sábado, 3 de abril de 2010

NÃO PODEM ESTAR ACIMA DA LEI!

1. Os casos de pedofilia na igreja católica praticada pelos seus religiosos parecem surgir como cogumelos um pouco por todo o mundo ocidental. Agora fala-se dos casos (centenas) na Áustria. Escrevo “parecem surgir como cogumelos” porque em boa verdade nada demonstra que o número de pedófilos entre os padres e bispos católicos seja proporcionalmente superior ao de pedófilos na sociedade em geral. Pelo mesmo motivo também não sabemos se esta “revelação” (não do “Espírito Santo”, mas apesar dele) tem relação directa com o celibato forçado de padres e freiras – é provável que tenha, mas faltam-nos “números”.

2. Não me situarei pois no campo da moral. Da falsidade moral, pelo menos no que concerne à sexualidade, de boa parte dos padres e bispos temos todos nós ampla consciência. Eça traçou-a brilhantemente no Crime do Padre Amaro, a população trata-a com a bonomia dos dichotes: “os padres são os únicos a quem os filhos não chamam pai mas sim tios”, etc. 

3. Se a pedofilia fosse apenas um pecado, tudo se resolveria com a ida alegre a um qualquer confessionário. Pelos vistos, em boa parte dos casos, estaria o pobre do católico laico a confessar o seu pecado a quem poderia ter acabado de praticar um igualzinho mas que, em nome de deus, lho apagaria com 3 Padres Nossos e 5 Avé Marias.

4. Mas já não é disso que se trata. Nem sempre terá sido assim, mas a civilização que fomos dificilmente construindo sensibilizou-nos e transformou a pedofilia num crime. E um crime grave. É aqui que a posição da igreja é uma vergonha: como qualquer ”sociedade secreta” e poderosa, acha que os crimes dos seus membros “devem ser tratados dentro da família” como referiu um tal senhor cardeal Saraiva. Dentro dessa família, não seriam crimes, mas apenas pecados… Como responsáveis por um crime, os sacerdotes, bispos ou papas têm de ser julgados como qualquer outro cidadão. Alguns deles terão como agravamento o facto de violarem jovens que lhes eram dados para protecção. Todos eles acumularão a pena jurídica com o vexame moral de serem, pelo menos nesta matéria, aldrabões de primeira.

5. Quem poderá investigar as condições em que o tal padre Frederico, suspeito não só de pedofilia mas também de homicídio, se permitiu aproveitar uma saída precária da prisão para voar descansadinho para o Brasil com o apoio e cumplicidade do seu amigo, o então bispo do Funchal? Será que a esses “religiosos” tudo continua a ser permitido?

6. Se é verdade que deus escreve direito por linhas tortas, que toda esta “revelação” tenha um lado positivo: reduzir drasticamente o poder societal das igrejas – no caso da católica, pelo menos, o peso dos crimes ao longo da história supera por umas boas toneladas o das boas acções… E nada garante que as outras igrejas sejam melhores.

1 comentário:

  1. faz-me alguma confusão que se associe o celibato à pedofilia. quebrar o celibato não implica violar ninguém, e muito menos crianças. muitos padres católicos têm vidas sexuais normais, em que há consentimento mútuo, e isso, se é pecado, é lá com eles. convinha era avaliar o porquê de tantos padres se dedicarem a práticas sexuais que não podem ser consumadas sem abuso e uma relação de poder com as vítimas.
    é óbvio que é o poder que têm na sociedade que lhes dá acesso às vítimas, permite o abuso e o encobrimento (na irlanda, por exemplo, controlam a educação e a assistência social). e é óbvio que é esse poder que ainda torna mais fundamental que sejam todos julgados - criminosos e quem os tem ajudado. e é ainda mais óbvio que a esmagadora maioria dos padres não tem nada a ver com actos de pedofilia... mas o que não me parece absolutamente nada óbvio é que a igreja católica possa existir sem poder. esse é que é o grande sacramento, e temo que seja isso que explica tanto abuso.

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