacordos do acordo”. Porque me parece que o brilhantismo da escrita não coincide com o rigor da análise aqui deixo as minhas críticas:

1. Escreve SC que “quem ignore os antecedentes do conflito entre os professores e o Governo conclui que as razões da discórdia se circunscreviam a carreira e salários.” É verdade que boa parte do acordo se refere a uma nova estrutura de carreira e aos correspondentes índices (e não a salários). Porquê uma nova estrutura da carreira? Exactamente porque nas suas lutas contra o Governo, os professores exigiram – e com que força – o fim da divisão entre professores e titulares. Acabar com essa divisão – questão central para os professores, a menos que a alteração fosse apenas de nomes, implicava uma nova estrutura da carreira. Nova e difícil porque as situações de facto criadas com a divisão da carreira tinham de ser pensadas e acauteladas, tendo por base o princípio que nenhum professor seria prejudicado nas negociações. E, contrariamente ao que S. C. sugere, esta foi uma luta pela dignificação dos professores, pelo que este acordo é um passo importante nesse caminho (embora seja apenas isso: um primeiro passo).

2. Além desta questão essencial, SC avança com duas informações que eu designaria de “pelo menos estranhas”. Afirma que ao aceitarem a prova de ingresso na profissão, “os sindicatos subscreveram o atestado de menoridade às instituições de ensino superior”. O que acontece é que as declarações que conhecemos sobre a matéria vindas de instituições do ensino superior são de defesa desta medida! Creio que é a primeira vez que leio um responsável do ensino superior a manifestar-se contra a “prova de ingresso”! Quem passou – e continua a passar – a si próprias um atestado de menoridade são as instituições de ensino superior que não reagiram e mesmo apoiaram à decisão de M. .Lurdes Rodrigues. Os sindicatos preocuparam-se – e bem – com os professores, isto é, com os que estão a dar aulas. Para esses, não há prova de ingresso nenhuma. As instituições de ensino superior não se preocuparam mesmo nada com os seus alunos – essa é que é a verdade. Mas, como já em outros textos escrevi, o que é imprescindível é que essas instituições (e todos nós) reflictam muito bem sobre que formação inicial de docentes estão a fazer. Todos nós e certamente também Santana Castilho estamos seriamente preocupados com a fraca qualidade dos novos docentes.
Enorme falta de rigor – para ser comedido nas palavras – é o que SC revela no início do seu texto ao escrever – “o acordo a que o Governo chegou com alguns sindicatos (…)”. É verdade que o acordo foi com alguns sindicatos. Só que esses sindicatos representam mais de 95% dos professores. Os sindicatos que não assinaram estão, no que respeita á sua representatividade, como o POUS ou o PDA para a Assembleia da República: merecem todo o nosso respeito, mas representam o que representam.

3. Escreve SC que “a progressão (na carreira) é agora claramente mais lenta do que em 2006”. É. Só que o que (ainda) está em vigor não é o estatuto que vigorava em 2006. Esse, convém saber, foi revogado, primeiro pelo 15/2007, que por sua vez foi em parte substituído pelo 270/2009. É com eles que a comparação deve ser feita. E essa comparação revela o que S.C. não quer ver. Agora, mesmo com dificuldades dispensáveis, a esmagadora maioria dos docentes progredirá até ao topo da carreira, o que não aconteceria nunca para cerca de 2/3 na estrutura do 270/2009.

Por hoje fico por aqui que o texto já vai demasiado longo para um blogue… Regressarei à crónica de Santana de Castilho para discutir a questão da avaliação de desempenho.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

COISAS IMPORTANTES NA EDUCAÇÃO – O HORÁRIO E CONDIÇÕES DE TRABALHO DOS PROFESSORES E EDUCADORES

Inicia-se hoje uma segunda parte do desfazer das barbaridades impostas pela equipa Lurdes Rodrigues/Valter Lemos à escola pública portuguesa. Tomando como exemplo alguns casos, infelizmente reais, de docentes incumpridores, lançarem esses responsáveis políticos uma série de mentiras para gáudio da “opinião pública”: que os professores faltavam muito – os números apontavam precisamente para o contrário! –, que tinham um horário de trabalho semanal de 22 horas ou menos (confundindo o trabalho dos docentes com a sua carga lectiva – nesse sentido absurdo poder-se-ia dizer que os professores do ensino superior trabalham 6 ou 9 horas por semana), entre outras aleivosias. Como grande disciplinadora, “toca de amarrar” os professores à escola. Surgiram as célebres “aulas de substituição”, com as quais se puseram professores à frente de alunos que não conheciam e que não estavam nada interessados em o conhecer, i.e, numa relação pedagógica inexistente e causa de enorme pressão e sofrimento para todos; obrigaram-se os docentes a estar horas a fio em salas sem condições de trabalho em serviço de “apoio à gestão” i.e, “pau para toda a obra”, multiplicaram-se burocracias e intermináveis reuniões por tudo e por nada. O resultado está à vista: os professores mais velhos, incapazes de responder a este massacre, correram para a aposentação; os que até então trabalhavam com gosto sem contarem as horas que gratuitamente davam às escolas, desesperaram; enfim, os que já trabalhavam pouco continuaram a trabalhar pouco. A escola tornou-se um inferno para os docentes, sobretudo para os melhores docentes; a qualidade das aulas, por melhor boa vontade que se tenha, degradou-se por absoluta falta de tempo para as preparar.
É isto que a partir de hoje vamos tentar mudar. Não no sentido de não trabalhar nem sequer de trabalhar menos. Mas com o objectivo de nos deixarem ser professores e educadores e não nos tornarem em “vigilantes de crianças” ou em “mestres da burocracia”. Que se façam as reuniões estritamente necessárias e só essas. Que nos dêem tempo para estudar e nos actualizarmos. Que nos dêem tempo para trabalhar e acompanhar os nossos alunos. Que nos tratem como professores.
Não vai ser fácil. Mas os professores e as escolas merecem que se altere o actual estado de coisas.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Ao SUL #31














Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

A IRLANDA E NÓS

1. Ainda nos lembramos dos tempos em que os nossos economistas "de referência" e boa parte dos nossos políticos nos apresentavam a Irlanda como o exemplo do sucesso que Portugal devia imitar. Era um desenvolvimento crescente, era a liberalização levada ao extremo. Sabemos hoje que todo aquele desenvolvimento e crescimento não tinha bases sólidas, era enganador. A crise pôs a nu a fragilidade do que nos impunham como "modelo".

2. Parecem não ter aprendido nada: insistem agora que Portugal deve imitar as medidas tomadas pela Irlanda, nomeadamente a redução dos salários na administração pública, a extrema contenção salarial, e as inevitáveis privatizações. Não nos iludam: face à debilidade do nosso sistema produtivo e à diminuição do investimento estrangeiro, só a manutenção/aumento do poder de compra dos trabalhadores, incluindo os trabalhadores da administração pública, permitirá a sobrevivência de um grande número de pequenas empresas, do comércio tradicional, afinal, pilar do nosso sistema de empregos.

3. É indispensável aumentar as receitas fiscais? Comecemos por travar a fuga aos impostos, nomeadamente dos bancos; combatamos a fuga aos impostos através dos off-shores e paraísos fiscais; criem-se taxas fiscais para os lucros obtidos na Bolsa… Não consta que estas medidas tenham sido tomadas pela Irlanda. É que é sempre mais fácil sobrecarregar os mais fracos.

sábado, 16 de janeiro de 2010

A CANDIDATURA DE ALEGRE

Aprendi em manuais de filosofia que o cepticismo foi sempre um factor importante para o desenvolvimento do conhecimento. Mas nunca li  em manuais de referência que a atitude derrotista ajudasse a resolver qualquer problema. Nesta distinção pode estar parte do problema dos portugueses. O cepticismo é uma atitude crítica e exigente: revela compreensão dos problemas, recusa do simplismo na(s( sua(s) abordagem(ns), em suma: recusa em não seguir caminhos fáceis e inúteis, mas firmeza na busca de alternativas. O derrotismo é a desistência. Sou céptico quando à possibilidade de a falta de rigor e de princípios da equipa de Sócrates, a começar por ele próprio, conduzir Portugal para uma situação de segurança económica e de justiça social. Mas acredito que o país vai ser capaz de encontrar uma saída e um rumo — por isso recuso o derrotismo. Parece-me que a candidatura presidencial de Manuel Alegre — ele próprio porta-voz de um acertado cepticismo quanto ao rumo que o país leva —, distanciando-se do inútil derrotismo esotérico, é um apelo à esperança. Uma esperança no país, uma esperança que será assumida por todos aqueles que não desistem dos valores da justiça e da solidariedade. Bons ventos a tragam!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

SEM CHAMPANHE NEM CICUTA

Por João Paulo Videira

Reflexões em torno do acordo ME/Sindicatos

Preâmbulo.
Ao escrever sobre o assunto em título, permitam-me dirigir as primeiras palavras para o Secretariado Nacional da FENPROF, saudando todos os seus elementos, Em particular aqueles que integraram as equipas de negociação. Fazer juízos de valor a posteriori é bem mais fácil do que preparar todas as matérias, sob todos os ângulos e, mesmo assim, sofrer a tensão de ter de decidir na hora com a responsabilidade de representar milhares de professores. Registe-se, também, a mudança de atitude desta equipa ministerial. 
Quando se chega a um acordo, chega-se a um compromisso que resulta de um processo negocial que permita não esmagar nem soçobrar. A classificação de um acordo como bom ou mau parece-me inútil e despicienda. Há que perceber as vantagens e as desvantagens do mesmo e maximizar os efeitos daquelas, minorando os destas. Não havendo razões para champanhes desmedidos e comemorativos, não as há, também, para cicutas capitulantes e suicidas.

Teor e Tempo da Negociação .
Este processo negocial teve um teor fortemente laboral com uma incidência quase exclusiva na carreira. Aqui poderíamos ter estado melhor. Tanto maiores serão os dividendos de uma negociação, quanto mais a conseguirmos centrar nas questões educativas. 
Há quem questione se este tinha de ser o tempo da negociação, se isto tinha de ser assinado já. Não esqueçamos que o ME apresentou um calendário negocial e que esse calendário estava refém da iniciativa parlamentar do PSD. Se este processo fosse parar à Assembleia da República, não só não saberíamos como seria resolvido, como sabíamos à partida que estávamos excluídos de participar. 

Acordo de Princípios.
Um acordo de princípios significa que as partes envolvidas na negociação acordaram quanto aos princípios orientadores da mesma o que não encerra a negociação, pelo contrário. Teremos de respeitar estes princípios mas teremos, também, de bater-nos para que sejam levados a cabo em benefício da Educação e dos seus agentes. 

Da Luz.
O presente acordo trouxe à luz alguns factores positivos, essencialmente no âmbito da carreira, que me parecem muito benéficos:
- Aboliu-se a divisão da carreira em categorias.
- Garantiu-se que todos os professores avaliados com Bom cheguem ao topo da carreira.
- Criou-se espaço para a tão desejada tranquilidade nas escolas. Admito a sua precariedade mas, ainda assim, vivemos um tempo muito diferente, para melhor, da recente guerra acesa que travámos. 
- Garantiu-se a continuidade do espaço negocial.
- Conseguiu-se a supressão da prova de ingresso para contratados com um contrato e uma avaliação de Bom.
- Conquistou-se o compromisso da realização de um concurso nacional de professores já em 2011.
- Conseguiu-se a criação de um programa de formação em avaliação.
- Conquistou-se a simplificação dos procedimentos de Avaliação o que pode gerar uma maior eficácia e um menor peso burocrático.

Das Trevas.
Há ainda aspectos que gostaríamos de ter superado mas que temos de admitir são insatisfatórios e prejudiciais à Educação e aos professores:
- Continuamos com uma carreira demasiado longa.
- Permanece, em sede de ADD, uma escala quantitativa em vez de uma escala qualitativa assente em critérios.
- Mantém-se a menção de Regular. Não há sustentabilidade científica para a sua existência. Nem profissional. Os professores têm de ser bons. Se o não forem, temos de assumir a sua insuficiência e accionar mecanismos de apoio e recuperação. Um professor regular é uma figura constrangedora para o sistema educativo português. De resto, esta figura cria um absurdo avaliativo que é punir quem foi positivamente avaliado.
- Mantêm-se as menções de Excelente e Muito Bom. Para além das evidentes dificuldades de diferenciação, a sua coexistência rouba espaço à dignificação a ambas. 
- Os ciclos bienais de avaliação vão converter a ADD num obstáculo ao desempenho propriamente dito pelo que deveriam ser substituídos por um momento formal de avaliação por escalão. 
- Os Objectivos Individuais, facultativos ou não, introduzem ruído naquilo que deve ser o trabalho em torno da consecução dos objectivos do Projecto Educativo e do Plano Anual de Actividades.
- O Relator tem de ser um elemento eleito e não nomeado. Emerge de tal eleição o primeiro passo para o reconhecimento profissional da sua autoridade enquanto avaliador. 

Conclusão.
Há, de facto, muito a fazer, ainda, mas muito já foi feito. 
Torna-se evidente que os ganhos são, sobretudo, da esfera laboral e de carreira sendo que a área onde ficámos mais aquém daquilo que a Escola e os professores precisam é a Avaliação do Desempenho. Temos de assumir as conquistas como fruto do nosso trabalho e encarar as desvantagens com frontalidade e abnegação, detectando-as, analisando-as e combatendo-as. Não vamos já a correr beber o champanhe da vitória que nas negociações não de trata de ganhar nem perder. Trata-se de criar compromissos. Mas não corramos para a cicuta nem capitulemos porque com trabalho, com exigência e com dedicação conseguiremos cada vez melhor em prol da Escola com que todos sonhámos um dia.

João Paulo Videira
Secretariado Nacional FENPROF
Coordenador Direcção Regional Santarém - SPGL

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

HÁ MAIS VIDA PARA ALÉM DO PIB














A ATTAC é de facto um grupinho. Às vezes, um grupo muito reduzido onde "brilham" uns tantos pertencentes ao que agora parece que se designa "a geração perdida", e outra malta, que mesmo sem ser "da perdida" também não é muito achada. Enfim, malta que ainda arranja tempo e disposição para organizar debates sobre temas capitais. E há sempre uns cromos sabedores bem dispostos para os apoiar, incentivar e com eles colaborar.
HÁ MAIS VIDA PARA ALÉM DO PIB é o próximo desses debates. Organizado pela ATTAC com a colaboração do SPGL e do Le Monde Diplomatique - edição portuguesa.
No próximo sábado, às 15,30,na Biblioteca Museu República e Resistência (no cimo da Rua da Beneficência, logo a seguir à Rua Soeiro Pereira Gomes (como vê, os vizinhos são simpáticos). Botarão discurso Gualter Baptista da FCT/UNL, José Castro Caldas (Centro de Estudos Sociais da U. Coimbra), Luís Carvalho -ISCTE-Lisboa, Manuela Silva, prof.ª universitária (aposentada) e Susana Peralta- Fac. Economia da U.N. Lisboa. Va lá! Olhe que há mesmo mais vida para lá da televisão no sofá nas tardes de Sábado!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

VAMOS LÁ A ALGUMAS COISAS IMPORTANTES

O texto de Francisco Lopes Viegas que ontem tentei comentar (apenas conhecia a parte transcrita pelo jornal Público. Aproveito para lhe agradecer o seu comentário) merece que tentemos definir "coisas" importantes para a melhoria do nosso ensino e da nossa escola. Aqui fica o desafio a quem quiser usar este espaço para dinamizar esses debates. Por mim, vou inicia a discussão com uma questão em que, penso, todos estaremos de acordo, mas sobre a qual nada praticamente se tem agido. Todos o dizem: temos uma fraca formação inicial dos nossos professores — falha que nem a melhor formação contínua consegue colmatar. É por aí que devemos começar se não nos ativermos apenas ao imediato e, pelo contrário,  aceitarmos trabalhar em profundidade Não sendo eu perito na matéria — longe disso — não me atrevo a propor soluções. Mas basta olhar para o que se passa para perceber que algo tem de mudar. Por outro lado — e não é por saudosismo —, o modelo de estágio que eu vivi, que me obrigava a ser professor de facto de umas turmas e a ser acompanhado por um docente mais experiente, a cujas aulas eu assistia — e ele às minhas, claro — parece-me muito mais interessante do que o simulacro que agora se faz (infelizmente, por entender que ainda não são professores, o Governo de Sócrates decidiu não pagar nada aos "estagiários" do "integrado"). Por mim, estes seriam os primeiros passos de uma reforma séria da nossa escola. Haja para tal vontade e coragem política.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

HÁ MUITAS COISAS REALMENTE IMPORTANTES

O P2 de hoje, 12 de Janeiro, na coluna "Frases de ontem", cita Francisco José Viegas. O texto transcrito, parecendo de fácil aceitação, revela porém uma visão pouco rigorosa do tema tratado. Leiamos o texto citado: "Sejam quais forem as várias e diferentesconclusões a tirar do acordo entre os sindicatos e o Governo, há uma coisa que parece mais ou menos exigível: que, agora, a discussão se centre em redor do ensino, da escola, da educação — ou seja, do que realmente interessa."
Não é difícil concordar com FJV. num ponto: reduzir a discussão das questões do ensino e da escola à carreira e à avaliação dos docentes, como aconteceu na última campanha eleitoral, pode ser esquecer o essencial. Mas se tal aconteceu — e durante largos meses esse foi o tema quente e quase único — foi exactamente porque sem resolver essas questões que FJV considera menores não há qualquer hipótese de sequer considerar essas que, segundo ele, "são o que realmente interessa." Não é possível pensar na reforma dos currículos e dos programas e no sucesso dos alunos quando boa parte dos docentes — e provavelmente os melhores docentes — se sentem humilhados por uma ministra que de bom grado os trocou pelo aplauso ignorante da opinião pública ("Perdi os professores mas ganhei a opinião pública", M. Lurdes Rodrigues), com acusações gravíssimas à sua deontologia e dedicação, ou, só para citar mais um exemplo, por um secretário de Estado (Valter Lemos) que, ao que consta, se terá referido na Assembleia da República, aos professores que se opunham às barbaridades da ministra — e era a classe quase toda! — como "professorzecos." Como tratar das "questões importantes" se boa parte dos professores que tinham sido o sustentáculo das suas escolas passaram a contar desesperadamente os dias que faltavam para a aposentação — e se aposentaram com enormes prejuízos salariais? Será o acordo agora celebrado suficiente para alterar este estado de coisas? Vejamos: O "acordo" — e foi bom que tivesse sido assinado — apresenta evidentes fragilidades. O quase garantido acesso da esmagadora maioria dos docentes ao topo da carreira fez-se à custa de uma carreira longuíssima — em média 34 anos, sendo que, com o "roubo" do tempo de serviço entre 2005 e 2007 - roubo aplicado a toda a administração pública — e com as distorções decorrentes do modo como se fizeram as recentes "passagens" de um carreira para o outra, boa parte dos docentes actualmente em exercício precisará de quase 40 anos! Acrescentem-se a isto as profundas reservas que toda a classe — a começar pelos sindicatos da Fenprof — manifesta face ao modelo de avaliação de desempenho que, por razões óbvias, deixa prever o desenvolvimento de insanáveis lutas dentro de cada escola, situação agravada pelo poder praticamentee absoluto que, neste processo avaliativo, é atribuído a um único sujeito: o director.
Registe-se também que o acordo ainda está incompleto: dele faz também parte a renegociação imediata das condições de trabalho e dos horários dos professores — matéria aguda que poderá fazer variar o juízo de muitos docentes sobre o acordo assinado.
Não se veja neste meu aparente pessimismo qualquer intenção de pôr em causa o que assinámos. O que assinámos é para cumprir. E repito: foi um acto muito lúcido a sua assinatura por parte dos sindicatos  Mas ter consciência da fragilidade do terreno em que nos passámos a mover é indispensável para que se chegue, de facto, a bom porto. E regresse às escolas pelo menos uma paz relativa que nos permita debruçarmo-nos sobre outras coisas que são também importantes.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Ao SUL #30

















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

NA MOUCHE

"Este acordo é histórico porque ele permite salvar da humilhação alguns milhares d professores" (...) "Ele permite salvar a escola dum inferno burocrático" (...) "Mas é preciso ter em conta (...) que os professores e os médicos são as classes mais directamente escrutinadas pela sociedade. Cada dia, cada hora, o professor passa pelo escrutínio cerrado de dezenas de crianças e adolescentes. Basta imaginar uma sala de aula. Não é pouca coisa. É por isso que este acordo histórico ainda não terminou. Ele só ficará selado quando Isabel Alçada verificar a que professores, durante estes dois anos, foram atribuídas as notas de excelente e tirar daí as suas conclusões. Talvez resolva anular aos seus efeitos. É que os professores duma escola constituem uma família. Experimentem criar um escalão de avaliação entre os membros de uma família que se autovigia."

(Transcrição parcial do depoimento de Lídia Jorge no Público de 10
de Janeiro. A ler na íntegra!)

domingo, 10 de janeiro de 2010

LURDES RODRIGUES NOMEADA PRESIDENTE DA FLAD

A nomeação de Maria de Lurdes Rodrigues,pelo primeiro-ministro José Sócrates, para a presidência da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento só pode ser lida como uma recompensa pela fidelidade "canina" e acéfala com que Lurdes Rodrigues, contra todas as evidências e defendendo posições insustentáveis — como o acordo agora assinado bem demonstra — tentou fazer cumprir os ditames de Sócrates no campo da Educação. É assim premiada uma personagem que contribuiu para o descalabro da educação pública em Portugal, que criou nas escolas e entre os professores um ambiente de crispação, desalento e de revolta que durará anos a superar. Que esta nomeação tenha sido tornada pública pouco mais de 24 horas após um acordo entre os professores e o ME que enterra boa parte das "bandeiras" de José Sócrates teimosamente defendidas pela agora "recompensada" não terá sido certamente uma mera coincidência. Parece-me mais um sinal claro: José Sócrates não esquece os amigos nem quem lhe fizer os fretes.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

LUZES E SOMBRAS DE UM ACORDO COMPLICADO

O acordo assinado ontem, 7 de Janeiro, entre os sindicatos representativos da classe docente e o Ministério da Educação apresenta como principal aspecto positivo – muito importante – o facto de a progressão na carreira e o acesso ao seu topo para os bons professores e educadores ficarem assegurados, mesmo que com ritmos de progressão diferentes. Se o compararmos com a situação da carreira de 1998, teremos de o considerar um mau acordo: a progressão é mais dificultada e a carreira é muito mais extensa. Acontece porém que a comparação que tem de fazer-se é com a carreira imposta pela equipa anterior. Nessa, traduzida na sua versão final no Dec. 270/09, cerca de 2/3 dos docentes ficariam longamente retidos no topo da carreira de “professor” (na altura, índice 245), esperando amargamente que fosse libertada uma vaga na carreira dos “titulares”, o que poderia nunca acontecer. É essa situação que agora é resolvida: todos os professores com a classificação de Bom chegarão ao topo da carreira (índice 370). È uma boa vitória da luta dos docentes. Por outro lado, o acordo permite que a partir de 20 de Janeiro se inicie um novo ciclo de negociações sobre questões tão essenciais como os horários e condições de trabalho, concursos, entre outros.
Qual é porém a grande sombra que emerge deste acordo? O modelo de avaliação de desempenho. Por um lado, o ciclo avaliativo de 2 anos. Por outro – e talvez o mais complicado – o facto de a classificação “quantitativa” atribuída ser o elemento que permite a graduação nacional que determina o ritmo de passagem do 4.º escalão para o 5.º e do 6.º para o 7.º. Já se imaginou como vão ser as escolas quando os docentes lutarem por um 6,9 e não por um 6,8 – porque esta diferença pode significar que se passe mais cedo ou mais tarde para o 5.º ou 7.º escalões? Alguém acredita que os instrumentos sejam tão aferidos que permitam aos avaliadores distinções deste calibre? Temo que as escolas “colapsem”. E espero que este modelo de avaliação de desempenho não resista para lá do 1.º ciclo avaliativo.

Alguém poderá perguntar-me: então porque defendeu que se devia assinar o acordo? Por uma questão de profundo respeito para com a vida profissional dos milhares de docentes a quem Maria de Lurdes Rodrigues cerceou drasticamente a progressão da carreira.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

ADD #6

Por João Paulo Videira

Qual o peso burocrático-administrativo que um modelo de ADD suporta?

Pouco. Muito pouco. A questão da burocracia e seu cruzamento com a ADD é antiga e recorrente por uma razão óbvia. A avaliação implica registos e formalização e isso só pode fazer-se recorrendo a mecanismos burocráticos e administrativos. Contudo, salvo casos excepcionais, os professores reagem muito mal a tais mecanismos uma vez que estão fora do âmbito funcional da sua profissão. Não foi para isso que estudaram, não foi para isso que foram treinados e não é para isso que fazem formação ou investigação. Logo, mesmo sem quantificar, porque seria tarefa inglória e impossível, consigo dizer que as tarefas burocráticas e administrativas devem ser reduzidas ao mínimo indispensável. E Digo mesmo mais: é muito mais importante registar bem do que registar muito. 
De resto, a experiência vivida no passado recente mostrou-nos algo interessante: a reclamação central dos docentes em relação à ADD era que queriam que os deixassem ser professores, que precisam de ter tempo para aquilo que é importante e fundamental: as aulas. É evidente que também reclamámos uma avaliação justa e pertinente mas, antes de mais, sentimos que estávamos a desviar-nos da essência da nossa profissão e tal não era admissível. Ora, a causa central identificada como responsável por tal desvio foi a chamada “carga burocrática”. A meu ver, não repetir este erro já nem é uma questão de inteligência política, é uma simples questão de sensibilidade e bom-senso. Tendo sido esta expressão cristalizada no tempo por uma escritora, esperemos que a actual senhora Ministra da Educação, também escritora, seja sensível à formula austeniana.
Outra questão interessante prende-se com a responsabilidade de execução das tarefas burocrático-administrativas. A meu ver só aquelas que forem da exclusiva responsabilidade do docente e tenham de ser assinadas por ele devem ser executadas por ele. Todas as outras tarefas deste teor têm de ser executadas por outros elementos da comunidade escolar que não os professores.
E porque corre tanta tinta e ferve tanto sangue a propósito desta questão? Acredito em três grandes motivos que nos devem fazer reflectir. Primeiro, um excessivo labor de índole burocrática com uma profusão desnecessária de instrumentos de registo e formalização tem como consequência a perda do teor pedagógico, logo formativo, da ADD. Ora, quando se chega a este ponto, normalmente os avaliados perguntam “Mas porque é que eu estou a fazer isto?” ou “O que é que isto acrescenta à qualidade do meu desempenho?” Segundo, decorre da primeira constatação esta segunda que se resume a isto: o avolumar das tarefas burocráticas, vulgo preenchimento de papelada inútil para arquivar onde nunca mais ninguém irá, faz com que se esfume no horizonte o propósito da Avaliação do Desempenho. Envoltos nas tarefas pequeninas, imediatas, urgentes e erroneamente consideradas imprescindíveis, os docentes perdem no seu horizonte de trabalho em torno da ADD aquilo que não sendo urgente é importante: o porquê, o propósito, o objectivo a que um tal conjunto de tarefas deveria conduzir. A consequência imediata disto é os avaliados sentirem-se perdidos no processo e passarem a executar mecanicamente e sem qualquer ligação ou teor formativo os diversos passos do processo.  Por fim mas não menos importante a terceira razão por que tanto se fala da “carga burocrática”: trata-se do inexorável facto de as tarefas de avaliação do desempenho poderem converter-se num obstáculo ao desempenho propriamente dito. Usando uma imagem futebolística, que normalmente desprezo mas aqui me parece ser útil, é como aquele jogador que faz muitas e maravilhosas fintas mas nunca passa do meio campo nem deixa a equipa jogar. Normalmente, no fim de um jogo desses, há frases do género “A equipa X joga muito bem, nem merecia ter perdido por 7-0!” Acontece que o peso das tarefas burocráticas é exercido em cima de profissionais que estão desempenhando uma profissão complexa e exigente, que requer múltiplas atenções, milhares de pequenas e grandes acções, muito estudo, investigação, sentido ético e uma grande concentração. Ora, a papelada provoca, com facilidade, ruídos no desenvolvimento deste processo complexo que é a docência.
Por tudo isto, acredito que os ciclos avaliativos devem ser mais espaçados no tempo do que actualmente. Não me parece que ciclos bienais possam levar a bom porto. Se há consequências da ADD na carreira, se a carreira se estruturará, a ver vamos, em escalões de quatro anos, o que faz mais sentido nesta perspectiva que temos vindo a analisar hoje, é que, independentemente de ser contínua, a ADD tenha um momento formal uma vez por escalão, ou seja, de quatro em quatro anos.
Um designer russo, Dimitri Kirsakov, escreveu um dia as 10 regras de ouro para se ser um bom designer. Sei que não estamos a falar de designers nem de design mas não resisto a transcrever aqui a primeira dessas regras: “Keep it simple”
Efectivamente, acredito que a simplicidade de procedimentos, alicerçada em poucos e bons instrumentos bem como suportada por uma atitude de confiança nos professores será mais pertinente e eficaz, irá ao encontro do que realmente se pretende com a ADD porque não estaremos a desviar-nos para questões paralelas e acessórias dado que a simplicidade de processos permite ganhar atenção para a essência do que está a ser trabalhado. E o que está a ser trabalhado é tão importante quanto interfere directamente na qualidade do serviço público de Educação, logo, no futuro do nosso país.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Ao SUL #29


















Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

GODINHO DAS SUCATAS - DADOS PREOCUPANTES

Sobre o único arguido preso no processo “Face Oculta” vão surgindo com alguma regularidade notícias que mostram bem a protecção “especial” que lhe era (é?) dada. Hoje mesmo, 3 de Janeiro, merece amolo destaque na 1.ª página do Público e no Público on line. Para lá das questões de corrupção e roubo que estão na base da sua detenção e do processo “Face Oculta”, surgem noticias de  graves crimes ambientais, de graves fugas aos impostos e de várias “coimas” que, contudo, acabam quase sempre por não ser pagas. Que ex-ministros (e talvez actuais ministros) apoiem esta gente traduz bem a decadência da proclamada “ética republicana”. E que estes sejam os empresários portugueses de sucesso diz tudo sobre a nossa economia. Que deus nos valha!

sábado, 2 de janeiro de 2010

“TIQUES” DOS IMPÉRIOS

Vários órgãos de comunicação social noticiam hoje que a justiça norte-americana resolveu absolver 5 cidadãos do seu pais, funcionários de uma empresa americana que trabalhava no Iraque para o Departamento de Estado. Eram acusados de ter disparado e morto pelo menos 14 civis iraquianos quando faziam escolta a um comboio diplomático norte-americano, sem terem sofrido qualquer ataque ou provocação. Morte a “sangue-frio”, como se costuma dizer. Segundo o Público de hoje, um dos acusados declarou que os matou porque queria fazê-los pagar pelo 11 de Setembro (mesmo que o Iraque estivesse envolvido nesse acto de terrorismo, e parece não estar, este comportamento seria bárbaro). O juiz resolveu absolvê-los considerando que “as declarações de culpa foram obtidas sob coacção”. Que coacção? “A ameaça da perda do emprego.” Se tivermos presente as torturas praticadas pelos americanos em Abu Grahib, se pensarmos no que se passou na base de Guantánamo e nas prisões clandestinas que a CIA espalhou por todo o mundo, arrepia-nos tamanho cinismo. A lei dos impérios é clara: nós podemos fazer aos outros o que não admitiremos que eles nos façam a nós. A “lei” tem a marca do poder. Nada de muito novo: os Estados Unidos já tinham recusado que os seus cidadãos fossem julgados no Tribunal Internacional de Haia. Esta é mais uma machadada no prestígio internacional dos Estados Unidos. Ficamos à espera da inevitável retaliação iraquiana – não do seu governo, mas dos grupos terroristas que a invasão americano fez proliferar. Começa mal o ano de 2010.    

Ao SUL #28














Fotografia de Felizarda Barradas, professora, dirigente do SPGL e fotógrafa. 

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

UM DESEJO PARA O NOVO ANO: QUE O ME FALE CLARO PARA OS PROFESSORES E PARA OS PORTUGUESES

Tenho cá para mim que o impasse negocial entre o Ministério da Educação e os professores poderá solucionar-se se Isabel Alçada tiver coragem (ou autorização) para responder à seguinte questão: as propostas apresentadas pelo ME para a carreira docente e, conexamente, para a avaliação de desempenho, têm fundamento em questões educativas, em dificuldades orçamentais ou no princípio da "igualitarização" de toda a Administração Pública?
Estudemos a primeira hipótese: o acesso ao topo da carreira deve ser limitado aos professores Muito Bons ou Excelentes(1) e, quanto muito, a um número limitado dos professores "normais", isto é, Bons. Seria uma hipótese com lógica, desde que a distinção entre Muito Bons e Bons fosse feita de modo inequívoco, transparente e fundamentado. Basta ter presente a obscenidade que foi o processo avaliativo destes dois últimos anos, para, com os olhos da verdade, reconhecer que a atribuição de classificações de mérito excepcional obedeceu a critérios aleatórios e asubjectivíssimas preferências. Isabel Alçada foi professora numa Escola Superior de Educação e certamente será a primeira a incomodar-se com o facto de que o que distingue um Muito Bom de um Bom ser a assistência a duas aulas, avaliadas sabe-se lá com que critérios (para não falar já da duvidosa competência de muitos avaliadores). Mas, se dúvidas houvesse, olhemos para a situação criada: atribuiu-se com ligeireza Muito Bom a um conjunto de docentes no início da profissão (eventualmente, mesmo a docentes que terão de sujeitar-se a um exame para a entrada na carreira, mas já têm Muito Bom!); nas escolas /agrupamentos onde um elevado número de docentes requereu essa "distinção", chovem agora legítimas reclamações dos que, por não terem tido lugar na "quota", não tiveram acesso a essa "distinção",curando de saber por que razões foram escolhidos outros que não eles — que transparência aí não há; nas escolas/agrupamentos onde, por razões de coerência com a luta travada ou por um elevado sentido ético-deontológico, o número de candidatos à excelência foi igual ou inferior ao número estabelecido pela quota da escola, é motivo de tristeza e de descrença a atribuição de Muito Bom a docentes que a o conjunto de professores e educadores colocaria entre os seus mais fracos docentes…
Ora, sendo nesta matéria — a distinção entre Muito Bom e Bom — a nova proposta muito semelhante à anterior, fácil é imaginar o que acontecerá se, legitimamente, a maioria dos docentes requerer o acesso a esta "distinção". Em suma: a distinção entre Muito Bom e Bom nunca poderá ser critério para decidir da progressão na carreira, a menos que se aceite a injustiça,o aleatório ou o compadrio como critérios válidos.
E como distinguir os Bons que progridem dos Bons que não progridem? Por lotaria?
A atribuição de Muito Bom deverá sempre ser uma excepção. Deverá premiar uma carreira cujo mérito seja reconhecido pela comunidade escolar, seja avalizado por opiniões exteriores à escola, seja claramente um exemplo e um estímulo para os outros. Não tem nada a ver com a palhaçada que se viveu e com a que se prenuncia.
Quer Isabel Alçada melhorar as escolas? Aqui deixo algumas sugestões: acabe com os departamentos gigantescos e incoerentes e regresse à dinâmica dos grupos disciplinares; ajude as escolas/agrupamentos a construírem projectos educativos com sentido (seria uma boa tarefa para a inspecção), vá generalizando, com calma, o hábito de os professores assistirem às aulas uns dos outros, responsabilizando por isso o coordenador do grupo disciplinar, seja dura para quem não cumpre a sua função. Verá que assim terá consigo os docentes.  Chegam todos ao topo, com exclusão dos que não cumprem? Ainda bem.
Mas voltemos à pergunta inicial: são fundamentos orçamentais que justificam as suas propostas? Assumámo-lo com clareza e negociemos nessa base. Estudemos faseamentos, compensações, o que for preciso.
E se a razão das propostas for  que  "é assim no resto da administração pública", digamos em tom viril que não pode ser tratado de forma igual aquilo que é essencialmente diferente. É que os docentes são mesmo um "corpo especial" (Além de que, ao que me dizem , esta história da avaliação pelo SIADAP está a provocar um sério caos...)

(1) Considero a distinção entre Muito Bom e Excelente uma coisa ridícula. Daí que o texto passe apenas a falar de Muito Bom.