sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

SEM CHAMPANHE NEM CICUTA

Por João Paulo Videira

Reflexões em torno do acordo ME/Sindicatos

Preâmbulo.
Ao escrever sobre o assunto em título, permitam-me dirigir as primeiras palavras para o Secretariado Nacional da FENPROF, saudando todos os seus elementos, Em particular aqueles que integraram as equipas de negociação. Fazer juízos de valor a posteriori é bem mais fácil do que preparar todas as matérias, sob todos os ângulos e, mesmo assim, sofrer a tensão de ter de decidir na hora com a responsabilidade de representar milhares de professores. Registe-se, também, a mudança de atitude desta equipa ministerial. 
Quando se chega a um acordo, chega-se a um compromisso que resulta de um processo negocial que permita não esmagar nem soçobrar. A classificação de um acordo como bom ou mau parece-me inútil e despicienda. Há que perceber as vantagens e as desvantagens do mesmo e maximizar os efeitos daquelas, minorando os destas. Não havendo razões para champanhes desmedidos e comemorativos, não as há, também, para cicutas capitulantes e suicidas.

Teor e Tempo da Negociação .
Este processo negocial teve um teor fortemente laboral com uma incidência quase exclusiva na carreira. Aqui poderíamos ter estado melhor. Tanto maiores serão os dividendos de uma negociação, quanto mais a conseguirmos centrar nas questões educativas. 
Há quem questione se este tinha de ser o tempo da negociação, se isto tinha de ser assinado já. Não esqueçamos que o ME apresentou um calendário negocial e que esse calendário estava refém da iniciativa parlamentar do PSD. Se este processo fosse parar à Assembleia da República, não só não saberíamos como seria resolvido, como sabíamos à partida que estávamos excluídos de participar. 

Acordo de Princípios.
Um acordo de princípios significa que as partes envolvidas na negociação acordaram quanto aos princípios orientadores da mesma o que não encerra a negociação, pelo contrário. Teremos de respeitar estes princípios mas teremos, também, de bater-nos para que sejam levados a cabo em benefício da Educação e dos seus agentes. 

Da Luz.
O presente acordo trouxe à luz alguns factores positivos, essencialmente no âmbito da carreira, que me parecem muito benéficos:
- Aboliu-se a divisão da carreira em categorias.
- Garantiu-se que todos os professores avaliados com Bom cheguem ao topo da carreira.
- Criou-se espaço para a tão desejada tranquilidade nas escolas. Admito a sua precariedade mas, ainda assim, vivemos um tempo muito diferente, para melhor, da recente guerra acesa que travámos. 
- Garantiu-se a continuidade do espaço negocial.
- Conseguiu-se a supressão da prova de ingresso para contratados com um contrato e uma avaliação de Bom.
- Conquistou-se o compromisso da realização de um concurso nacional de professores já em 2011.
- Conseguiu-se a criação de um programa de formação em avaliação.
- Conquistou-se a simplificação dos procedimentos de Avaliação o que pode gerar uma maior eficácia e um menor peso burocrático.

Das Trevas.
Há ainda aspectos que gostaríamos de ter superado mas que temos de admitir são insatisfatórios e prejudiciais à Educação e aos professores:
- Continuamos com uma carreira demasiado longa.
- Permanece, em sede de ADD, uma escala quantitativa em vez de uma escala qualitativa assente em critérios.
- Mantém-se a menção de Regular. Não há sustentabilidade científica para a sua existência. Nem profissional. Os professores têm de ser bons. Se o não forem, temos de assumir a sua insuficiência e accionar mecanismos de apoio e recuperação. Um professor regular é uma figura constrangedora para o sistema educativo português. De resto, esta figura cria um absurdo avaliativo que é punir quem foi positivamente avaliado.
- Mantêm-se as menções de Excelente e Muito Bom. Para além das evidentes dificuldades de diferenciação, a sua coexistência rouba espaço à dignificação a ambas. 
- Os ciclos bienais de avaliação vão converter a ADD num obstáculo ao desempenho propriamente dito pelo que deveriam ser substituídos por um momento formal de avaliação por escalão. 
- Os Objectivos Individuais, facultativos ou não, introduzem ruído naquilo que deve ser o trabalho em torno da consecução dos objectivos do Projecto Educativo e do Plano Anual de Actividades.
- O Relator tem de ser um elemento eleito e não nomeado. Emerge de tal eleição o primeiro passo para o reconhecimento profissional da sua autoridade enquanto avaliador. 

Conclusão.
Há, de facto, muito a fazer, ainda, mas muito já foi feito. 
Torna-se evidente que os ganhos são, sobretudo, da esfera laboral e de carreira sendo que a área onde ficámos mais aquém daquilo que a Escola e os professores precisam é a Avaliação do Desempenho. Temos de assumir as conquistas como fruto do nosso trabalho e encarar as desvantagens com frontalidade e abnegação, detectando-as, analisando-as e combatendo-as. Não vamos já a correr beber o champanhe da vitória que nas negociações não de trata de ganhar nem perder. Trata-se de criar compromissos. Mas não corramos para a cicuta nem capitulemos porque com trabalho, com exigência e com dedicação conseguiremos cada vez melhor em prol da Escola com que todos sonhámos um dia.

João Paulo Videira
Secretariado Nacional FENPROF
Coordenador Direcção Regional Santarém - SPGL

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