quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

CONTRATOS DE ASSOCIAÇÃO COM ESCOLAS PARTICULARES: O GOVERNO ESTÁ NO BOM CAMINHO

(Notas a propósito do texto de Helena Freitas publicado no jornal Público de 29 de Dezembro)

1. O alargamento da rede pública de estabelecimentos de ensino de modo a garantir o direito de todos a um ensino de qualidade é, para lá de um imperativo constitucional, uma questão de justiça social.

2. Só a expansão da rede pública nos anos 70, acelerada com a Revolução de 1974, garantiu o acesso de todos à escola. Sei do que falo: naquela que até 1974 era uma secção do Liceu Nacional de Leiria, em Caldas da Rainha, posteriormente a Escola Secundária Raul Proença, foi preciso uma ginástica incrível para nos anos a seguir à Revolução fazer caber os alunos – no mesmo espaço onde antes se passeava sem problemas.

3. Enquanto a frequência da escola se manteve entregue a colégios privados e à igreja ela nunca se alargou a todos, antes se fechou às elites económicas.

4. Concordo com Helena Freitas, reiterando o que já escrevi: a salvaguarda dos interesses legítimos (dos alunos, professores e instituições) teria de presidir às medidas anunciadas pelo governo – o que parece estar assegurado. Contudo, há que reconhecer que algumas situações são manifestamente “ilegítimas” e só lamentáveis compadrios permitiram a abertura de escolas particulares em áreas já devidamente cobertas pela oferta pública, numa concorrência desleal – a existência de transportes próprios – por exemplo, e obrigando o Estado a despesas duplicadas. O espírito de sensata justiça que atravessa o texto de H.F. exige a separação clara das situações “legítimas” das situações “legitimadas por compadrios.”

5. Em caso algum se pode admitir que o Estado duplique despesas só para garantir a existência de escolas privadas. Se num espaço em que já existe oferta pública surgissem duas escolas privadas, deveria o Estado suportar em triplicado a despesa ? E com que critério estabeleceria contrato apenas com uma delas?

6. A meta só pode ser uma: garantir que todo o espaço do país é coberto pela rede de estabelecimentos públicos, de modo a pôr fim a esta figura dos “contratos de associação” que foi transitoriamente necessária (e na maioria dos casos bem cumprida pelos estabelecimentos protocolados).

7. Este objectivo não pode prescindir da salvaguarda dos direitos legítimos de todos os envolvidos.

8. Só deste modo se libertará o ensino privado para o que ele deve ser: o de um ensino alternativo ao ensino público, pago por quem o quiser frequentar

9. Corolário: o ensino público não pode ter qualidade inferior à do ensino privado.

Conclusão: o Governo iniciou um processo clarificador que merece ser apoiado. Resta saber se terá tempo e coragem para o concluir. Não nos restem dúvidas: com o PSD de Passos Coelho o mais provável é que encerrem as escolas públicas para abrir espaço a novos “contratos de associação.”

Nota final: os dados do custo por aluno são contraditórios. O Ministério da Educação garante que é mais barato o custo nas escolas públicas (veja-se o artigo de Trocado da Mata, também no Público). Outros fazem contas diferentes. Clarifique-se e, se for o caso, corrija-se o que houver que corrigir. Mas isso não é argumento para privatizar.

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